Qual é a nossa conjuntura ambiental?

01/02/2010 21:28

Esp.FSM 2010 – Qual é a nossa conjuntura ambiental?, por Sucena Shkrada Resk

Chuvas torrenciais causam grandes estragos pelo Brasil. Ontem vivenciei, em São Caetano do Sul, no Grande ABC paulista – onde moro – , um temporal de granizos, acompanhado com ventos de 60 km, que causou destruição na cidade, que exibe o melhor Índice de Desenvolvimento Humano, no Brasil (veja fotos na rede www.cidadaosdomundo.ning)…

No Paraná, trechos de rodovias e moradias viraram entulho e, o mais importante, vidas foram perdidas. Hoje as cenas de impotência diante das águas se repetiu em Diadema, em São Bernardo do Campo, em São Paulo…Na cidade de Iguape, famílias estão isoladas. Em São Luiz de Paraitinga, a população tenta retomar a vida. Enfim, a cada dia temos a confirmação de que precisamos ter medidas de adaptação às mudanças climáticas. E a questão é a seguinte: qual é a conjuntura ambiental em que vivemos?

O Seminário Internacional Conjuntura Ambiental Hoje, realizado em 26 de janeiro, durante o Fórum Social Mundial 10 anos, em Porto Alegre, trouxe à discussão justamente a questão das mudanças climáticas e a justiça socioambiental, que vem de encontro com os problemas da atualidade no país e no mundo.

Segundo o educador Moacir Gadotti, o fracasso da COP15 – 15ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas atesta a crise de um modelo econômico, que utiliza desordenadamente os recursos do planeta. Na cronologia da história ambiental, ele afirma que não é possível dizer que os alertas não estão sendo, dados desde a década de 60. “Nessa época, o Clube de Roma alertava para os limites do crescimento. Em 70, houve o relatório Brundtland, seguido da Agenda 21, do Tratado de educação Ambiental, da Carta da Terra, do Protocolo de Kyoto e a Conferência de Johannesburgo e, mais recentemente, de Copenhague”, disse.

O sociólogo Roberto Espinoza, coordenador do Fórum da Crise civilizatória e consultor técnico da Coordenação Andina de Organizações Indígenas destacou que a Ciência demonstra, que se em 15 anos, os rumos do planeta não mudarem, o comprometimento será irreversível. “As construções de hidrelétricas irão destruir o Peru, para gerar energia a indústrias de São Paulo. Não vamos aceitar. Não se pode desrespeitar a soberania. A maior diversidade biológica está associada à maior diversidade popular. Quem está sofrendo são os quilombolas, indígenas e povos descendentes”, citou como exemplo. A exposição foi feita poucos dias antes da liberação do licenciamento ambiental, da Usina de Belo Monte, no rio Xingu, que ocorreu hoje.

Segundo o sociólogo peruano, os povos indígenas andinos têm as seguintes propostas:
– Mais controle do subsolo pelos indígenas, contra o lobby de empresas petrolíferas,
– Apoio aos movimentos sociais e ambientalistas políticos para defender a natureza e as populações tradicionais:
– Combater as indústrias de extração de minério suspeitas, que ‘colocam mercúrio na terra que nunca desaparece’.

“Vamos chega à COP16, com um cenário de disputa grande, cobrando medidas efetivas. Estamos pessimistas que no México haja o mesmo resultado de Copenhague. Não é uma luta só indígena. Todas essas crises são da civilização, que continuam no modelo colonial, de opressão”. Essas questões serão discutidas na Cúpula da Mãe Terra, em outubro, na Bolivia.

Hildebrando Veléz Galeano, coordenador de Mudanças Climáticas do Amigos da Terra, analisa que o discurso dos ambientalistas agora está no coração dos debates, devido à situaçao atual do planeta. “Mas será que governos progressistas assumirão a agenda ambientalista, para sair dessa crise civilizatória?”, questionou.

O ambientalista lembrou da importância, nos anos 60, da obra Primavera Silenciosa, de Rachel Carson. “Hoje há necessidade de enfrentamento das estruturas do poder, de buscar a ecoeficiência, mas não são as únicas respostas. As lutas devem ser territorializadas. Existe a possibilidade de a utopia trazer a esperança. Estamos falando da soberania dos povos e não dos Estados”. Ele considera o cooperativismo como um caminho para a autonomia econômica.

Para Adriana Mezadri, dirigente nacional de Mulheres Camponesas, é incontestável que acontece a destruição dos biomas nacionais com monocultivos e o perigo dos agrotóxicos. Ainda há a tomada dos territórios indígenas e quilombolas. “As mulheres têm papel fundamental na agroecologia, com a conservação das sementes crioulas. Trata-se de soberania alimentar, com a preservação da biodiversidade. Esse processo ocorrerá quanto mais houver consciência política”, considera.

Antonio Marcos Muniz Carneiro, coordenador ambiental de pesca e agricultura sustentável da COPPE, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), analisa que a tecnologia não pode ser vista como simples artefato. “Mas por meio do uso que fazemos dela, ou seja, a prática social”, diz.

O pesquisador reforça a necessidade de se estudar o campo do conhecimento tradicional, principalmente na região sul do planeta, nos trópicos. “A Itaipu Binacional produz 50% da energia elétrica do país, sendo que não é o maior reservatório. Isso quer dizer que é possível produzir energia sem maior área ocupada”, afirma.

Segundo ele, é preciso considerar que um pescador, por exemplo, dificilmente se transformará em um apicultor. “Isso quer dizer que deve se respeitar o conhecimento que tem do ecossistema do rio”, fala.

Nicola Bullard, da Focus on the Global South, alerta sobre a efetivação da justiça climática, contra o quadro presente de fome e imigrações pelo o mundo, com os refugiados climáticos. “Copenhague mostrou o despertar para a falta de democracia e exclusão. Os governos chegaram ao mínimo de acordo político, que é melhor do que acordos fracos, em sua opinião. “É perigoso que a alta tecnologia esteja nas mãos dos países poderosos” analisa.

“As bases sociais podem transformar as relações, em lugar do que simplesmente resistir.Depende da sociedade dizer aos governantes o que fazer, e não das organizações”, afirmou. Nicola citou a presença de cerca de 120 governantes na COP15, como algo importante. O Brasil, África do Sul, China e Índia são atores poderosos para as negociações do clima globais, segundo a ambientalista.

O questionamento sobre a transformação dos seres humanos em mercadoria foi destaque na exposição de Gilmar Mauro, coordenador nacional dos Trabalhadores sem Terra. “Os agrotóxicos contaminam o aquífero guarani. A produção desenfreada automobilistica recebe subsídios”, afirmou.

Segundo o militante, ao haver a especialização em tantos assuntos, as dificuldades de acesso de informação à população aumenta. “O trabalhador morre por produtividade, como os cortadores de cana e os autônomos”, falou.

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Fonte: Blog Cidadãos do Mundo – jornalista Sucena Shkrada Resk – www.twitter.com/SucenaSResk