Coalizão pede uma regulação de plataformas que garanta direitos

A Coalizão Direitos na Rede, rede que reúne dezenas de instituições que debatem, estudam e atuam em defesa de direitos digitais, acompanha atentamente o debate sobre o PL 2630/20 desde a primeira versão do projeto e mais uma vez vem contribuir com o debate legislativo, trazendo uma análise da versão mais recente da proposta. O Grupo de Trabalho da Câmara dos Deputados criado para analisar o texto do projeto de lei aprovou, no final de 2021, um substitutivo à proposta do Senado. Na última semana, o relator, deputado Orlando Silva, fez ajustes naquele texto e disponibilizou para debate.

A discussão desta legislação constitui uma grande oportunidade de regular plataformas de internet para garantir direitos humanos e ferramentas de enfrentamento da desinformação e outras práticas nocivas na rede. São necessários parâmetros e princípios para garantir que estes gigantes do meio digital atuem prestando contas à sociedade e no sentido de princípios democráticos. Tais parâmetros devem enquadrar e dar transparência na atuação das plataformas e em seus modelos de negócio, assegurar garantias a usuários frente à moderação de conteúdos, por exemplo. Além disso, esta também é uma oportunidade para tratar da responsabilidade de agentes públicos atuando em redes sociais, figuras que protagonizaram graves processos recentes de desinformação e que não devem ser tuteladas apenas por empresas de redes sociais, mas também pelo Estado democrático de Direito. Em suma, regular plataformas de internet é uma tarefa urgente na agenda democrática e de direitos humanos na era digital.

No Brasil, este processo regulatório está representado no PL 2630 (apesar de apelidado de “PL das Fake News”, o projeto vai além deste tema, tratando de temas como moderação de conteúdos e publicidade na internet). Talvez por isso seu texto esteja sendo atacado de forma a distorcer o sentido do projeto em publicidades financiadas por empresas de tecnologia que estão no escopo da regulação proposta. O fato é que a maior parte das grandes plataformas da internet não se colocou de maneira construtiva no processo de debate e amadurecimento do texto, o que tem sido extremamente negativo.

Porém, a atual versão do projeto contém pontos que necessitam de pronto aprimoramento. Notadamente, a extensão da “imunidade parlamentar” à redes sociais e o estabelecimento de um dever geral de remuneração de conteúdo jornalístico no PL (que deve ser discutido em separado, com mais cautela) são problemas fundamentais que necessitam de revisão, dentre outros.

A discussão na Câmara avançou em relação à proposta original trabalhada no Senado Federal, pois a melhor forma de tratar fenômenos relacionados à desinformação (como as chamadas fake news) é justamente regular e dar transparência às atividades das plataformas de internet. Portanto, no papel de rede de organizações da sociedade civil, defendemos que um projeto de lei seja aprovado desde que seus trechos problemáticos sejam revistos, conforme análise detida abaixo.

Equiparação a meios de comunicação
A proposta de considerar redes sociais, mensageria instantânea e mecanismos de busca “meios de comunicação” para os fins da Lei das Inelegibilidades (que estabelece as regras para casos de cassação de chapas nos quais há abusos e usos indevidos de tais meios que desequilibram os pleitos), embora tenha sofrido alteração na redação, ainda abre brechas interpretativas perigosas. Como a proposta pode abrir precedentes, é necessário que a redação delimite de maneira precisa o tema, a fim de garantir exatidão na interpretação e evitar possíveis interpretações, que aprofundem a equiparação entre plataformas de internet e TVs, rádios e jornais em outros contextos. Esta equiparação não é adequada: por disponibilizar conteúdos de milhões de usuários sem um processo de edição jornalístico as plataformas de Internet devem ter outro tratamento. Se plataformas puderem ser equiparadas a meios de comunicação, a expressão destes usuários estará em risco, pois elas estariam incentivadas a exercer maior controle para evitar processos de agentes poderosos.

A CDR defende que o dispositivo seja aperfeiçoado para afastar esse risco, ficando delimitado apenas para permitir a aplicação da Lei das Inelegibilidades em caso de utilização indevida dos serviços dos provedores. Seria a equiparação do uso de provedores, não dos meios em si. O aperfeiçoamento se justifica pois o que equivale não é o funcionamento destes dois tipos de empresas, mas sim o efeito de tais serviços (de meios de comunicação tradicionais, de um lado, e da internet, de outro) na disseminação abrangente de informações sobre candidatos e o processo eleitoral.

