Chavez X Capriles: democracia e liberdade de expressão

Às vésperas de uma das eleições democráticas mais importantes em toda a história da América Latina, o presidente Chávez está na televisão, que transmite sua última coletiva para a imprensa internacional, com centenas de jornalistas de todo o mundo. Segue nos meios de comunicação o chamado à mobilização e à importância de votar, que se iniciará na madrugada. Tanto nas emissoras públicas que apoiam Chávez, quanto nas opositoras, capitaneadas por Venevision e Globovision. Os meios de comunicação, aqui, no Brasil e no mundo, falam que não há liberdade de imprensa na Venezuela, que há uma ditadura do presidente, mas essa mentira se esvai na primeira mirada que se dê nos canais de televisão e nas manchetes nas bancas de jornal.

Desde a terça-feira, quando cheguei, tínhamos ao mesmo tempo na tv comícios dos dois candidatos, Chávez em Valencia e Capriles em Zulia. Todos estes dias, sob variados formatos, a política e as eleições estiveram a maior parte do tempo na programação da televisão, em todos os canais. E as manchetes dos principais jornais impressos – diariamente questionando o governo e agredindo o presidente – comprovam a liberdade de imprensa existente na Venezuela. A disputa entre um projeto de socialismo do século XXI e o liberalismo apresentado como centro-esquerda é explícita. Não pensei que tão cedo fosse ver isto em nossa América. Algo muito educativo, interessante de ver, sem aquela tentativa hipócrita de tentar neutralidade e imparcialidade na informação.
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E, embora o candidato da oposição – Henrique Capriles – seja radicalmente diferente de Hugo Chávez, acaba forçado a utilizar semelhanças no discurso para ficar mais palatável ao povo venezuelano (“te quero Venezuela”), educado para outro mundo possível nos últimos quatorze anos. Falar de sentimento soa falso na boca do candidato da direita. Sobretudo, quando dito no mesmo discurso que foi iniciado praticamente desejando a morte do comandante. “Aqui se encerra um ciclo, quero que se vá em paz”, desejou diariamente ao presidente Chávez! Um dos discursos ouvidos da direita terrorista era sobre a doença do presidente, inclusive nas mensagens que as pessoas estão recebendo no celular e pela internet, diz que não vale a pena votar em alguém que não tem dois anos de vida. O discurso da direita passava uma mobilização pelo ódio, pela raiva ao comandante que o povo escolheu.

Democracia a partir das comunas

Acontece que o povo tem um caso de amor com Chávez. E ele é um pedagogo, como disse uma companheira feminista. É uma liderança indiscutível, aquele político por vocação que ama seu povo e quer construir para ele uma linda vida. Chávez não tem vergonha de falar de amor ou chorar, ou mesmo dizer que errou. A educação para outros valores, anticapitalistas, está por todo lado, toda a propaganda neoliberal feita pelos grandes meios de comunicação não atinge a consciência da maioria do povo. O coração é principal símbolo desta campanha – “Chávez corazón del Pueblo” -, e aliado aqueles olhos que veem a cada cidadão ou cidadã, levantou mais alto que nunca a autoestima das pessoas, que se percebem protagonistas da História.
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“Tu não podes comprar a chuva, tu não podes comprar a alegria, …
Não se pode comprar as cores, não se pode comprar o sol…” é música que toca agora na tv, enquanto se fala da festa eleitoral que teremos amanhã, e no fundo pulsa “el Pueblo decide”. Aqui o povo decide mesmo, e esse exercício está hoje muito além do voto. Formação política, educação para o cuidar coletivo, valores voltados para a valorização do ser, estão por toda a parte, além da televisão: no metrô, nos grafites, nas bancas de jornal que vendem publicações com todas as leis para o aprofundamento da democracia, inclusive a constituição, popularizada pelo presidente. O Grande Polo Patriótico, aliança de todos os partidos que apoiam a revolução bolivariana e também de frentes e movimentos sociais, reúne 28 setores, representados por mais de 8 mil movimentos, segundo sua coordenadora Blanca Eekout, que é também 2ª vice-presidenta da Assembléia Nacional da República.

