Poucos debates estiveram tão lotados quanto aqueles ocorridos no Planeta Arco Íris no dia de ontem. Espaço destinado à “interação entre os diversos sujeitos que tenham interesse ou desenvolvam ações voltadas à temática de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais – LGBT”, faz parte das Tendas situadas fora do espaço principal do Fórum Mundial de Direitos Humanos. Entretanto, o mesmo não acontecia nas outras tendas. Além desta, existem outras duas: Casa dos Direitos e A Comunidade das Comunidades. Destas, a primeira é um projeto da Coordenação Geral dos Centros de Referência em Direitos Humanos e a segunda é espaço de encontro e acolhida às diferentes manifestações culturais e religiosas de comunidades tradicionais.
A estratégia de construir espaços dirigidos a segmentos específicos tem avaliações positivas e negativas. Para o coordenador da Casa dos Direitos (Tenda 1), João Alves, “assim temos condições de construir programações pelas temáticas, ao invés da disponibilidade das salas”. A impressão de que esta tenda está sempre vazia deve-se ao fato de lá existirem dois auditórios fechados, ocupados principalmente por trabalhadores ou interessados de todos os Centros de Referência de Direitos Humanos no Brasil, com programação organizada por uma equipe de auto-gestão. Segundo Alves, “nos dois primeiros dias já passaram mais de mil pessoas por este espaço. Os temas vão se completando e os participantes vão evoluindo no debate”.
Lucas de Alencar, à esquerda, Berenice ao microfone
No Planeta Arco Íris a polêmica é maior. Keila Simpson, travesti que coordenava uma mesa ontem, se disse surpresa com a lotação. “Isso se deve a existência desta tenda, que congrega todas as diversidades”. Já para Lucas de Alencar, da Comissão de Diversidade Sexual da OAB nacional e coordenador da mesa seguinte, a autocrítica deve ser feita. “Sentimos que criamos uma barreira física e simbólica, mantendo para fora pessoas que deveriam escutar o que estamos falando aqui. Ficou um espaço só para gays, lésbicas, transexuais; como estratégia política pode não ser bom para ampliar as nossas redes”.
Janice à direita
Janice Aparecida Souza, coordenadora da Casa de DH do governo de MG e pesquisadora de gênero e do bulling homofóbico, tem dúvidas sobre uma avaliação. “A primeira coisa que me ocorreu quando vi o espaço das tendas foi de que haveria uma hierarquia entre os temas neste Fórum”, disse ela. “Depois achei que essa especificidade pode respeitar a identidade de determinados grupos, embora a geração mais jovem não precise mais de viver no gueto como aconteceu com a geração mais madura; o ideal é que possamos conviver com todos”. A possibilidade de conhecer novas pessoas, autoridades do movimento, faz com este espaço seja ideal, para Eduardo Goleman, da Coordenação Municipal de DH de Picos, no Piauí.
Na Comunidade das Comunidades, só tive oportunidade de assistir a um seminário, com presença reduzida: “Abrace a Diversidade – Juventude, Cultura, Religiosidade e Direitos Humanos”. Como disse Rafael Soares (na foto, ao microfone), religioso de matriz africana, esta tenda reúne novos atores da sociedade civil, “não porque são novos na luta, mas porque eram invisíveis. Temos que afirmar nossos direitos, fazendo a conexão entre os que são mais desiguais”. Ele falava da juventude negra que enfrenta um genocídio, dos povos indígenas que estão sendo massacrados, religiosos que são criminalizados por serem de determinadas etnias, como os ciganos, outro exemplo além dos terreiros e dos quilombolas.
A luta pelo Estado laico é priorizada em todas as tendas. “Todos nós fazemos parte de um todo que conecta todos os seres viventes”, maneira de ver o mundo de Rafael Soares. “Só com o Estado laico é possível avançar no direito à diversidade, que deve ser garantida pelo Estado”. Para a conhecida jurista Maria Berenice Dias, parte de mesa na Tenda 3, “Planeta Arco Íris deveria ser o nome do Planeta Terra, congregando a diversidade e o respeito à pluralidade”.
A Ciranda participa da cobertura colaborativa do Fórum Mundial de Direitos Humanos.