A despeito de todos os problemas logísticos que enfrentados em Dacar, particularmente a falta de tradução simultânea, que prejudicou absurdamente as atividades programadas e o aproveitamento das entrevistas coletivas, o FSM 2011 foi um dos que mais avançaram no debate da comunicação e a importância de democratizá-la. E isto foi fortemente impulsionado pelas midias alternativas
Pelo menos dois eventos conseguiram aglutinar a maior parte das organizações ocupadas ou preocupadas com a comunicação: o Seminário das Mídias Alternativas, nos três períodos do dia 8, e a Assembléia de Convergência para Ação, realizada na manhã do dia 11 sob o título provocativo: “Que comunicação para um outro mundo possível?” . Estes eventos mobilizaram propostas e preocupações comuns reunidas na “Declaração de Dakar: O direito de Informar e de ser informado”, e na convocatória de um II Fórum Mundial de Midias Livres para 2012, dando seguimento ao I FMLL realizado em Belém, 2009
Outra atividade integrante desse processo foi o Painel da tarde do dia 8, que procurou politizar o debate sobre o uso da tecnologia para a transformação social e contou com a participação do sociólogo Boaventura de Souza Santos, que vem defendendo a valorização do processo de comunicação compartilhada no FSM. Foi enfático o modo como ele defendeu que o Conselho Internacional do FSM assuma compromissos claros com essas propostas, inclusive mobilizando recursos para alcançar os que ainda não estão inseridos. Impacto e repressão ao wikileaks, apropriação de redes sociais contra regimes autoritários no Egito e Tunísia, e demais acontecimentos no Norte da Africa, ilustraram o painel com exemplos suficientes de porque a comunicação do FSM deve ser priorizada.
Também foram promovidas atividades pautando a relação entre a comunicação e movimentos sociais, a luta das rádios comunitárias na África (inserir nome e data das atividades efetivamente realizadas)
Processo
Olhar a comunicação como política estratégica e não apenas como logística do FSM tem sido uma reivindicação das mídias alternativas junto ao Conselho Internacional, propondo reiteradamente:
que o FSM convoque um debate mundial sobre o tema, que agora pode ser dar sob o formato metodológico de seminário, conforme proposto pela Comissão de Metodologia no CI 2010, no México;
que o conceito de comunicação compartilhada seja assumido e difundido como prática do FSM, o que agora começa a ser difundido através de sua newsletter, mas que ainda precisa ser assumido fortemente pelos sites e mídias ligadas ao FSM, educando por exemplo para que os conteúdos de interesse coletivo produzidos em seu processo sejam livres de copyright.
Essa perpectiva foi reafirmada na declaração final da Assembléia de comunicação, que contou com a participação de cerca de 60 organizações de diferentes países e continentes.
A proposta é de que o II FMML seja realizado no Rio de Janeiro, às vésperas das atividades relacionadas com a Rio + 10. Este evento, autoconvocado pelas mídias alternativas, independe e não exclui a proposta de que o FSM, através de seu Conselho Internacional, assuma a responsabilidade de convocar e promover, como um de seus eventos internacionais, um Seminário ou um Fórum Social Mundial Temático de Comunicação
Convivência no Espaço das Mídias Alternativas
As mídias alternativas conseguiram espaço apropriado para o seu trabalho no FSM, a despeito da carência de internet para atender a demanda. O trabalho do Comitê de Comunicação Africano junto à logística do FSM, e o empenho em respeitar recomendações feitas durante a reunião da Comissão de Comunicação Internacional, no Conselho Internacional de Novembro, assegurou que o espaço da Biblioteca da UCAD II dispusesse de instalações para a convivência entre as mídias.
A presença de facilitadores internacionais dias antes do FSM contribuiu para a familiarização prévia com o espaço das midias alternativas e Fórum de Tvs, e o ambiente também acabaria sendo utilizado para uma sequência de entrevistas coletivas organizadas pela Comissão de Comunicação.
A baixa capacidade de conexão de internet, embora comprometesse o andamento dos trabalhos, foi percebida pelos ocupantes do espaço como parte dos problemas de infra-estrutura enfrentados pelo conjunto do evento FSM e não pode ser avaliada separadamente.
Houve razoável interação com comunicadores de outros países da Africa, incluindo aqueles que mesmo atuando em um Centro de Convergência externo, organizado pelo IMC Africa, se mobilizaram para interagir com outros projetos. Também houve bom aproveitamento do espaço para a preparação de atividades conjuntas, como a marcha de abertura, uma reunião geral da Comissão de Comunicação e outra de organização da Assembléia de Convergência, e até mesmo de oficinas práticas e improvisadas de stencil, video, etc . Esses momentos propiciaram oportunidades de convivência, fator que desde outros fóruns tem contribuído para o ingresso e a permanência de comunicadores/as independentes nos processos de comunicação ligados ao universo temático do FSM.