A base dessa grande organização, posta em movimento agora pelo Comando de Campanha Carabobo, são os Conselhos Comunais e as Comunas. Segundo me explicou Ana Elisa Osorio, do PSUV (o partido do governo), aqui um Conselho Comunal reúne cerca de 400 famílias vizinhas; 20 ou 30 conselhos formam uma Comuna, que pode fazer projetos para o governo do que considere necessário. “É o exercício de transferência do poder ao povo”. Tudo isso vem sendo construído com as missões criadas pelo governo bolivariano, que começaram pela educação, erradicando o analfabetismo, a saúde levada aos morros, e agora há missões de vários tipos. Destaque-se no momento a construção de milhares de casas para os pobres por meio da Missão Vivenda, visível em toda Caracas. O povo apropriou-se dessas missões, defende-as, como defende a Chávez e lhe declara amor publicamente.

Informação, formação e conhecimento

Enquanto o discurso da revolução bolivariana fala de socialismo, de soberania nacional e alimentar, de solidariedade, igualdade, orgulho de ser coletivo, de paz e de um futuro sustentável, o discurso da oposição quer atingir o cidadão consumidor, contrapondo à isso falhas nos serviços, como segurança e luz, os temas mais falados por eles. “Ele quer salvar a humanidade, mas não importa que não tenha luz, segurança”, fala Capriles, “o que importa é apenas ele e sua revolução”! O filho de uma família burguesa, dona de vários negócios, inclusive rede de rádios e outros meios de comunicação, não sabe que a tal revolução só existe se for obra de muita gente, e que o empoderamento popular já começou na Venezuela! “Chega de obras que nunca terminam, eu prometo assumí-las e termina-las”, prometeu Capriles aos seus apoiadores. Ele não percebeu que superar o capitalismo, lutando dentro das regras que o sustentam, é obra de grande envergadura histórica, impossível de fazer correndo, enfrentando ainda o bombardeio mundial de propaganda contra.
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“Quando chegamos já estava aqui o latifúndio midiático, que tem a violência como estratégia de comunicação”, disse Blanca Eekout, que também foi Ministra das comunicações e responsável pela televisão pública venezuelana. Segundo a deputada, esse latifúndio tem mais de 400 emissoras de rádio e 27 de televisão e além de promover a desqualificação do governo permanentemente, deixa pouco espaço no espectro elétrico para uma comunicação realmente democrática. Mesmo assim, as rádios e televisões comunitárias crescem desde o início da revolução e, segundo a antiga comunicadora comunitária (Catia TVe) e ex-ministra das comunicações, “foram os instrumentos que deram o avanço no processo”. Chávez nunca se descuida da comunicação, reforçando seu vínculo político, ideológico e amoroso com o povo, lembra ela.

Junto com o avanço social, investe-se no avanço tecnológico. Eekout orgulha-se do plano de alfabetização tecnológica, iniciado há pouco, que distribuirá computadores pessoais para cada criança, em todas as escolas primárias. Existem os infocentros para a toda a população, segundo a deputada, espaços com internet grátis construídos em todos os municípios, até nos mais afastados como os da fronteira ou do campo. Para dar conta de tudo isso, a Venezuela já conta com dois satélites próprios, “para desenvolver tecnologia e conhecimento”. Realmente, em meio à grande crise que vive o capitalismo, essa revolução bolivariana é um exemplo de modelo anticapitalista, que já conquistou o título de país com melhor igualdade na distribuição dos recursos em todo o continente.

Por tudo isso, observadores de todos os países latino-americanos, da Europa, e alguns da Ásia e Oriente Médio, acompanham com muito interesse a eleição que pode dar continuidade a este rico processo de construção do socialismo do século XXI. Por isso, as forças de direita de todo o mundo jogam tudo o que podem no apoio aos que tentam derrotar Hugo Chávez. A expectativa é imensa e crescerá nas próximas horas. “A campanha de terrorismo midiático”, disse Eekout, “só pode ser vencida pela unidade das forças mobilizadas em torno de um compromisso militante. Somos exemplo de que se pode governar sem servir as oligarquias econômicas, sem servir o imperialismo. Somos exemplo de que se pode governar e impulsionar o desenvolvimento a partir do poder popular e este exemplo é perigoso, é o exemplo de que outro mundo é possível”.
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