O milagre da multiplicação de candidatos pretos

A representatividade da população preta nos espaços de poder é um tema recorrente, pois seus reflexos resultam nas assimetrias socioeconômicas, representada pelo racismo estrutural. A simples mirada no alto escalão do executivo, nos postos do poder judiciário e nos jornais como o da tv do bispo, o ‘‘Fala Islândia’’, por exemplo, nos apresenta um projeto de embranquecimento, vigente desde a primeira república, e um apartheid implícito, como prática excludente em relação ao povo preto.

Ah… e o Hélio Negão? Um preto retinto no meio de vários brancos, estes com poder de decisão no governo federal. Hélio sempre aparece ao lado do presidente – que lástima! -, mas qual o poder que o mesmo possui? A presença de uma pessoa preta em um espaço de poder não significa a correção da histórica desigualdade racial, na medida em que mais da metade da população brasileira é preta, e os melhores empregos, os cargos de gestão do poder público e privado, os locais de visibilidade profissional é direcionado para pessoas brancas de ‘‘boa aparência’’.
O que é isso mesmo, ‘‘boa aparência’’?

Eu mesmo, nas faculdades que lecionei, era o único preto do colegiado de Direito, quando muito, tinha no máximo mais dois, e o resto, tudo branco. Recentemente, aqui em Salvador, uma mulher branca sem titulação de graduação e pós-graduação, participou de bancas de avaliação de monografia e dissertação de mestrado, deu aulas em cursos renomados e em faculdades baianas, foi escolhida para um cargo de coordenação do curso de Direito em detrimento de um professor preto, se passou por advogada, só na base do baratino e com o ‘‘habeas corpus’’ do privilégio da branquitude, o que lhe permitiu transitar nestes espaços sem ser questionada.

Por outro lado, advogadxs pretos e pretas, muitas vezes, têm que apresentar sua carteira profissional, a rosinha da OAB, para fazer uma audiência ou entrar no Fórum, por exemplo. Lembro dos relatos da bela. Jammê Freitas e do bel. Ilzver Matos, em que foram ‘‘barrados no baile’’ para o cara-crachá. Não seria problema se com pessoas brancas o mesmo protocolo fosse utilizado.

Aí vem a baila o tal racismo reverso da Magazine Luiza, em seu programa de trainee para pessoas pretas.

‘‘Ai, ao excluir brancos, é um racismo ao contrário’’. Não ‘‘coisinha’’!

Saber por quê?

Por que o racismo esta em todas as estruturas da sociedade, tal como no julgamento que se faz da pessoa preta em relação a sua estética, o tal do ‘‘cabelo ruim’’. Isso acontece com o branco?

Esta nos constrangimentos que pessoas pretas passam em lojas ao serem abordadas como marginais, quando só querem comprar algo. Isso acontece com o branco?
Quando pretos estão curtindo uma balada e brancos se dirigem a tais, achando que são trabalhadores da festa que estão ali para servir – ‘‘ei, garçom me traz uma cerveja!’’. Isso acontece com o branco?

Ou ainda quando julgam a pessoa preta como ocupante de um cargo ou posição inferior. Uma médica preta era barrada pelo vigilante sempre que chegava ao hospital para assumir o plantão, pois era confundida com paciente em busca de atendimento. Isso acontece com o branco?

Bem…, se eu for listar mais exemplos práticos, este texto não acaba hoje. Leia ‘‘Racismo Estrutural’’ de Silvo Almeida.

Voltando ao nosso papo. O ministro Ricardo Lewandowski concedeu uma liminar para aplicar a cota financeira para candidaturas negras nas eleições deste ano de 2020. A questão é que a ‘‘mão da sujeira’’, branca é claro, já se articula para se pintar de preto, tal como aquele branco que concorreu ao cargo de técnico administrativo do INSS.

São necessárias as políticas afirmativas para corrigir distorções, mas também mecanismos que impeçam as fraudes por candidatos que se tornam – pintam de – pretos por conveniência.

‘‘Eta branco sujão!’’ como canta Gilberto Gil em a ‘‘Mão da Limpeza’’.

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Imagem: Justiça Eleitoral

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