Não compreendo como convivemos tranquilamente com um estado de coisas aberrantes, que parece já naturalizado de tanto se sucederem no cotidiano da novela da vida privada nacional. Nesta falsa sociedade cordial e de valores insólitos é um choque atrás do outro, seja pela naturalização do estupro e canonização do predador, ou pelo apedrejamento de uma criança grávida e violentada, os racismo do cotidiano, e o inacreditável ‘‘Senhor Antão de Sousa de Menezes’’, do século XXI, a besta do apocalipse a comandar uma nação.
Gosto de Casagrande, mas o que fazer se ‘‘Não posso aceitar sossegado qualquer sacanagem ser coisa normal’’, de acordo com a citação da música de Milton Nascimento?
A revolta de ‘‘Casão’’ nesta frase tem lugar em um conjunto de obras surreais que brotam como filhos de coelho nos hábitos das pessoas. Uma criatura, por exemplo, resolveu impedir um trabalhador de entregar uma comida para aquele indivíduo, por simplesmente o cara ser preto.
Mas que coisa feia, isso é uma abominável exceção, pois no Brasil não há racismo, como também é difícil se contratar gente preta para ocupar cargos importantes e de destaque em grandes empresas: é assim que pensam e esperam que não sejamos revoltados com o cinismo da branquitude.
Sem falar no fofinho da Defensoria Pública da União que resolveu entrar na justiça contra o programa de trainee só para negros das ‘‘Magazines Luiza’’. O detalhe é o que o ‘‘doutor’’ é branco, e seu povo, tal como ele, nunca precisou de cotas, tampouco sofreram racismo institucional.
Mas vamos lá.
Eu já estava me recuperando das descrenças no ser humano aqui dos trópicos da Zona da Mata, Agreste e Sertão, aliás das Araucárias até a Mata de Cocais e Floresta Amazônica, quando vejo um tio de bigode num vídeo falando ‘‘… que entrava na favela mesmo, chacinando, matava criança, mulher, idoso’’, na maior naturalidade.
Não era um daqueles veiós que quer ser do contra e fala maluquices lá da época da ditadura, mas um suposto professor em um cursinho para aspirantes a servidores da segurança pública.
O pior é o aparente silêncio de alunos e veículos de mídia sobre esta propaganda ‘‘bem intencionada’’ do extermínio e tortura de pessoas. Somente páginas como @pretitudes e afins se posicionaram com perplexidade diante dos absurdos de uma fala que naturaliza o genocídio da população preta no Brasil.
Não é piada de mau gosto é a visão de mundo de um assassino frio.
É, não dá mesmo para aceitar sossegado, no mínimo ficamos doentes.
imagem: ciranda.net
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