Mestre King: a alma da dança afro

Em África há uma constelação de expressões culturais, que se traduz em uma unidade que se chama africanidade. Isto é, na multiplicidade étnica, sócio-política, religiosa, artística e cultural há um elemento comum que em qualquer lugar do mundo traduz imediatamente a identidade deste continente, que não é homogêneo, como o pensamento colonizador epistemicida simplifica, ao contrário, é diverso, rico e múltiplo.

O Candomblé e suas nações, por exemplo, tem seus ritos. toque, cânticos, divindades, obrigações sagradas que são distintas, de acordo com cada identidade, mas que permite pontos de acenos e contatos, próprio das coisas que provém de uma fonte e ganham sua singularidade.

Esta explosão semiótica foi bem traduzida na dança pela arte de Raimundo Bispo dos Santos, Mestre King, referência no Brasil e no Mundo no que toca a dança afro.

O professor e coreógrafo Mestre King, natural da cidade baiana de Santa Inês, foi o primeiro homem a ingressar no curso de licenciatura em dança da Universidade Federal da Bahia, na década de 1970. Em sua longa carreira foi responsável pela formação de muitos coreógrafos a partir das referência africanas na danças, extraídas das casas de axé e do jeito de andar de cada preto e preta baiana, pelas ruas e ladeiras, quebra-bundas dos caminhos soteropolitanos e afins.

A dança dos Orixás, seja o brilho da guerra de Ogum ao som do do Aderejá, a caça de Oxosse no Aderé, a tempestade de Oyá no Ilú ou a doçura de Oxum no toque do Ijexá, encontra nos passos mágicos de mestre King, a genial tradução dos diálogos com as formas sagradas que cruzaram ao Atlântico e sobreviveram a tentativa de apagamento. Destaque-se que as pesquisa de Mestre King nos terreiros foi alvo de racismo, sobretudo, em um período em que as coisas de axé eram alvo de intensa perseguição e não era tolerado nos espaços brancos, embora estes se socorressem dos saberes ancestrais dos Babalorixás e Ialorixás da Bahia.

O menino interiorano de nome Raimundo, na roda de capoeira, ganhou outro nome de batismo, ”King”, e assim nesta dança que mescla com a luta, há uma das construções corporais que se expressará na arte do grande professor.

Embora criticado por utilizar danças do Orixás nas suas aulas, mestre King contribuiu para difusão da cultura afro e uma revolução na dança que se encontra não somente nos espaços de culto do Candomblé, mas também na chamada baianidade nagô dos corpos negros. Não há como limitar ou conter a força que a cultura afro-baiana possui, porque o fazer artístico é fortemente influenciado pelo fluxo enérgico que cruza o Atlântico.

Salve mestre King!

Imagem: montagem ciranda.net (Mestre King, Mestre King close)

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