Como na música de John Lennon, “Imagine”, militantes de diversas partes do mundo imaginam um outro mundo possível e foram às ruas de Túnis, na terça-feira (26), para pedir a união dos povos com igualdade para todos; a manutenção das liberdades democráticas, algumas recém conquistadas e outras ainda por vir; e a paz mundial.
Homens, mulheres, jovens ou não, com ou sem religião, buscam alternativas ao atual sistema capitalista hegemônico. Contra o imperialismo, grupos ecoavam palavras de ordem, agitavam suas bandeiras e acenavam suas lutas para todos que quisessem ouvir. Os tunisianos, sempre muito envolvidos com tudo, acolheram a mobilização com alegria e solidariedade.
A todo instante, movimentos de nacionalidades diferentes trocavam palavras, firmavam compromissos de contatos desde a concentração da marcha, que começou por volta das 16 horas, na Praça 14 de janeiro de 2011, local da rebelião democrática. A integração permaneceu durante todo o longo percurso da marcha.
“Estamos conhecendo o movimento negro na Tunísia e demais países árabes e estamos bastante otimistas sobre tudo o que estamos trocando”, destacou Edson França, presidente da União de Negros pela igualdade (Unegro).
Um desses movimentos é o Adam for Equality and Development, que se apresenta como o primeiro movimento negro da Tunísia organizado, depois da insurgência ocorrida no país em dezembro 2010.
“Agora, a Tunísia vive uma instabilidade. Mas nós já percebemos uma nova Tunísia. Uma Tunísia de todos os povos, uma Tunísia de negros, de brancos, de homens e mulheres. E isso é um sonho”, declarou bastante emocionada a jovem negra Soudani Amina, integrante da organização tunisiana.
“Percebe-se na Tunísia uma relativa democracia. A gente tem informações geralmente da grande mídia essencialmente crítica ao país. Mas já dá para perceber, até aqui na marcha, que é um povo que tem tradição de protesto, de rua. A gente vê uma presença de mulheres, com ou sem burcas, de juventude, uma unidade nas palavras de ordem e uma certa força no ativismo”, observou o presidente da Unegro, que afirma ter uma visão “bastante positiva” sobre a unidade dos povos árabes.
“Sobre a revolução, é um tema não esgotado e os tunisianos estão dando continuidade ao processo. E certamente ainda vai crescer bastante. Com isso, cresce também o Fórum Social Mundial, uma vez que o Fórum continua sendo o espaço mais importante de aglutinação do pensamento antineoliberal dos movimentos sociais. O Fórum tem que continuar”, enfatizou Edson.
Também presente na marcha, a secretária da Mulher da Central de Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Raimunda Gomes, a Doquinha, também fez questão de mencionar o simbolismo do ato.
“Existe uma euforia muito grande de todos os povos presentes, até porque aqui a Tunísia simboliza um momento histórico muito importante da atualidade. E acredito que todos vieram para cá com o mesmo espírito, de construir um mundo melhor”, disse Doquinha.
Tanto a Unegro, quanto a CTB, promovem atividades no FSM. A Central faz o seminário “A luta pela paz: As políticas sociais inclusivas e o papel da ciência e tecnologia na soberania dos povos”, em conjunto com a Confederação Nacional dos Trabalhadores Liberais Universitários (CNTU) e com a Federação Nacional dos Farmacêuticos (Fenafar), na quinta (28).
“Vamos voltar aos nossos países mais enriquecidos no sentido de que é sim possível construir um mundo melhor. O espírito do Fórum não morre, continua vivo e temos que insistir para mantê-lo nesse formato que ele é”, declarou Doquinha.
Após cerca de oito quilômetros de marcha, os manifestantes chegaram ao estádio de futebol de Túnis, o Cité Nationale Sportive, onde foi montado um palco ao lado para os discursos políticos de diversas organizações presentes. Já era noite, e uma lua cheia brindou os ativistas, ainda cantando e dançando. Nos últimos instantes da marcha, em meio a palavras de ordem, era possível ouvir uma música clássica tocada por um violino.
Logo em seguida aos discursos, Gilberto Gil subiu ao palco e contagiou o mundo árabe com seu suingue brasileiro. Durante o show, entre uma música e outra, ouvia-se a reação do público presente: palmas, brados e até o hino comunista A Internacional foi cantado em árabe.
Gil cantou a Bahia, a cultura negra e a paz. Em um dos momentos marcantes fez o público cantar junto os versos de “Imagine”. “Imagine não existir países, não é difícil de fazer, nada pelo que matar ou morrer e nenhuma religião também. Imagine todas as pessoas vivendo a vida em paz”. Imagine. Faça. Mobilize-se por um mundo melhor. É o que pedem os ativistas em Túnis.
Deborah Moreira
De Túnis para o Vermelho
Imagens da marcha:
fotos: Deborah Moreira
fotos: Bárbara Ablas