Rastreabilidade e guarda de dados
O texto final é positivo. Em vez da rastreabilidade massiva de cadeias de encaminhamentos (aprovada no Senado), que feria direitos à privacidade e à liberdade de expressão, assim como os direitos de associação e de reunião, o texto atual articula a preservação de dados de usuários específicos mediante comando judicial à instituição de dispositivos voltados a limitar a viralização. O arranjo criado pelo atual artigo 13 foi uma proposta articulada por diversos especialistas em proteção de dados e coleta de provas e, por isso, é mais equilibrado e mais eficiente do que a rastreabilidade proposta pelo Senado, que, além de infringir direitos fundamentais, é, por um lado, de difícil implementação pelas plataformas e, por outro, facilmente burlável pelos usuários através de ferramentas simples. O modelo apresentado pelo Senado, por todos esses motivos, vulnerabiliza as comunicações de forma geral, de todos os usuários, de forma que um eventual retorno do texto original seria extremamente prejudicial. Desse modo, o atual modelo preserva o equilíbrio entre a proteção dos direitos dos cidadãos e a demanda por um aprimoramento dos instrumentos de combate a ilícitos na rede. Deve ser mantido.

Transparência
Os mecanismos e exigências de transparência previstos no relatório são um dos pilares do PL (mencionado na ementa, que a denomina Lei Brasileira da Liberdade, Responsabilidade e TRANSPARÊNCIA na Internet) e um de seus grandes avanços. Esses requisitos, especialmente os relatórios de transparência, são fundamentais para empoderar cidadãos na relação com as plataformas, permitindo que estes questionem abusos e decisões equivocadas na moderação de conteúdos e contas. Além disso, dispositivos de transparência são chave para possibilitar um acompanhamento mais efetivo da atuação das plataformas pela sociedade e por instituições públicas na fiscalização de ilícitos. No caso das próprias obrigações do PL 2630, a transparência é condição para que o cumprimento das obrigações e das regras instituídas nos demais artigos possa ser monitorado e exigido pelos órgãos administrativos e do Judiciário.

Contudo, a redação que vai a voto no plenário teve recuos em relação ao texto debatido no Grupo de Trabalho criado para análise do PL, especialmente por conta da pressão de plataformas digitais para evitar e desmontar obrigações sobre elas no Projeto. Neste cenário, é fundamental potencializar os mecanismos de transparência, retomando as exigências e temas a serem contemplados nos relatórios dos agentes regulados da primeira versão do relator no GT Net, considerando as especificidades de redes sociais, serviços de mensageria e mecanismos de busca.

Devido processo
Um dos principais pontos positivos do projeto é a tentativa de assegurar direitos dos usuários brasileiros, tanto da perspectiva da liberdade de expressão quanto do direito consumerista. Os cidadãos brasileiros não podem ficar a mercê do descaso de empresas que estão atentas à possibilidade de ganhos no país, mas não se comprometem com o atendimento minimamente razoável dos usuários. À medida que a importância das grandes plataformas digitais cresce na vida e nos negócios dos cidadãos, é fundamental que se estabeleça obrigações de oferta de informações aos usuários, possibilidade de solicitar revisão e contestar uma decisão e esperar respostas em prazos e com dados adequados.

São estas obrigações mínimas que o legislativo traz no texto do projeto de lei, em linha com o que se tem debatido em nível internacional. No entanto, o texto atual apresentado pelo relator suprimiu a necessidade de a plataforma digital divulgar os erros de moderação ou de intervenção de outros tipos de forma ampla.

Além disso, é importante considerar que o direito à reparação está previsto nos pactos internacionais de direitos humanos e, enquanto é problemático esperar que as plataformas assumam uma postura de censura da expressão dos cidadãos brasileiros, é importante que participem ativamente da reparação, inclusive pecuniária, em caso de danos.

Autorregulação regulada
O projeto de lei acerta ao construir um mecanismo regulatório que, ao mesmo tempo em que estabelece deveres para as plataformas e direitos aos usuários de redes sociais e aplicativos de mensageria, aponta para a elaboração de medidas de maneira corregulatória, permitindo, por meio do código de conduta, a adequação da estrutura de cada plataforma a diretrizes comuns e aos avanços tecnológicos. A composição do CGI.br– formado por representantes do poder público e conselheiros eleitos diretamente pelas empresas, academia e pelo 3° setor – e sua especializada assessoria técnica permitem que o Comitê Gestor tenha todas as condições de desempenhar multissetorialmente, de modo técnico, equilibrado e democrático, as atribuições previstas no texto, entre elas a de prover diretrizes para o código de conduta e de verificar, posteriormente à sua elaboração pela indústria, se tais códigos estão adequados a essas diretrizes.

