Por que não cobiçaras a mulher do próximo

O ‘‘felizes para sempre’’ no panteão do Candomblé passa bem longe da ideia monogâmica idealizada no cristianismo, em que a fidelidade é o pilar da relação, ou a obrigação, sacanamente, imposta a mulher e relativizada para nós machos, pois ‘‘homem é assim mesmo’’.

Oyá teve por companheiros Ogum e Xangô, este, por sua vez, esposou Oxum, mãe de Logun Edé, concebido com Oxosse no fundo rio… Desses rearranjos conjugais, todo mundo ficava de boa, exceto no caso de Obá e Oxum, porque esta induziu Obá a preparar um prato com a própria orelha para Xangô, que se irou com tal iguaria e a repudiou.

Fora isso, nenhuma agonia possessiva entre as divindades, tais como, ‘‘vou te matar se não ficar comigo’’, ‘‘se não for minha não vai ser de mais ninguém…’’.

Em algumas sociedades indígenas havia a prática do poliamorismo, uma mulher casada com mais de um homem e vice-versa, como também no Egito Antigo havia os casamentos testes, para ver se ia dar certo a convivência. A vida sexual dos solteiros egípcios não estava coberta pelas draconianas regras de castidade, se transava ‘‘dicumforça’’, e não tinha esse lance de ‘‘eu resolvi esperar’’.

Luísa quando trai seu marido com o primo Basílio, na obra de Eça de Queiroz, é a representação da pessoa real que adultera ou desejar adulterar em algum momento de sua vida, não que seja a regra, mas é normalíssimo trair ou desejar, tal como dormir, comer, viver. Para nós, homens, é mais que normal, é um privilégio do patriarcado.

O Basílio cafajeste é ovacionado, Luísa morre quando deveria nascer para luxúria. A romantização do ‘‘fechar as pernas’’, ‘‘de não falar palavrão’’ – já que para mulher é feio – e não dar no primeiro encontro, foi a causa mortis dela e a prisão de muitas.
Jorge perdoou e chorou… foi uma dica não intencional de Eça de Queiroz para aprendermos a chorar, desbrutalizarmos, beijar, se declarar e abraçar outro homem sem as amarras e temores homofóbicos.

Aceite e aprenda a perder seus privilégios, porque elas cada vez mais adulteram sem culpa – tal como a gente, ou bem melhor, com certeza -, e também cobiçam a mulher do próximo com muito mais maestria.

Imagem: Ogun, Xangô, Oya, montagem Ciranda.net

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Pedrinha Miudinha

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