Nesse espaço, poderia ter sido maior o contato das mídias alternativas visitantes com comunicadores e estudantes senegaleses, que estiveram possivelmente em outros locais de atividade, contribuindo para projetos específicos de cobertura. Com algumas exceções de jornalistas locais que fizeram o contato por iniciativa própria, foram poucas as oportunidades de criar laços mais permanentes e de compartilhar visões e práticas, embora acreditemos que esse processo tenha se dado mais positivamente no âmbito africano, por meio das iniciativas que procuraram inserir esses jovens nos espaços de diálogos sobre a comunicação do FSM. (este balanço pode ser melhor complementado com informes das mídias africanas)
A cobertura do evento FSM pelas mídias alternativas
Os temas cobertos pelas mídias alternativas no FSM refletiram os assuntos que mais mobilizaram esta edição. Em primeiro lugar, a simultaneidade com um período de revoltas e
vitórias populares ao Norte da Africa. Os acontecimentos no Egito foram seguidos paripasso nos dias do FSM e interferiram nos seus programas e debates, até a queda de Mubarak. Tunísia era sempre lembrada como acontecimento ligado ao mesmo processo de rebeldia regional, reforçado com uso das redes sociais. A presença marroquina, que de um lado trouxe ao FSM uma ligação mais intensa com os processos regionais, também foi motivo de pauta das mídias alternativas por outro motivo: a presença de um grupo apoiador da atual política de Marrocos em relação ao Sahara, e de oposição portanto às resistências saharauis participantes do FSM. Um grupo de mulheres saharauis tornou-se o primeiro alvo das agressões desses estranhos participantes, denunciados em entrevista coletiva de suas vítimas.
Outro tema de grande interesse das mídias alternativas foi a presença da Diáspora Africana na Ilha de Goré. Com o lançamento da Carta Mundial dos Imigrantes antes do FSM, foi possível para uma grande quantidade de participantes do FSM visitar a Ilha com certa tranquilidade e dar depoimentos. Para comunicadores brasileiros/as participantes da Ciranda, a visita à Casa dos Escravos, entreposto comercial de seres humanos durante os tempos de escravidão, foi o acontecimento mais impactante deste período preparatório.
A comunicação foi em si um tema de interesse. Não só por estar relacionada com acontecimentos políticos recentes ou simultâneos ao FSM, mas por apresentar agenda própria de debates, que envolveram esforços de transmissão direta pela rede.
Ações que promoveram sua própria comunicação também tiveram acesso mais ágil aos espaços das mídias alternativas, incluidos blogs, redes sociais e materiais reproduzidos em listas. Exemplos foram a Via Campesina, que soube difundir claramente sua agenda no FSM e a própria Carta Mundial dos Imigrantes, que vem fazendo difusão prévia de seu processo de construção, por meio de site e releases próprios.
Tanto o início do FSM, que tradicionalmente é o período de maior visibilidade, por conta da marcha de abertura, os dias finais do FSM, com suas assembléias, renderam pautas da comunicação que continuam sendo subsidiadas com relatos, declarações, e outros documentos, como o relato da Marcha das Mulheres ou a Carta de Apoio às Mulheres do Mundo.
As assembléias de convergência para ação, convocadas em Dakar, geraram o sentimento de que o FSM pode ser sim mais do que um espaço de encontro, mas também um gerador de propostas coletivas internacionais, ações e compromissos conjuntos, sempre que também este processo de convocatórias se de por meio de convergências e ações auto-gestionadas.
A Assembléia dos Movimentos Sociais reuniu cerca de 2500 pessoas para construir uma agenda comum de mobilizações e compromissos de luta. Também houve convergências em solidariedade com a Palestina, reforçando a campanha BDS, convergências da Diáspora, buscando jogar mais luz sobre as relações histórias e culturais da África com o mundo, e convergências que mobilizam diferentes estratégias para agitar o período da Rio+20.
38 Assembléias foram convocadas e devem compor um caderno de declarações e chamados do FSM. A comunicação fará o caderno. Mas também será parte importante do seu conteúdo.
Cobertura e difusão compartilhada
Plataforma que integra o grupo de projetos compartilhados do FSM, a Ciranda dividiu seu trabalho segundo os 12 eixos do FSM, transformados em editorias, e em 4 idiomas. Também exibiu área de vídeos, ligada principalmente ao WSFTV, e galerias de imagens. Foram criadas 48 espaços editoriais separados por lingua/eixo, mais multimidia.
Para organizar a cobertura, a Ciranda realizou um trabalho prévio no Brasil com algumas iniciativas regionais que já vinham participando da construção de sua cobertura compartilhada do FSM. Destas, conseguiram mobilizar-se para o FSM comunicadores/as de Belém, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Curitiba e São Paulo. Textos publicados durante o FSM foram enviados a uma rede de tradutores que reuniu voluntários de Babels e colaboradores da Ciranda, contribuindo para uma cobertura multilingue. Esse trabalho foi monitorado por uma colaboradora de Londres, em parceria com Babels, e por um grupo de apoio ainda em formação na Ciranda.
Avaliamos positivamente a diversidade de projetos de cobertura não comercial do FSM. Estes se colocaram, de modo geral, como colaboradores entre si , mantendo suas coberturas especiais em sites como: Ejoussour, Carta Maior, IPS/TerraViva, Flamme D’Afrique/Panos, Amarc etc. A opção do site do FSM Dakar de atuar por meio de RSS (indexação de sites) também contribuiu para aproveitar essa produção valorizando seus espaços de origem.
Um boletim comum, com links para essas várias midias, foi proposto para reunir essas coberturas. Uma vez distribuído por meio de newsletter oficial do FSM, é de crucial imporância que o boletim seja retransmitido por todas as midias, listas e websites ligados ao FSM, como forma de de difundir informação mais completa ao conjunto das organizações que participaram do FSM e suas redes de contatos, além de aumentar as possibilidades de articulações globais após o término da edição de Dacar.