Uma cidade construída para poucos. A política de remoções adotada pelo governo em defesa dos megaeventos e a perda do direito à cidade foi o principal tema da audiência pública que ocorreu na manhã da última terça-feira (3) na Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro.
Cerca de 100 pessoas compareceram à sessão promovida pela Comissão dos Direitos Humanos da Câmara. Apesar do convite, nenhum representante do poder público esteve presente para esclarecer a postura arbitrária do governo com os processos de remoções que já retiraram mais de três mil famílias de suas casas e ameaçam quase oito mil, segundo dados do dossiê realizado pelo Comitê Popular da Copa e Olimpíadas do Rio de Janeiro.
O professor Carlos Vainer, do Instituto de Planejamento Urbano e Regional (IPPUR), apresentou dados que colocam em xeque o conceito de democracia urbana. De acordo com Vainer, o auge das remoções havia ocorrido no período da Ditadura Militar com cerca de 35 mil removidos. Esse número pode ser superado durante a democracia. Hoje, os atingidos por esse modelo político podem chegar a 60 mil pessoas até 2016.
Para Vainer o objetivo das remoções é ‘limpar o terreno’ para as grandes obras de especulação imobiliária para a classe média alta. Segundo o pesquisador, esse modelo de cidade para quem pode consumir fica claro, por exemplo, com a reforma do Maracanã. O estádio deixou de lado o seu caráter popular e foi transformado num espaço para a elite.
A morosidade do poder judiciário colabora para que a cidade se torne ainda mais partida. Na Vila Autódromo os três mil moradores sofrem há vinte anos tentativas de remoções por parte do poder público. Mesmo com o título de posse e o seu direito à moradia assegurado na Constituição Federal de 88, o governo não deixa de insistir na remoção da comunidade. Para Altair Guimarães, presidente da Associação de Moradores da Vila Autódromo, a justiça brasileira favorece os interesses políticos.
Outras comunidades também são vítimas do jogo de cartas marcadas. Edson Gomes Filho é morador do Complexo do Alemão e integrante da ONG Verde Já. Segundo ele, a comunidade passa por um tratamento desigual. Moradores que vivem há 40 anos no local estão sendo removidos de suas casas para a criação do Parque Municipal Urbano da Serra da Misericórdia com a justificativa de causar impactos ambientais na região. No entanto, mineradoras que atuam no local estão com a permissão da Secretaria de Meio Ambiente do município para continuar as suas atividades.
A audiência Remoções por Grandes Projetos na cidade do Rio de Janeiro contou ainda com a participação da defensora pública Maria Lúcia Pontes, do vereador Renato Cinco, do Comitê Popular da Copa e Olimpíadas e de moradores impactados do Morro da Providência e Transoeste.