A última manhã de atividades do Fórum Social Mundial foi um momento de sintonia entre as vozes diaspóricas e os discursos locais. Reunidos na tenda quatro, estudantes, jornalistas, professores e ativistas de movimentos sociais de diferentes países abordaram as relações étnico-raciais na Assembléia de Convergência da Reunificação da África com a Diáspora e os Povos de Descendência Africana.
Conduzindo a mesa composta por representantes da França, Brasil e Senegal, o professor senegalês M. Djibril Gningue abriu espaço para o relato de experiências sobre a construção das relações raciais nesses países. Ouvidas atenciosamente pelo público e traduzidas por estudantes de letras da Universidade Cheik Anta Diop, as falas traçaram um pequeno painel das estratégias de luta pelo reconhecimento e valorização do homem e saberes africanos.
Representante brasileiro, Iedo Ferreira relatou sua longa militância em prol da reparação dos inegáveis danos sofridos pelos africanos que ingressaram no país na condição de escravo e que continuam atuando sobre os afro-descendentes. Aos 78 anos, o militante brasileiro propôs a criação de uma teoria para a libertação dos povos da África e da Diáspora, tendo como eixos os conceitos de reparação, panafricanismo e diáspora. Ferreira convocou os mais jovens a investirem nessa causa que se mantém atual quando se observa as desigualdades estabelecidas entre negros e brancos na sociedade “mestiça” brasileira. Ele destacou ainda a importância das mulheres na luta em favor da igualdade e da humanidade.
Integrante de uma ONG francesa, Carrie Marias ressaltou a necessidade de construção de ações e políticas afirmativas que auxiliem no combate ao racismo e fortaleçam a criação de organizações não-governamentais africanas, frisando a emergência de entidades lideradas por mulheres senegalesas.
O ponto alto da Assembléia de Convergência do Eixo Diáspora foi a exposição dos senegaleses que colocaram na mesa as discussões sobre o processo histórico do país e as questões locais derivadas das relações entre diferentes etnias. Implicada com a questão étnica, o conflito de Casamance, travado desde 1998, foi um dos temas discutidos. A animosidade entre os grupos étnicos na região ao sul do Senegal que disputam este território foi motivo de reflexão, pois consiste em uma exceção no contexto de relações pacíficas travadas entre peuls, sereres, diolas e outros grupos étnicos existentes no país.
Figuras atuantes na dissolução do conflito tiveram suas ações destacadas e valorizadas como parte do processo de amadurecimento dos cidadãos senegaleses. Um dos homenageados, o professor Samba discursou com entusiasmo, denunciando a ausência de vontade política do governo senegalês para a resolução do conflito e destacando o esforço da comunidade local para a conquista da paz na região.
Professor em instituições locais, Ibrahima Souané fez uma fala pautada por questionamentos sobre o modelo de educação adotado no país. Acima de tudo, ele considerou a perda de conteúdo dos atuais currículos que diminuem a importância de saberes locais, forjados pela tradição e experiência do homem senegalês e por isso, é de grande importância para a construção de identidade das novas gerações.
O professor Souané enfatizou a cultura como fonte para a resolução dos problemas dos povos africanos e da diáspora. As provocações do educador mexeram com os estudantes da platéia e, certamente, ajudaram a deslocar o olhar de todos para formas de educar e pensar que garantam maior empoderamento dos negros em África e na diáspora.