Lélia Gonzalez é a primavera da rosa negra

Pensar o feminismo negro em Lélia Gonzalez significa compreender que raça e gênero não se esgotam na classe. O patriarcado brasileiro ataca mais violentamente as mulheres não brancas em sua afetiva e sexualidade, a exemplo das construções da mulata e mãe preta, aquela ‘‘peça de carne’’ para o desejo sexual tipo exportação, e esta a ama de leite dos dias atuais, obrigada a cuidar dos filhos brancos, e até dos ‘‘pet’s’’, ainda que seus filhos pereçam com sede de colo e amor.

A fala da mulher preta é por ela, e por mais ninguém se legitima, como sentencia a mestra Gonzalez. Na perspectiva da resistência passiva da mãe preta, persistimos em identidade e cultura influenciadora na constituição da sociedade brasileira.

Significa que as formas de embates nem sempre serão as frontais, porque o rio contorna a montanha cuidadosa e delicadamente. Por isso o furor violento da Casa Grande proibiu línguas de África, mas não lograram em fazer o mesmo com o ‘‘pretuguês’’, dominado estrategicamente pelo preto e preta , para inserção de seus valores ancestrais nos veículos culturais brasileiros.

Em Lélia Gonzalez enxergamos os primeiros debates sobre interseccionalidade, em que se tem por paradigma as triplas camadas de opressão que recai sobre a mulher preta. As precárias condições de trabalho e salário se projetam sobre o trabalhador preto e a operária preta. Esta enfrentará o constrangimento da boa aparência, um sinônimo para os traços finos do branco, e o modelo que determina diversos elementos de embraquecimento, beleza, roupa, linguajar…

Esta compulsória e forçada relação de embraquecimento põe por terra a cordialidade racial no Brasil, ou melhor, realça a violência latente e racista, enquanto um escuta e não tem a ‘‘ousadia de perguntar’’, tal como narra a epígrafe do texto ‘‘Racismo e sexismo na cultura brasileira’’.

Sobre deixar de lado raça e gênero, Caio Prado em sua leitura original do marxismo nas Américas e em especial no Brasil e juntamente com Gilberto Freyre sobre a tal democracia racial, tiveram em Lélia Gonzalez uma crítica robusta as omissões e equívocos teóricos destes autores.

Lélia Gonzalez é uma das principais rosas da primavera negra, cheia de orquídeas, angélicas, que nos abrem a percepção para nossa realidade identitária.

Imagem: montagem Ciranda.net ([desenho Lélia Gonzalez – Facebook], Lélia Gonzalez – Wikipedia foto: Cezar Loureiro/Revista Cult, [Lélia Gonzalez ,no filme conhecendo Lélia]

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Pedrinha Miudinha com Franklim Peixinho

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Em busca de Lélia (2017) – Filme completo
Sinopse: Lélia Gonzalez. Seguindo os passos desse nome, começo a busca pela minha ancestralidade e por retratá-la. Professora e antropóloga, mulher à frente do seu tempo, protagonista na militância junto ao Movimento Negro nos anos 1970/1980, período no qual percorreu diversas cidades e países -, sempre afirmando sua identidade e denunciando o mito da democracia racial. Um símbolo de resistência e da luta pelos direitos de indígenas, negros e mulheres. Os afetos de Lélia me guiam por toda caminhada.

Participaram da narrativa nomes como Eliane de Almeida, sobrinha de Lélia e escultora; Rubens Rufino, filho de Lélia e economista; Januário Garcia, fotógrafo documentarista e militante do movimento negro; Lila Raio de Sol Ganzala; Conceição Evaristo, escritora; Elizabeth Viana, socióloga e mestre em História Comparada; Jane Thome, atriz; Jurema Batista, sub-secretária da Inclusão Produtiva da Secretaria de Desenvolvimento do Rio de Janeiro; Rosália Lemos, feminista negra e doutora em Política Social; Dulce Maria Pereira, arquiteta e professora da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP); Kabengele Munanga, antropólogo, professor da Universidade de São Paulo (USP) e visitante sênior na UFRB; Matheus Aleluia, cantor e compositor, e entre outros.

Equipe técnica: Roteiro e Direção – Beatriz Vieirah, Orientação: Fernanda Aguiar C. Martins, Assistentes de Direção – Glenda Nicácio, Ary Rosa Duarte e Iago Ribeiro, Produção Executiva – Daniela Fernandes, Comunicação de Imprensa – Ana Paula Santos, Direção de Fotografia e Câmera – Heloisa França, Câmera 2 – Fabíola Silva, Imagens adicionais – Poliana Costa e Thacle de Souza, Still e Arte Gráfica – Heloisa França, Direção de Produção – Mateus Souza e Silva, Assistente de Produção – Cynthia Rachel Esperança, Jessica Nere e Gessica Moitinho, Montagem – Poliana Costa, Finalização de Cor – Tache de Souza, Legenda português e inglês – Meg Young, Legenda francês – Chantal Shanty, Captação de Som – Gabriela Palha, Tomaz Griva Viterbo de Oliveira e Ary Rosa Duarte, Som Desing – Maxsuel Fernandes, Mixagem e edição de som: Tomaz Griva Viterbo de Oliveira, Teaser: Marvin e Poliana Costa. Produtora parceira: Rosza Filmes Produções.

Prêmios:
Indicação na categoria de melhor documentário no II Cine Tamoio – Festival de Cinema de São Gonçalo e Menções Honrosas no 9º Goiamum Audiovisual .

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