Se o Fórum Social Mundial será lembrado como palco do anúncio do presidente Lula da realização da 1ª Conferência Nacional de Comunicação, também pode ser encarado como o espaço que abrigou a primeira reunião de organização da sociedade civil no processo, agora existente. Mais de 200 pessoas estiveram presentes na plenária promovida para debater a iniciativa nesta sexta-feira no campus da Universidade Federal do Pará, em Belém.
O encontro já estava marcado antes do anúncio do presidente da República, mas a partir deste ganhou caráter de marco inicial do mutirão de articulação das entidades do campo progressista, identificadas com as bandeiras do direito humano à comunicação e da democratização da comunicação, com vistas à participação no processo.
Se foi nítida a oscilação entre o pessimismo e o otimismo em relação às possibilidades da conferência e à atuação do governo federal nela, uma reflexão apareceu como tônica entre os presentes: o grau de abertura e democracia no processo e os avanços em suas resoluções dependerá fortemente da capacidade deste campo da sociedade civil de se organizar e pautar suas propostas ao longo das etapas estaduais e nacional.
“Obtivemos uma grande conquista ao conseguir fazer com que a conferência aconteça. Agora depende de nós que ela produza os avanços necessários à mudança deste quadro das comunicações brasileiras”, apontou Bráulio Ribeiro, do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social.
Na avaliação de Rosane Bertotti, secretária de Comunicação da Central Única dos Trabalhadores (CUT), para que isso aconteça é preciso que as entidades consigam combinar a ampliação da mobilização com a unidade nas propostas. “O lado comprometido com a manutenção da mídia comercial virá unido. Nós precisamos ter unidade entre nós para impulsionarmos uma agenda de mudanças de modo a aprová-la na Conferência”, assinalou a sindicalista.
O professor da PUC-Rio e integrante do Fórum de Mídia Livre Marcos Dantas reforçou o ponto de vista da representante da CUT, acrescentando que esta unidade deve se dar em torno de uma agenda com propostas qualificadas e concretas acerca de um novo ambiente para as comunicações. “Este anúncio marca o início de uma nova etapa na velha luta pela democratização da comunicação, travada desde 1985. Depois do fim da ditadura, vamos poder discutir, no contexto das novas tecnologias, um novo marco regulatório democrático”.
Ampliação estadual e setorial
Roseli Goffman, representante do Conselho Federal de Psicologia (CFP) e do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), destacou a necessidade de que esta ampliação passe pela organização do movimento nos estados. “Precisamos que cada um de nós volte para o seu estado e já inicie as discussões sobre a conferência”, sugeriu.
Para Rachel Bragatto, integrante do Intervozes e do coletivo Soylocoporti, do Paraná, é preciso criar comitês estaduais de mobilização para a conferência onde eles não existem e fortalecê-los onde já estão em instalados. Orlando Guilhon, da Associação de Rádios Públicas do Brasil (Arpub), também ressaltou o papel de organização nos estados, lembrando que desde já as entidades devem estabelecer diálogos com os governos estaduais para garantir que as etapas se dêem da forma mais democrática possível.
Rachel acrescentou que a comunicação não pode ser tratada como algo de especialistas, e defendeu que a ampliação não seja apenas para os estados, mas também para outros setores que se preocupam com o tema mas não têm histórico de atuação nele. “No Paraná, estamos dialogando com educadores, sindicatos, entidades estudantis e movimentos campesinos. Acho que devemos chamar estes setores para estarem conosco neste processo”, disse.
Para isso, foi agendada uma videoconferência após o Carnaval. Este tipo de reunião, por permitir conectar assembléias legislativas de todo o país por meio de um sistema eletrônico, já seria um pontapé para trazer organizações e instituições das mais diversas Unidades da Federação para a mobilização.
Otimistas e pessimistas
Se foi fortemente consensual a importância da mobilização do campo progressista da sociedade civil, houve tons bem diferenciados quanto aos limites do processo e à participação do governo federal. “Somos nós que temos a responsabilidade de colocar a pauta da democratização da comunicação, porque sabemos que ela não virá nem dos empresários nem dos governos estaduais e federal”, afirmou Thiago Rodrigues, da Executiva Nacional dos Estudantes de Comunicação.
Josué Lopes, da Associação Brasileira de Rádios Comunitárias (Abraço), foi ainda mais reticente. “Temos que ver este decreto de convocação da conferência. Em 2005 o governo afirmou que faria uma conferência de rádio comunitária e não aconteceu. Caso ela [a conferência] saia, temos de ver como será a atuação do governo com um ministério como o das Comunicações. Não tenho muitas ilusões”, disse.
Se não chegou a formar uma polarização entre os presentes, estas diferenças demonstram a diversidade dos atores que deverá permear este campo da sociedade civil durante todo o processo da conferência. O que esta primeira plenária evidenciou foi a disposição de fazer estes interesses convergirem em uma atuação com força até então não acumulada pelo movimento de comunicação. Resta saber se isso será suficiente para garantir avanços democráticos entre os resultados da conferencia.