A podre política de “segurança” do país faz mais nove vítimas

Imagem: Daniel Arroyo/Mídia Ninja https://www.redebrasilatual.com.br/cidadania/2019/12/paraisopolis-criminalizacao-periferia/

“A ação da polícia de São Paulo é uma ação bem planejada, preparada, orientada, é a polícia mais bem treinada do país.”

Foi assim que o governador de São Paulo, João Dória (PSDB) começou a responder os questionamentos sobre o massacre de nove jovens na Favela de Paraisópolis.

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Cartum: Latuff https://www.instagram.com/carloslatuff/

A versão oficial é de que os jovens foram pisoteados depois de uma ação da polícia. Ainda na versão oficial, eles perseguiam dois homens armados que teriam atirado na PM e se refugiado no baile DZ7, em Paraisópolis, um dos maiores bailes funks da segunda maior favela de São Paulo.

Que treinamento é esse que termina com nove jovens pisoteados?

Não deve ser muito diferente da PM do Rio de Janeiro que, a despeito da perturbação da paz da vizinhança na luxuosa Marina da Glória, resolveu não invadir a área com bombas de gás, cassetetes e balas de borracha.

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Fonte: Extra (https://extra.globo.com/noticias/rio/som-alto-de-festa-eletronica-realizada-na-marina-da-gloria-deixou-moradores-da-urca-sem-dormir-24111891.html

Polícia bem treinada no Brasil sabe direitinho diferenciar a cor e o endereço das pessoas quem pode sofrer violência do Estado sob a justificativa de preservar o sossego ou combater o tráfico de drogas.

Fernanda dos Santos Garcia é irmã de Dennys Guilherme, uma das vítimas. Um adolescente de 16 anos. Um menino negro.

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Legenda: Dennys Guilherme, 16 anos. Uma das vítimas do massacre de Paraisópolis. “Um menino negro na favela, curtindo um baile”. Crédito: Reprodução/Facebook

Fernanda dá um depoimento dilacerante logo depois de reconhecer o corpo do irmão no IML:
“Um menino negro na favela, curtindo um baile. Os amigos deixaram ele. Ele caiu. E um amigo foi socorrer e um policial falou: ‘pode deixar, que a gente cuida dele’. Aqui ó o cuidado. Tô indo no velório dele. 16 anos… Ele foi socorrer, o policial mandou ele sair e colocou ele pra correr”.

Em pouco mais de dois minutos de dor, ela levanta várias dúvidas: nega a versão de pisoteamento, afirma que polícia impediu o socorro, acusa o IML de não deixar a família ter acesso ao corpo que pertence à própria família.

clique no ícone abaixo e ouça o depoimento na íntegra
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Em outro depoimento dilacerante, a professora Vanine Cristiane, 39, irmã de Bruno dos Santos, também colocou em dúvida a versão do pisoteamento.

O jovem é de Mogi das Cruzes, na grande São Paulo, e estava comemorando o aniversário de 22 anos.

“Tavam tudo em grupinho de cinco e ele foi o único que correu pro lado errado e os outros correram e conseguiram se salvar e o bruno ficou. Aí, depois não sei se era eles mesmo que filmaram, eu vi o Bruno caído no chão, com o rostinho pra cima e, agora a agente tá correndo atrás pra poder levar o corpo pra Mogi e pedir justiça”.

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Imagens de vídeos divulgados pela comunidade também colocam em cheque a versão da polícia e mostram jovens sendo encurralados e espancados pela PM. A Ponte, o primeiro veículo a entrar na cobertura do massacre, chegou a ter o vídeo censurado pelo Youtube, depois as imagens voltaram ao ar com o aviso de que tem conteúdos sensíveis. Segundo a Ponte, o cerco ao baile acontece exatamente um mês depois da Secretaria de Segurança Pública ter anunciado que ia intensificar as ações policiais em Paraisópolis. O anúncio foi feito logo depois da morte de um sargento da PM na região.

o vídeo abaixo registra os jovens sendo encurralados e espancados pela PM
https://youtu.be/W9-R1X_l7gs
fonte: Ponte.org

Bruno, Dennys, Denys Henrique, Gabriel, Marcos Paulo, Gustavo, Mateus, Eduardo, Laura.

Se eles estivessem nos barulhentos bailes no entorno da faculdade Mackezie, em Higienópolis, não teriam morrido. Nem pisoteados, na versão da PM, nem espancados, na versão dos familiares. Não teriam morrido simplesmente porque a polícia não ousaria adotar o mesmo tipo de protocolo no bairro de classe média alta que adota em Paraisópolis.

Os nove cometeram o crime de frequentar um baile funk em uma favela. Assim como outros jovens, no começo do século passado, ousaram gostar de festas embaladas pelo samba.

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Imagem do correio da manhã 13/02/1902.
Fonte: Biblioteca Nacional https://bndigital.bn.gov.br/exposicoes/ai-ai-ai-cem-anos-o-samba-faz/a-marginalizacao-do-samba
Legenda: Na notícia de 1902, a vizinhaça da Rua Marechal Floriano reclamava das festas na casa 188: “é esta casa um foco de jogo e de meretrício. Ahi, enquanto na sala se realiza o samba, denominado pelos habitantes com o pomposo nome de baile”.

Não é de hoje que a polícia é muito bem treinada para passar por cima de gente pobre, preta e periférica. Esse foi o crime dos jovens do baile DZ7.

E como já enfatizou o governador de São Paulo, não vai ser agora que essa política vai mudar: “determinei que a apuração fosse rigorosa, mas a política de segurança pública de são Paulo, não vai mudar”.

Dória venceu a eleição prometendo que a polícia ia atirar para matar.

Horas depois do massacre, jovens de Paraisópolis saíram às ruas para protestar. Um refrão ecoou nas vielas: “eu só quero é ser feliz, andar tranquilamente na favela onde eu nasci”.
O governador se faz de surdo.

Desculpa aí governador, a hora de mudar a política de segurança pública, não só em São Paulo, mas no Brasil inteiro, já passou. Já tá caindo de podre.
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https://twitter.com/MidiaNINJA/status/1201318607889850368

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