Não se trata, portanto, de um poder de fiscalização sobre a aplicação dos códigos de conduta no dia a dia pelas plataformas. Da mesma maneira que a possibilidade de poder requerer aos provedores informações a respeito das metodologias utilizadas para a detecção de desconformidades que motivaram a intervenção das plataformas, com o objetivo de identificar vieses e produzir políticas públicas para garantir a liberdade de expressão, é uma medida de transparência (e não de fiscalização) fundamental no atual contexto global de debates sobre os novos desafios trazidos pelo funcionamento das big techs. Uma medida que se coaduna com as atuais atribuições do CGI.br, reconhecido internacionalmente por suas atividades acerca do uso e desenvolvimento da Internet no Brasil.

Neste sentido, críticas que reclamam de um suposto poder de polícia dado ao CGI.br visam, na realidade, atacar a construção de mecanismos necessários para assegurar o compromisso das plataformas com diretrizes comuns para o setor.

Cabe destacar que a CDR entende que o PL poderia, inclusive, ir além da ideia de “autorregulação regulada” e apontar o Comitê Gestor como espaço para a elaboração do código de conduta num processo conjunto com a indústria – e não apenas como fórum para o oferecimento de diretrizes e, posteriormente, a validação dos mesmos.

Publicidade online
A publicidade é um dos mercados que vem sofrendo transformações importantes com a massificação da Web e dos dispositivos digitais. Porém, a parca regulação nacional sobre o tema em nada foi alterada. Neste sentido, consideramos que os dispositivos de transparência quanto a anúncios e anunciantes são fundamentais para a constituição de um ecossistema informativo saudável. Defendemos, inclusive, que anunciantes sejam identificados, obrigatoriamente, às plataformas digitais. Não há, em qualquer outro mercado publicitário, a possibilidade de um agente contratar publicidade e não se identificar. Lembramos que hoje a legislação demanda de qualquer cidadão, que queira ativar uma linha de telefonia e dados móvel, identificação, inclusive por sistemas de reconhecimento biométricos, de forma que a identificação especificamente para anunciantes às plataformas digitais não nos parece uma demanda excessiva e que impediria que pequenas e médias empresas acessem este tipo de serviço online.

Quanto aos anúncios políticos, consideramos que o projeto de lei traz uma definição concreta a ser observada por todas as plataformas, de forma a permitir a comparação e acompanhamento destes nos repositórios digitais que passam, então, a serem obrigatórios.

E, porém, é relevante reforçar que existem forças operando para a inclusão, no projeto de lei, de regras ultrapassadas, para dizer o mínimo, para regulação da publicidade. Mais do que isso, regras questionáveis, pelo CADE, por exemplo, de funcionamento de agências de publicidade no país. A menção à necessidade de plataformas digitais observarem a lei nº 4.680, de 18 de junho de 1965 nos parece uma tentativa de alguns setores garantirem sobrevida a um modelo superado técnica e socialmente de realização e comércio de anúncios.

Neste sentido, defendemos a supressão de tal menção e a abertura da discussão de um diálogo estruturado e multissetorial acerca da regulação da publicidade na atual conjuntura.

Conteúdo jornalístico
A Coalizão Direitos na Rede compreende a importância do jornalismo profissional, privado e público, para o fortalecimento e consolidação da democracia. E, porém, não consideramos que é possível desde já afirmar que a forma prioritária de garantir a sustentabilidade do jornalismo no novo modelo de distribuição e consumo de notícias seja pela remuneração das plataformas pela “utilização” de conteúdo jornalístico.

Esta abordagem para garantia da produção de conteúdo jornalístico de qualidade tem se mostrado bastante complexa, para dizer o mínimo, inclusive nos distintos contornos assumidos nos países onde foi aprovada.

Os riscos para o modelo de Web Aberta, circulação de conteúdo e concentração de poder em poucas plataformas e em poucas empresas jornalísticas pode gerar efeito inverso ao pretendido.

O fato de a proposta ser, ainda, bastante genérica, e prever regulação pelo Executivo Federal demonstra o quão pouco amadurecido é o debate neste momento e dá superpoderes para o chefe do Executivo tomar decisões que podem afetar profundamente os negócios de produção de conteúdo e de intermediação de conteúdos na Internet. Reforçamos, enquanto uma reunião de entidades acadêmicas e do terceiro setor, que a possibilidade de diálogo e incidência ao executivo Federal é bastante limitada a alguns atores com grande poder econômico/político, com possibilidade de o interesse público ser relegado a segundo ou terceiro plano.

