A sétima edição do Fórum Social Mundial (FSM), realizada em Belém, reafirmou a importância da sustentabilidade ambiental para que um “outro mundo” seja possível. Considerando a peculiaridade local desta edição do FSM, a proteção da Amazônia e a defesa dos direitos dos povos indígenas tiveram um destaque especial, desde a caminhada de abertura, as mais de 2.300 atividades propostas e as conclusões finais da assembléia dos movimentos sociais.
Participaram do evento 150 mil pessoas de 142 países, incluindo 1,9 mil indígenas de 120 etnias e nações, 1,4 mil quilombolas (descendentes de escravos), mil artistas e 4,5 mil jornalistas de 800 veículos mundiais de comunicação. Outra característica importante desta edição do FSM foi a boa distribuição continental das 4 mil organizações inscritas: 491 da Europa, 489 da África, 334 da Ásia, 27 da Oceania, 155 da América do Norte, 119 da América Central e o restante, como era de se esperar em um evento realizado no Brasil, pertencente à América do Sul.
O FSM segue a sua tradição de se constituir em espaço de reflexão, proposição e encontro de movimentos sociais empenhados na construção de alternativas à hegemonia neoliberal em curso desde a década de 1980. Diferente do Fórum Econômico Mundial, que há várias décadas reúne a elite dirigente dos países (governos, empresários e economistas) na cidade suíça de Davos, o FSM, já descentralizado em continentes, países e regiões, mantém o seu caráter de integrar e fortalecer a mobilização social dos atingidos pelos problemas decorrentes da mundialização do capital.
A crise financeira mundial, tema central em Davos nesse ano, já era tema de Fóruns Sociais anteriores e as alternativas propostas, como o controle dos fluxos de capital, a taxação das transações financeiras e um maior controle público dos bancos, entretanto, jamais foram aceitas como alternativas pelos apologistas do livre mercado. As atuais conseqüências da liberalização da economia, das privatizações e da mundialização do capital agora são evidentes e em Davos, mais uma vez, a conclusão é de que não existem alternativas.
A atual realidade mostra que o FSM tinha razão e, mesmo nunca tendo existido um documento final único, pois a diversidade dos movimentos que o integram precisa ser preservada, os diversos documentos temáticos apresentados alertavam desde 2001 para os problemas em curso.
Para além das principais discussões que caracterizam o FSM desde sua primeira edição em Porto Alegre, a grande novidade do Fórum de Belém foi, de fato, o foco centrado na necessidade da sustentabilidade ambiental em nível local e global. Ao lado de seus temas clássicos, como democracia participativa, economia solidária e direitos humanos, pela primeira vez, problemas sociais e ambientais foram considerados como sendo associados e, por isso, conclui-se que propostas de uma nova sociedade precisam considerar essa implicação mútua.
Os presidentes do Brasil, Venezuela, Bolívia e Equador ocuparam um espaço significativo em um dos dias do evento, demonstrando claramente que a sociedade civil organizada não pode esperar por propostas de governos, mesmo que esses tenham sido resultado de um processo de mobilização social e política dos últimos anos. Fundamental é que os governos sejam pressionados a adotar propostas elaboradas pela sociedade civil organizada. A tentativa de adaptação à ordem vigente, constituindo alianças políticas que impedem avanços programáticos e sua opção pelo desenvolvimentismo, evidenciam a fragilidade dos atuais governos de esquerda na América Latina. Por outro lado, a descriminalização dos movimentos sociais e os programas de estímulo à mobilização e auto-organização da sociedade, contribuem para a democratização e a maior participação política nesses países. Os limites desses governos, no entanto, estão evidenciados e as propostas do FSM se chocam com a macro-política em curso e as prioridades assumidas pelos seus líderes políticos. A política ambiental, que ocupou o centro dos debates do FSM em Belém tem sido um dos principais aspectos negativos do governo Lula, centrado em políticas de estímulo ao crescimento econômico e no aumento de exportações agrícolas, seguindo a cartilha do desenvolvimentismo e do produtivismo já presente em governos anteriores.
Para o FSM, que mostrou mais uma vez seu vigor em território brasileiro, a edição realizada em Belém fortaleceu uma tendência em curso desde a sua ampliação em 2002: a necessidade de descentralização, da organização local e da definição de agendas globais. Nesse sentido, o FSM se fortaleceu e continua sendo historicamente o mais importante espaço de elaboração política e social da esquerda anti-capitalista mundial.