Desde que o presidente não eleito Michel Temer assumiu o cargo, a perseguição de jornalistas progressistas e a interferência direta na comunicação pública do país vêm sendo denunciadas por especialistas na área.
Para eles, o cenário atual pode ser comparado à censura e cerceamento à liberdade de imprensa que marcaram o período do golpe militar no país.
Patrick Mariano Gomes, advogado da Rede Nacional de Advogados Populares (Renap) e pesquisador das medidas do governo Temer, avaliou que o retrocesso que vivemos em termos de direito de expressão é próprio de regimes ditatoriais.
“E a condução do Eduardo Guimarães, aquele comunicador, um blogueiro, pelo juiz Sérgio Moro, é uma continuação, uma sequência, dessa visão contra os direitos de expressão. A Operação Lava Jato, na verdade, popularizou também a condução coercitiva sem qualquer fundamento jurídico. Na verdade, se trata de uma prisão, uma forma de violência, de tortura, contra os acusados. Portanto, esse pacote de violação do direito de expressão, violação das liberdades individuais, guarda profunda relação histórica, sim, com o regime militar”, avaliou.
O caso do blogueiro Eduardo Guimarães, destacado por Gomes, ocorreu no último dia 21. Autor do Blog da Cidadania, que repercute notícia jornalística, Guimarães foi levado pela Polícia Federal por divulgar informações vazadas sobre a condução coercitiva de Lula, o que supostamente seria quebra de sigilo de investigação criminal.
Na comunicação pública, essa perseguição tem se tornado cada vez mais frequente. É o que afirma Rita Freire, presidenta cassada do Conselho Curador da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), extinto após a posse de Temer.
“Assim que o governo se instalou, a primeira ação foi ilegal. E isso acontecia na ditadura, quando o presidente podia tomar um ato que a lei não permitia que ele tomasse, que foi a demissão de um presidente da empresa com mandato. Depois disso, nós tivemos o desmonte da participação social do Conselho Curador. Isso também aconteceu com a TV Cultura na época da ditadura”, declarou.
Freire denunciou exemplos de demissões e censuras que vêm ocorrendo na EBC.
“Os abusos estão acontecendo. No começo de março um jornalista de São Paulo foi demitido, o jornalista André Muniz, porque ele fez a cobertura de um ato do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto”, exemplificou.
O programa Repórter São Paulo da TV Brasil deixou de ter entrevista ao vivo no estúdio após dois entrevistados terem pronunciado a palavra de ordem “Fora Temer” no ar. Nas reportagens a expressão está banida.
“A nova direção é que você estude quem é o seu entrevistado antes de entrevistá-lo. Ou seja, isso é uma censura da fonte, é uma censura de assunto. A EBC é hoje o exemplo do tipo de jornalismo que esse governo pretende impor à sociedade”, declarou.
Em nota, a EBC contestou o desmonte descrito por Freire. “Os veículos da empresa têm investido diariamente no aprimoramento dos serviços de interesse da sociedade”. Eles afirmam que “a comunicação pública não se destina à militância político partidária de qualquer natureza”. Acrescentam, ainda, que uma das tarefas da empresa é não permitir que a programação seja usada como instrumento na disputa de militantes político-partidários, e que continua valendo as diretrizes expressas no manual de jornalismo de 2013.
Procurado pela Radioagência Brasil de Fato, o governo federal não se posicionou sobre as acusações.
Por Júlia Dolce, Brasil de Fato. Edição: Daniela Stefano