Agentes públicos
Considerando o importante espaço de comunicação das plataformas digitais, é salutar à democracia que se estabeleçam regras de resguardo da conta de agentes públicos contra possíveis abusos no processo de moderação e/ou curadoria de seus conteúdos e contas por parte dos provedores, bem como é fundamental que sejam evidenciadas também responsabilidades que recaem sobre estes agentes. Neste sentido, o propósito da seção é identificar quem são os agentes públicos que devem ser objeto de tal regramento e equilibrar obrigações e garantias sobre as contas enquadradas como de interesse público. Do mesmo modo que a estas são endereçadas garantias, como a restituição de suas contas ou conteúdos indevidamente suspensos, retirados ou restritos por provedores de internet, também sobre elas devem recair obrigações como regras de transparência em comunicações consideradas oficiais e vedações de monetização com base em conteúdos pagos por dinheiro público ou em função de uma atividade pública.

Tendo em vista a confusão entre os papéis público e privado que por vezes se verifica por parte de agentes detentores de cargos públicos, um artigo importante da seção busca, justamente, traçar um limite objetivo no que diz respeito ao âmbito patrimonial dessa confusão. Assim, há uma vedação ao ganho privado de recursos advindos da monetização das contas de interesse públicos. Isto é, uma vez que recursos públicos são aportados para a comunicação institucional dessas contas, não pode o usuário receber de maneira privada, os recursos provenientes de monetização, inclusive as publicitárias, dos provedores de aplicações ou terceiros. Tal comportamento implica no investimento de verbas públicas em busca de lucro privado.

Ainda, o acesso a informações públicas tem sido reconhecido como um direito em diversas partes do mundo e a própria legislação brasileira teve avanços importantes em termos de transparência, embora ainda haja questões importantes a serem aprimoradas, tanto em termos de legislação quanto no que se refere a práticas de gestão. De acordo com a página eletrônica do Tribunal de Contas da União, “A informação sob a guarda do Estado é, em regra, pública, devendo o acesso a ela ser restringido apenas em casos específicos”. Com base nessas premissas que a obrigatoriedade de prestação de contas pública a respeito dos gastos da Administração Pública com publicidade, inclusive no ambiente virtual, é de extrema importância.

A Coalizão, portanto, segue defendendo a importância das regras estabelecidas como forma de equilibrar o uso por agentes públicos de suas contas em mídias sociais. Reconhecida sua importância no que se refere à comunicação com a sociedade, também deve ser reconhecidas obrigações para que abusos não sejam cometidos, sobretudo no que se refere à confusão patrimonial e comunicacional entre público e privado.

Imunidade parlamentar
Outro ponto de preocupação sobre a versão atual do texto diz respeito à inclusão de dispositivo conferindo imunidade parlamentar no uso das plataformas digitais (Artigo 22), o que pode servir para blindar perfis de deputados e senadores à aplicação das regras próprias das plataformas. A Coalizão Direitos na Rede entende que o tema não merece prosperar, uma vez que há grande incidência de disseminação de conteúdos desinformativos ou ataques também por parte de parlamentares. O tratamento diferenciado dedicado a esses atores incidiria em um regime desigual entre os usuários de plataformas de redes sociais, aplicativos de mensageria privada e mecanismos de busca. Mesmo que haja previsão constitucional de uma “imunidade parlamentar” geral e oposta à perseguição política por órgãos estatais, a inclusão deste termo no PL poderá abrir brechas indesejáveis para interpretações de “blindagem” destes perfis por parte do Judiciário. Assim como várias regras presentes no ordenamento jurídico brasileiro, este mecanismo pode virar uma desculpa para que a prática de incitação ao crime, o discurso de ódio e a disseminação de desinformação continuem existindo por parte de alguns parlamentares.

Investigações e guarda de dados
Apesar de a Coalizão Direitos na Rede entender a necessidade de acesso a dados para fins de investigação criminal, o texto é bastante problemático porque contraria o princípio da necessidade da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) ao dobrar o tempo de guarda de dados estabelecido no Marco Civil da internet (MCI) e ampliar o volume de dados mantidos ao exigir a retenção da porta lógica de acesso. Além disso, ampliar as obrigações de guarda de dados por parte das plataformas faz com que elas detenham também mais poder, já que elas teriam mais dados sobre os seus usuários. Além de promover o vigilantismo e o tratamento excessivo com relação à finalidade do tratamento, extrapola o escopo do resto da lei, atingindo indiscriminadamente qualquer provedor de aplicação que seja pessoa jurídica (PJ) e exerça a atividade com fins econômicos e de forma profissional e organizada. Um ponto de avanço em relação a este texto é o fato dele não tratar sobre acesso remoto a dados em jurisdição diferente, uma discussão muito mais complexa e que não seria resolvida pela inclusão de um artigo na lei, em virtude da existência de acordos bilaterais nesse sentido, como o MLAT (sigla em inglês para Acordo de Assistência Jurídica Mútua). Emendas que tratem deste tema, ordenando o acesso remoto a dados armazenados fora do país, devem ser rejeitadas.

