Hizbollah: “Missão Cumprida”
Após duas semanas de intensas batalhas nas ruas do Líbano, que deixaram cerca de 100 pessoas mortas, o governo libanês pró-ocidental de Fuad Siniora decidiu ceder aos pedidos da oposição, liderada pelo Hizbollah, partido político xiita e movimento de resistência libanesa. Os 18 meses de protestos que marcaram a recente crise política libanesa chegaram ao fim com um acordo entre ambas as partes, anunciado na quarta-feira (21), depois de seis dias de negociações em Doha, capital do Catar.
O Hizbollah, que lidera a oposição política no Líbano, respondeu positivamente com relação ao acordo. “Temos muita esperança de que o acordo de Doha nos salvará dessa crise. Ninguém no mundo pode curar nossos ferimentos se nós [políticos libaneses] não cooperarmos um com o outro”, disse Hussein Hajj Hasan, um dos representantes do Hizbollah no parlamento libanês. Mas a vitória da oposição não marca o fim da complexa disputa interna por poder no país.
O presidente estadunidense George W. Bush, que lidera com Israel o “seqüestro” da política libanesa em sua disputa pela dominação regional, deixou claro que a situação não se resolverá tão simplesmente. “A comunidade internacional não permitirá que os regimes iraniano e sírio, através de seus contatos internos, controlem o Líbano”, disse ele. É no mínimo irônico que isso tenha saído daquele que mais apoiou a frustrada invasão israelense ao Líbano em 2006, e que conseguiu com a sua fracassada ocupação ao Iraque dar uma influencia imensurável ao Irã naquele país, incentivando uma rivalidade global entre sunitas e xiitas que desestabilizou todo o Oriente Médio.
Mas o acordo de Doha se provou mais um golpe contra os planos estadunidenses e sionistas. O acordo estabelece a aprovação de novas leis eleitorais para 2009, e a formação de um novo governo de unidade nacional com poderes de veto para a oposição, que é liderada pelo Hizbollah. Satisfeitos com o resultado, o Hizbollah comemorou em Beirute com uma ironia à liderança política estadunidense: desfilaram com um cartaz que dizia “Missão Cumprida”, uma alusão ao cômico episodio de 1º de maio de 2003, quando Bush pronunciou um discurso triunfalista, sob um cartaz com mesma inscrição, poucas semanas após invadir o Iraque.
Ao final do dia em que o acordo foi conseguido, simpatizantes da oposição no Líbano iniciaram a retirada de um campo de protesto instalado em Beirute 18 meses antes, no centro da cidade, para forçar a renúncia da maioria governista. “Estive aqui por 542 dias”, disse Ali Hammoud, um simpatizante do Hizbollah. “Estávamos todos esperando por uma ordem de retirada”, concluiu. A ordem esperada foi dada na quarta-feira (21) pelo líder da oposição, Nabih Berri, do Partido Amal. O protesto havia sido iniciado em 1º de dezembro de 2006, quando barracas foram instaladas pelas ruas da cidade até a porta do escritório de Fuad Siniora, bloqueando também ruas e o acesso ao aeroporto da capital libanesa. O desmantelar de um protesto tão grande e organizado simboliza a dimensão do sucesso da oposição com os acordos obtidos em Doha.
É inegável que o Hizbollah e seus aliados da oposição, muçulmanos e cristãos, venceram a disputa política. O partido islâmico, como era esperado, comprovou sua superioridade política e militar durante a crise. Ao mesmo tempo, a prova de força contra a maioria governista nunca passou dos limites e jamais cogitou tomar o poder do país ilegitimamente. Sayyed Hassan Nasrallah, secretário-geral do Hizbollah, declarou desde o início que “é um dever do movimento defender suas armas e a legitimidade da resistência”, confortando o povo libanês de que um golpe de estado, como a mídia ocidental insistia que estava a caminho, nunca aconteceria. “Não queremos uma guerra com ninguém, mas não toleraremos tornar o aeroporto de Beirute uma base para o FBI, a CIA ou o Mossad”, disse Nasrallah.
A “missão cumprida” do Hizbollah marca um primeiro passo de sucesso para reorganizar a política interna do Líbano. O Exército libanês, criticado por não intervir durante os últimos confrontos em Beirute, se mostrou capaz de ignorar as pressões políticas de Estados Unidos e Israel e manter-se independente. O chefe das Forças Armadas, o general Michel Suleiman, cogitado para ser o novo presidente do país, afirmou que “envolver o Exército nos confrontos internos serviria somente aos interesses de Israel” – uma visão sempre apresentada pelo Hizbollah. Enfim, o partido islâmico se manterá armado para se defender dos futuros ataques de Israel. O acordo de Doha estabelece que “a questão da resistência e de suas armas não é tema de discussão” – uma grande vitória para a resistência.
FONTE:
Jornal Oriente Médio Vivo – http://www.orientemediovivo.com.br
Edição nº104 – http://orientemediovivo.com.br/pdfs/edicao_104.pdf
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