Reforma agrária e democracia

A persistência de uma estrutura fundiária fortemente concentradora continua sendo problema grave no Brasil, segundo o estudo PNAD 2008: setor rural, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), divulgado em 1º de abril. Realizado por pesquisadores da Diretoria de Estudos e Políticas Sociais (Disoc), o Comunicado do Ipea nº 42 avaliou dados relativos à população rural de 2008 da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), e também do Censo Demográfico 2006.

“A questão da concentração do patrimônio rural no Brasil precisa ser resolvida. O fortalecimento da democracia implica distribuir melhor esse patrimônio”, afirmou Brancolina Ferreira, coordenadora de Desenvolvimento Rural da Disoc e uma das autoras da publicação.

De acordo com a análise, cerca de 30 milhões de brasileiros vivem no meio rural em condições precárias de moradia, de acesso à saúde e à educação, com reduzidos níveis de renda e de remuneração. “Não é pouco”, ressaltou Brancolina ao observar que, se essa população constituísse um país, seria o quadragésimo mais populoso do mundo, e o terceiro da América Latina, atrás do Brasil e da Argentina.

A agricultura familiar, além de responder por 70% dos alimentos produzidos no Brasil, é responsável ainda pela grande maioria das ocupações – também em torno de 70% – no meio rural. O agronegócio atinge 3% das ocupações. Os dados procuram oferecer um quadro das condições de vida nas áreas rurais a partir de alguns indicadores sociais e de desenvolvimento humano, analisados sempre em perspectiva comparativa com a população urbana.

Gênero e educação
Brancolina considera grave a situação, não só pela grande quantidade de trabalhadores agrícolas que estão fora de qualquer relação de assalariamento, mas também por causa das condições das mulheres e do acesso à educação. “As mulheres funcionam como um exército de reserva de trabalhadores do campo. Elas não possuem renda e muitas vezes trabalham em substituição aos homens, que se locomovem para outras frentes de trabalho em busca de melhores salários”, disse a coordenadora.

A pesquisadora explicou ainda que a baixa escolaridade contribui para malefícios como a incorreção no uso de agrotóxicos. “Muitos não conseguem sequer entender as instruções de uso desses defensivos agrícolas”, pontuou.

Para exemplificar a situação precária da zona rural brasileira, Brancolina apresentou uma tabela com a evolução do índice de Gini no Brasil, segundo as unidades da federação no período de 1995 a 2006, com base no Censo Agropecuário de 2006 do IBGE. Santa Catarina, com 0,682, é o estado menos desigual no Brasil. Os dados, no entanto, mostram que índice cresceu 0,10 em relação a 1995, quando o estado tinha um índice de 0,671. Quanto mais próximo de 1, mais desigual.

“Grande parte da mídia demoniza os movimentos sociais que lutam pela reforma agrária. Eles contribuíram muito para a democratização no campo, que ainda tem um longo caminho a percorrer”, ponderou a pesquisadora.