Exigência de representação no país
A Coalizão Direitos na Rede entende que o caput do artigo 37 já apresentava uma evolução no debate sobre a constituição de um representante legal no país, capaz de responder às demandas de autoridades administrativas e judiciais. No entanto, na última versão do texto apresentado pelo relator, houve a adição de um parágrafo único, com um conjunto novo de possibilidades de responsabilizações cabíveis a esse representante legal dos provedores de aplicações de Internet aos quais se aplica a lei, e que não foi discutida no contexto do GTNet. Em função disso, a Coalizão Direitos na Rede defende a manutenção apenas do texto presente no caput a despeito de ele já representar uma necessária evolução para o debate sobre a constituição de representantes legais no Brasil, bem como a importância da cooperação destes atores com a justiça brasileira e demais autoridades administrativas.

Sanções
Defendemos um aperfeiçoamento na seção que traz as sanções em caso de descumprimento da lei. Para que sanções graves e que causam impacto indiscriminado a usuários de internet não sejam banalizadas, a Coalizão Direitos na Rede entende que é necessário garantir a aplicação gradativa das sanções previstas na lei. Esse ponto se resolve a partir de um pequeno ajuste neste dispositivo.

Tipo Penal
A Coalizão Direitos na Rede segue defendendo que a via do direito penal não é adequada para constar no projeto de lei de “Liberdade, Responsabilidade e Transparência” na Internet. As legislações penal e eleitoral brasileiras já possuem infrações que dão conta dos ilícitos mais graves envolvidos na produção e disseminação de informações falsas, discursos violentos e ataques às instituições. Dos crimes contra a honra, passando pela ameaça, a lavagem de dinheiro e os crimes contra o Estado democrático de direito são várias vias já constituídas de processar redes profissionalizadas de desinformação e seus agentes. Em 2021, com a criação de um crime eleitoral tipificando a violência política, este cenário ganhou ainda mais um instrumento.

Este quadro já é suficiente para dar vazão a processos de responsabilização penal de agentes, como mostram os recentes inquéritos conduzidos pelo Supremo Tribunal Federal. Além disso, é um quadro que já projeta riscos à liberdade de expressão legítima de usuários de Internet, como podemos ver no uso de “crimes contra a honra” para cercear críticas legítimas a agentes poderosos. Em razão disso, o projeto de lei deve suprimir a criação de mais um crime, pois ele não representa nenhum ganho estratégico no combate à desinformação, mas sim mais um risco a usuários a partir de decisões judiciais possivelmente abusivas.

Vacatio legis
Os prazos para elaboração dos relatórios de transparência por parte dos provedores e ferramentas de busca vêm sendo alargados desde o início da tramitação do PL 2630 no Congresso. De uma periodicidade trimestral, aprovada no Senado, os relatórios agora serão semestrais. E a última versão do substitutivo amplia de 30 para 60 dias o prazo para a publicação dos dados do semestre anterior. Considerado este cenário, se o prazo para entrada em vigor dos deveres previstos para os relatórios for de 12 meses (o Senado tinha previsto 3), a transparência tão urgente sobre o funcionamento das plataformas e ferramentas de busca tardará demasiado. Para efeito de exemplificação, caso o texto siga como proposto, só deve haver mudanças nos relatórios das empresas referentes ao 2o semestre de 2023, e estas só serão tornadas públicas no início de março de 2024 – portanto, daqui a dois anos. A Coalizão Direitos na Rede propõe, assim, que a importância da transparência seja refletida no esforço da indústria em lidar com prazos proporcionais para a entrada em vigor da lei.

Assim, defendemos que sejam feitos os aprimoramentos apontados para garantir que o PL 2630 regule as plataformas de internet garantindo os direitos digitais dos usuários, contribuindo assim para fortalecer o ambiente democrático no Brasil.

Anexo: Análise do relatório final do PL 2630/20, disponibilizado pelo relator deputado Orlando Silva em 31 de março de 2022

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