Arquitetura da destruição: 100 dias sem governo

foto: Midia NINJA

“O Brasil não é um terreno aberto onde nós pretendemos construir coisas para o nosso povo. Nós temos é que desconstruir muita coisa. Desfazer muita coisa.” (Jair Messias Bolsonaro – 18 de março de 2019)

O art. 3º da Constituição Federal de 1988 diz que os Poderes da União devem alcançar os objetivos fundamentais do Estado Brasileiro: i) construir uma sociedade livre, justa e solidária; ii) garantir o desenvolvimento nacional; iii) erradicar a pobreza e a marginalização; e iv) promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Nada disso tem orientado os debates eleitorais, nem os planos de governo, desde a CF-1988. Não à toa, podemos chamar de colapso civilizatório o momento que o país atravessa desde o golpe de 2016 e, sobretudo, desde a eleição de Bolsonaro à presidência. Tal colapso não diz respeito apenas ao desprezo com que vem sendo tratados os valores republicanos e democráticos. Trata-se das nefastas consequências do desmonte do Estado sobre a trajetória de desenvolvimento nacional.

“colapso civilizatório é momento que o país atravessa desde o golpe de 2016”

Na experiência brasileira recente constatamos 7 dimensões relevantes em construção no processo de desenvolvimento nacional: fortalecimento do Estado, das instituições republicanas e da democracia; inserção internacional soberana; macroeconomia do desenvolvimento; estrutura tecnoprodutiva avançada e regionalmente integrada; estrutura econômica, social e urbana; proteção social, garantia de direitos e geração de oportunidades e sustentabilidade produtiva, ambiental e humana.

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A partir dessas categorias, comparando as estruturas de governo no início dos mandatos de Lula 1 (2003), Lula 2 (2007), Dilma 1 (2011), Dilma 2 (2015), Temer (2017) e Bolsonaro (2019) e as indicações gerais de suas pretensões governativas pôde-se compreender a direção de como cada mandato presidencial pretendeu (ou efetivamente buscou) moldar o Estado brasileiro de modo a implementar ou atingir alguns de seus objetivos estratégicos declarados.

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A análise dos processos de longo prazo relacionados à republicanização, democratização e desenvolvimento do Estado, da sociedade e da economia brasileira computou entre 2003 e 2022 que houve um processo de perda de densidade entre os governos Lula e Dilma. E verdadeiro desmonte na passagem dos governos Lula/Dilma para Temer/Bolsonaro, no que diz respeito à tríade República, Democracia e Desenvolvimento no Brasil.

“a perda de densidade do Estado brasileiro se transforma em desmonte em 2019”

Enquanto as dimensões republicana (cuja pontuação agregada dessa dimensão passa de 50% de realização entre os governos Lula/Dilma para 33,3% nos governos Temer/Bolsonaro), democrática (cuja pontuação passa de 77,7% para 44,4% entre os governos Lula e Dilma, e para 33,3% deste aos governos Temer e Bolsonaro) vão se enfraquecendo nas passagens de um governo a outro, a dimensão do desenvolvimento sofre um abalo (de 80,5% para 61,9%) entre os governos Lula e Dilma, e um colapso (de 80,5% para 38,1% e 33,3%, respectivamente) na comparação entre os governos Lula/Temer e Lula/Bolsonaro.

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Somos forçados a concluir que o atual governo Bolsonaro caminha rapidamente para uma estratégia de acirramento de contradições relativamente aos segmentos da sociedade não alinhados a seu projeto de poder.

Como esses segmentos não alinhados a seu projeto de poder são mais numerosos e representativos da diversidade brasileira que os seus seguidores, deverá haver uma inclinação autoritária crescente por parte das frações de classe no poder no governo Bolsonaro, com vistas a impor – até mesmo pela força bruta – os seus anseios e projetos.

“haverá inclinação autoritária crescente no governo Bolsonaro”

Neste sentido, oxalá a comunidade internacional democrática e a sociedade brasileira consciente do perigo autoritário em curso possam rapidamente perceber a abrangência, a profundidade e a velocidade desta agenda retrógrada para então se reorganizarem coletivamente e se reposicionarem politicamente com vistas à recuperação das tendências recentes de construção da República, da Democracia e do Desenvolvimento no espaço nacional.

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