Por trás do massacre em Gaza

No amanhecer de 27 de dezembro de 2008, forças militares israelenses impediram o acesso a Gaza para jornalistas locais e estrangeiros. A energia elétrica foi cortada e linhas telefônicas e computadores não mais funcionaram. Por volta das 11h30 (horário local, 15h30 em Brasília), 60 jatos F-16 israelenses iniciaram a intitulada “Operação Chumbo Fundido” contra a população de Gaza. Em 3 minutos e 40 segundos, mais de 50 alvos militares e civis foram atacados, matando duzentas pessoas e ferindo outras mil, a maioria civis. Horas depois, o primeiro-ministro de Israel, Ehud Olmert, promove uma conferência de mídia em Tel Aviv, a capital da entidade sionista, iniciando outra guerra – a da desinformação. Com a ministra do Exterior, Tzipi Livni, sentada ao seu lado direito dele, e o ministro da Defesa, Ehud Barak, à esquerda, Olmert assim inicia a cerimônia: “Poderá levar tempo, e cada um de nós deverá ser paciente para que completemos essa missão”. Entretanto, em momento algum os líderes sionistas divulgaram para o mundo qual seria a tal “missão” contra o povo de Gaza.

Semanas depois da abertura dos portões de Gaza para a invasão brutal de Israel, é possível compreender perfeitamente sobre qual “missão” Olmert se referia, apesar de a mídia ocidental preferir ainda assim jogar de acordo com as regras da entidade sionista. Primeiramente, Israel procura há algum tempo a destruição do Hamas. Após a vitória esmagadora do partido político palestino nas eleições gerais de 2006, a comunidade internacional, liderada pelos Estados Unidos, por meio de pedido inicial de Israel, instaurou um cerco internacional contra Gaza, impedindo o envio de ajuda humanitária, econômica e bloqueando ações do Hamas fora do território. Israel fez sua parte em solo ao literalmente sufocar Gaza, criando o maior centro de detenção do mundo, um campo de concentração para 1,5 milhão de pessoas. Enfim, a recente invasão procura inicialmente destruir Gaza internamente, eliminar políticos palestinos, líderes religiosos, soldados da resistência e a população civil – essa última, a fim de promover uma revolta popular contra o Hamas e ensinar uma lição ao próprio povo palestino por ter “votado no partido errado”, como uma vez declarou George W. Bush. Porém, como no passado, o abuso da força militar se tornou uma arma contra Israel. Nem mesmo a corporativa mídia ocidental conseguiu esconder os crimes diários dos sionistas em Gaza, apesar da censura de Estado ter sido aplicada perfeitamente pela suposta “única democracia do Oriente Médio”. Não é nem sequer mais discutido que o abuso do poder criou a própria vulnerabilidade de Israel, e fortaleceu o Hamas aos olhos do mundo.

Outro objetivo da missão israelense, também ignorado pela maior parte do Ocidente, relaciona-se às eleições que se aproximam. Assombroso e cruel como pode parecer, a invasão reflete uma tentativa dos partidos israelenses Kadima e Trabalhista para derrotar o Likud, de Benjamin Netanyahu, que lidera as pesquisas até a metade de janeiro. Essa realidade ficou evidente a partir dos primeiros momentos dos ataques, ainda na conferência organizada por Olmert. Os dois principais concorrentes de Netanyahu são Livni e Barak, que posavam ao lado de Olmert. A intenção dos partidos israelenses é apagar a imagem de que o Kadima e o Partido Trabalhista “pegam leve com os palestinos”, como Netanyahu havia criticado. Se a estratégia política vergonhosa funcionou é difícil de afirmar, mas a decisão de procurar votos usando como ferramenta o massacre de palestinos diz muito sobre os três principais concorrentes das eleições de Israel.

Outra clara finalidade da invasão massiva de Gaza envolve a moral das Forças de Defesa de Israel. Após a humilhante derrota no Líbano para o Hizbollah em 2006, em que nenhum dos objetivos sionistas foi completado e o partido político libanês conquistou ainda mais espaço no governo do Líbano, Israel procurou opções visando restabelecer a moral perdida e desenvolver o arsenal que não trouxe vitórias. Na última primavera (setembro de 2008), o alvo escolhido para testes de laboratório foi a Síria, e atualmente o foco está voltado para Gaza. Enfatizar que em 3 minutos e 40 segundos os israelenses foram capazes de atingir mais de 50 alvos e deixar mais de 200 mortos é um dos meios que a entidade sionista usou para reconquistar um pouco de autoridade regional. Após uma série de derrotas políticas e militares contra vizinhos, Israel decidiu usar Gaza para uma nova prova de força. Com a censura de mídia, os civis palestinos se tornaram meras cobaias, completamente isolados do mundo de fora, usados como animais de teste para os mais controversos venenos.

Não é estranho que, nessa lista de objetivos da invasão, não há menção alguma sobre como cessar o lançamento de foguetes Qassam do Hamas contra os territórios ocupados por Israel? É exatamente nisso que a mídia ocidental entrou no jogo dos sionistas dessa vez. A única finalidade inverídica sobre a invasão de Gaza é exatamente a única que o governo de Israel insiste em divulgar. Trata-se de uma campanha de desinformação do público. Israel poderia ter dado um fim definitivo ao lançamento de foguetes há muito tempo. De fato, durante o período de cessar-fogo, Israel respirou em plena paz, apesar de incidentes terem eclodido como resposta ao cerco de Gaza, que não foi suspendido nem sequer por um dia durante o cessar-fogo. A mídia ocidental torna-se criminosa ao afirmar que o Hamas deu um fim ao cessar-fogo de 6 meses. Israel manteve Gaza sitiada, sem dinheiro, alimentos, remédios e, muitas vezes, sem acesso a água e energia elétrica, além de executar soldados do Hamas extra-judicialmente e assassinar figuras políticas palestinas indiscriminadamente, sem contar os bombardeios cotidianos de áreas civis. Enquanto Israel manteve seus leões nas jaulas, os israelenses respiraram em paz, sem chuvas de foguetes. Quando os soltaram, o cessar-fogo foi terminado.

Novamente, ao invés de prolongar a trégua e fortalecer as negociações de paz, Israel decidiu pela violência, brutalidade e força, uma estratégia contrária à utilizada pelo Hamas desde o acordo de cessar-fogo. Se a entidade sionista realmente se preocupasse com a vida de seu próprio povo e com o futuro da existência de Israel entre inimigos no Oriente Médio, deveria ter lidado de maneira diferente. Ao invés de mentiras, fatos; ao invés de violência, diálogo; ao invés de ódio, razão. São centenas de homens, mulheres e crianças que se tornam mártires, e o mundo inteiro que assiste esse genocídio por trás dos portões de Gaza. Isso não será esquecido.

FONTE:
Jornal Oriente Médio Vivo – http://www.orientemediovivo.com
Edição Especial de Gaza – http://orientemediovivo.com/pdfs/edicao_gaza.pdf

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