Contra-informação a favor da sociedade amazônica

Há três semanas, está funcionando em Belém o Laboratório de Informação Compartilhada, iniciativa que congrega as principais representações de movimentos sociais e ONGS da Amazônia. Entre várias produções, o Laboratório criou dez documentários sobre os grandes temas que serão destaque neste FSM, e estão disponíveis em vários sites, como Youtube e WSFTV. “Com esse Laboratório, conseguimos trabalhar a informação de outra forma, produzindo uma contra-informação para tentar desconstruir o que vem sendo veiculado sobre o FSM, erroneamente, pelos meios de comunicação de massa”, explica a coordenadora do Centro de Estudos e Práticas de Educação Popular (Cepepo), Ilma Bittencourt, que integra o Grupo de Facilitação e o Grupo de Comunicação do FSM aqui em Belém.

Ibase – Qual foi o papel do Cepepo na organização do FSM 2009?

Ilma – Quando soubemos que o Fórum seria em Belém, a grande dificuldade foi articular todas as entidades em torno dessa construção, focando não apenas na questão da organização, mas também da logística. Por isso, organizamos, em 2007, o Grupo de Facilitação, formado por diversas entidades nacionais e amazônicas, e vários Grupos de Trabalho: de Economia Solidária, Juventude, Interreligioso, Cultura, Metodologia, Mobilização e de Comunicação, do qual o Cepepo ficou responsável.


Ibase – Quem integra o GT de Comunicação e como funciona?

Ilma – Estudantes de Comunicação, jornalistas e representantes de várias organizações da área. Para nós, da Amazônia, a principal necessidade era discutir as novas tecnologias. E também o desafio de pensar a comunicação não como um evento dentro do Fórum, mas como uma forma de fortalecer os movimentos sociais amazônicos, apropriando-se, para isso, dessas novas tecnologias. Aqui na Amazônia, a questão da tecnologia da informação é muito complicada.

Ibase – E qual foi o resultado desse GT?

Ilma – Criamos, na sede do Cepepo, um Laboratório de Informação Compartilhada, que começou a funcionar há três semanas. Integram a iniciativa os mais representativos movimentos sociais da Amazônia, como de indígenas, de jovens, de negros, de mulheres, em defesa da terra. Nosso objetivo é pautar os grandes temas do FSM. O Laboratório ofereceu a esses representantes várias oficinas de capacitação nas novas tecnologias, como produção de vídeo e roteiro para documentários, por exemplo. Produzimos cerca de 10 documentários de curta duração, de 3 a 5 minutos, no máximo. Esse trabalho está disponível na internet, como no Youtube, no site da Ciranda da Informação do FSM e no WSFTV, também vinculado ao Fórum.


Ibase- E qual foi o retorno disso?

Ilma -Tivemos excelente impacto, o que foi uma surpresa, pois até então, a ferramenta Internet era uma estranha para a maioria desses movimentos, era um caminho ainda desconhecido que, principalmente com a ajuda dos jovens, conseguimos trilhar. Isso para nós é uma experiência muito interessante, passamos a compartilhar a comunicação de forma mais ampla. Passamos a interagir com o Laboratório de Conhecimentos Livres, com o Fórum de Rádios Comunitárias, entre outros. São pessoas de outras partes do Brasil e fora dele, que têm muito mais experiência do que nós, da Amazônia.

Ibase – O Cepepo existe desde quando?

Ilma – Desde 1980, nosso trabalho começou associado à luta pela moradia. Prestávamos assessoria aos movimentos sociais contando, para isso, com ferramentas de comunicação, como a fotografia. Foi a partir daí que percebemos a importância da comunicação como forma de ajudar a conscientizar essas pessoas a se enxergarem como protagonistas de suas lutas. Começamos a trabalhar com outras ferramentas, todas ligadas à imagem e ao áudio, como slides, vídeos, mas sempre com a intenção de que os próprios integrantes desses movimentos fossem capacitados para produzir seus materiais. O importante era que eles se apropriassem desse processo de construção, seja elaborar uma entrevista, usar uma câmera, produzir um documentário.


Ibase – Vocês já participaram de outras edições do Fórum? Qual o significado dessa participação para vocês?

Ilma – Não, é a primeira vez. Está sendo um grande ganho, pois o FSM amplia as possibilidades de compartilhar conhecimentos com outros movimentos sociais. É também uma oportunidade de aprofundar os debates sobre temas políticos que, em geral, aqui na Amazônia, não temos como levar adiante, por exemplo, a discussão sobre a TV Digital, sobre a inclusão digital.


Ibase – Qual a avaliação que você faz da cobertura da mídia comercial pré-FSM?

Ilma – Foi muito complicado, tivemos problemas muito sérios. A mídia alternativa é muito necessária e, ao mesmo tempo, infelizmente, não tem muito espaço aqui na Amazônia. A solução é ocuparmos os espaços que a imprensa comercial disponibiliza para nós, o que não é bom. Essa foi uma das principais discussões dentro do GT. Por exemplo, os grandes jornais comercias até vinculavam as matérias que produzíamos sobre o processo preparatório ao FSM, mas embaixo, havia um anúncio enorme da Vale da Rio Doce, empresa responsável pela maior parte da destruição ambiental na região, ou de uma mineradora. Por isso, em algumas situações, tivemos que abrir mão desses espaços, por não ter como conciliar a proposta do Fórum com a postura dos grandes veículos. Por exemplo, conseguimos um excelente espaço em um grande jornal sobre responsabilidade social, podíamos publicar nossas matérias, desde que não assinássemos. Na primeira edição que fizemos, embaixo da matéria sobre o FSM, veio um anúncio enorme sobre um encontro de mineração. Outra questão complicada foi a abordagem das reportagens feitas pela mídia comercial, sempre levando a idéia de que “Belém não está preparada para receber o FSM” ou “Os movimentos sociais não estão conseguindo comunicar o que é o Fórum” ou “Belém vai ter um grande encontro turístico”. Ou seja, além da dificuldade de conseguir espaço, temos todo um trabalho de desconstrução a realizar, sempre.


Ibase – Acredita que o FSM 2009 vai possibilitar o fortalecimento dos movimentos sociais e das ONGs da região?

Ilma – Sim, e isso já está acontecendo desde o processo de construção do Fórum. Não sei como está a situação das ONGs pelo Brasil, mas aqui na Amazônia estamos passando por problemas financeiros muito sérios e também políticos, com dificuldade de construção de uma bandeira de luta que seja capaz de mudar essa situação de degradação da Amazônia. O FSM veio nos mostrar que temos essa força para mudar, que temos as ferramentas para fazer isso e dispomos das informações necessárias para isso. Principalmente, na área da comunicação, que é uma estratégia fundamental para essa transformação.

Ibase – Como será o funcionamento do Laboratório durante o FSM?

Ilma – Estamos concentrados na Faculdade de Comunicação, a Facom, dentro da Universidade Federal do PA, UFPA. Reunimos todos os instrumentos possíveis, rádios, câmeras, ilhas de edição, vamos utilizar a imprensa escrita, a fotografia, enfim, pretendemos fazer uma cobertura das atividades do FSM 2009 de forma compartilhada. Ao mesmo tempo, queremos fortalecer os debates sobre o próprio processo de comunicação na Amazônia

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