Estamos no final da primeira semana da terceira Ação Internacional da Marcha Mundial das Mulheres que, no Brasil, organizou 3 mil lutadoras, numa ousada caminhada por dez cidades, de Campinas à São Paulo, quando chega no dia 18. Buscando no portal Google a notícia, importantíssima se a imprensa fosse mesmo democrática, encontramos 119 mil páginas! Na busca do portal UOL, da Folha de São Paulo, encontramos menos, 44.900.
Entretanto, quando vamos à pesquisa, confirmamos o que já sabíamos. A maioria das notícias estão em sites de organizações e movimentos sociais, como centrais sindicais (CUT e CTB) e sindicatos afiliados a elas, conselhos, como os de Psicologia e Assistentes Sociais, nas listas e redes de mulheres e da luta pela comunicação democrática, em diversos estados do Brasil.
Também encontraremos comentários, sempre apoiadores, em inúmeros blogs independentes, nos sites do PT, Psol, PC do B, e na imprensa contra-hegemônica, seja a sindical, como a Rede Brasil Atual, da CUT, ou o Portal da CTB, Agência Carta Maior, Revistas Caros Amigos, Fórum, Jornal Brasil de Fato, e por aí vai.
Sites de Prefeituras destacaram a ação feminista – Louveira, Sumaré, Várzea Paulista -, com destaque para a última cidade, onde foi realizada o lançamento da Marcha na região, e há boa matéria no portal municipal. Na mídia comercial, por enquanto só houve matérias razoáveis em veículos pequenos, da região por onde a Marcha passou. Assim, jornais de Campinas, Jundiaí, Vinhedo, Itupeva, de Louveira, deram a notícia. Pudera, quem está vendo o movimento não consegue deixar de perceber a importância do que estão falando essas marchantes, por uma vida melhor para todos.
Invisível ou deturpada
Terceiro dia da Marcha, 10 de março, a grande mídia combinou de dar a notícia. A maioria utilizou texto curto da Agência Estado, quase sempre em sites, dos grandes apenas o Estadão deu matéria escrita. A mesma matéria nos portais IG, Abril, Diário da Manhã, de Goiás, Hoje em Dia, de MG. Manchete que deve ter rodado o Brasil: “Marcha reúne 1.200 mulheres na Rodovia Anhangüera”.
Pior foi a Globo, prá variar. No mesmo dia, nota na Agência O Globo, reproduzida na EPTV.com, afiliada local – ou vice-versa – tinha chamada mais batida ainda: “Marcha de Mulheres deixa trânsito lento na Rodovia Anhanguera em SP”. A matéria, ainda menor que a do Estadão, falava na participação de centenas de mulheres. A Bandnews FM, quase na mesma hora em que a Marcha passou na frente de sua sede, no caminho de Valinhos a Vinhedo, fazia comentários depreciativos do movimento: não tínhamos liderança, nem objetivo, como tínhamos tempo de estar ali, etc… A CBN, que também esteve cobrindo o terceiro dia, destacou as marchantes que passaram mal.
O portal UOL, da Folha de São Paulo, colocou por alguns minutos um álbum de fotografias, ainda de Campinas. Mais importante, sobre a plataforma da Marcha, a qualidade das mulheres que lá está, ouvi-las, o que seria de se esperar da boa imprensa, nada disso acontece. Seria um bom exemplo de solidariedade, do viver coletivamente, um exercício de democracia, diversidade, respeito. Quem tem medo do novo mundo possível?
Mulheres querem o controle social de sua imagem
Por isso, um dos temas discutidos pelas mulheres, divididas em grupos na tarde de formação nesse mesmo dia 10, foi a mídia e a luta feminista. Há muito tempo, as feministas perceberam a mercantilização da imagem da mulher e de seu corpo, e a deturpação do feminino no imaginário coletivo, historicamente e em todas as culturas.
No Brasil, desde a década de 1970, ativistas feministas discutem principalmente a publicidade, tendo realizado diversas ações contra a coisificação da mulher. De uns anos para cá, elas perceberam a importância estratégica de lutar pela democratização dos meios de comunicação e pelo controle social de sua programação. Assim, há três anos surgiu a Articulação Mulher e Mídia, em São Paulo, frente que reune várias organizações, como relatou Bia Barbosa, do Coletivo Intervozes.
“Defendemos que a comunicação deve ser discutida por todos e todas, não apenas pelos profissionais da área, pois é direito”, falou a jornalista, que também está nesta Marcha responsável pela assessoria de imprensa. Criticando a concentração dos meios, o fim da lei de imprensa, as distorções da imagem da mulher nos programas humorísticos, novelas, na publicidade, Bia convocou as mulheres a se apropriarem de meios comunicativos, pelo fim “da concentração da mídia, da ausência de outras vozes, com outras visões”.
Comunicadoras populares
Iracema, da delegação do Rio Grande do Norte, é uma comunicadora popular da ASA – Articulação do Semi-Árido , que vem desenvolvendo programas de rádio e vídeos dirigidos para as mulheres. No programa “Riquezas da caatinga”, as mulheres trocam experiências sobre economia solidária, agroecologia, esporte, mulher e mídia e outros assuntos prioritários na luta feminista. Elas vieram preparadas para fazer programs de rádio durante a Marcha.
Rosane Bertotti, responsável pela Comunicação, na CUT Nacional, resgatou o papel da Confecom e defendeu o papel estratégico do tema. “Em todo o movimento que se vai”, disse ela, “comunicação e formação são sempre as duas principais necessidades; claro, comunicação é peça chave no processo de discussão de que país se quer”. A líder cutista falou ainda sobre a ultrapassada legislação, financiamento, as verbas publicitárias estatais que financiam a comunicação no Brasil, sobre a necessidade de nos apropriarmos de tecnologia. “No debate das eleições, não podemos deixar de fora a questão da comunicação”.