Em 1991, a Organização das Nações Unidas (ONU) defendeu um plano de paz, um referendo sobre o fim da ocupação marroquina, bem como as constantes violações dos direitos humanos contra o povo saaraui. Nada foi feito.
Em uma entrevista coletiva à imprensa brasileira, no Sindicato dos Engenheiros de S. Paulo, a integrante Chaba Sini, do Comitê Executivo da União das Mulheres Saaraui; e o representante do Comitê de Relações Exteriores para a América Latina da Frente Polisário, Karim Lagdaf, falaram sobre a estratégia de ganhar mais adesões no continente para defender sua gente.
De origem árabe, instalados no norte da África desde o século VII, eles esperam alcançar a independência a partir do apoio do povo marroquino e de povos de outros países, como Cuba, com quem mantém ótimas relações. Muitos jovens saarauis viajam a Cuba para estudar medicina, entre outros cursos.
“O nosso limite é agora. No último congresso da Frente Polisário foi difícil pedir aos demais quadros da base da Frente: ‘vamos dar mais tempo ao processo de paz ao invés de reagirmos’”, contou Karim Lagdaf, ao ser questionado até quando vão esperar por uma resposta que traga a paz, lembrando que a grande maioria de seu povo é formada por jovens que anseiam por liberdade.
“Estamos querendo uma pressão internacional para que o Marrocos seja obrigado (a ceder) e que se aplique na legalidade as resoluções internacionais. O mundo tem que saber o que pensa o povo saaraui. Estamos esperando há 21 anos. Estão matando nosso filhos, massacrando nosso povo. Apelamos para que a comunidade internacional não deixe que esse conflito aconteça. Que reverta a situação por via pacífica”, declarou o representante saaraui.
Apesar do desgaste, o otimismo dos representantes esteve presente em todas as suas falas. Há esperança em meio a tanto sofrimento. Centenas estão presos e outros tantos desaparecidos. As famílias não conseguem enterrar seus filhos.
O sopro de esperança vem junto com a Primavera Árabe. A sociedade marroquina também está sofrendo uma “evolução”. “Antes, nada podia se falar contra a posição oficial. Marrocos é um país onde se obedece a deus, ao rei e a pátria. Nessa ordem. O que o rei diz é sagrado. Hoje em dia, as pessoas estão enxergando outras dimensões. Já há organizações marroquinas de direitos humanos que condenam o governo do Marrocos”, contou Karim.
Segundo ele, há partidos políticos no interior do Marrocos que defendem a independência de seus territórios. O povo já percebeu que é manipulado. O rei está nu. Para exemplificar, ele citou o movimento sindical crescente na República Árabe Saaraui.
“Cada vez que os sindicatos marroquinos organizam uma manifestação para pedir um aumento salarial, uma melhora social, eles (governo) dizem não, estamos em guerra, esperem até que termine. Essa é a resposta para tudo, é um calmante para todos os problemas sociais, políticos e de seguridade”, revelou o militante saaraui.
Semelhança com luta palestina
Em meados da década de 1970, o Marrocos promoveu a “marcha verde”, o ápice de seu processo de colonização, que levou cerca de 350 mil pessoas a ocuparem a região do Sahara ocidental. Utilizando bombas de fósforo e napalm, o governo marroquino invadiu o território saarauí em uma ação genocida contra a população.
Atualmente, nesse território ocupado, uma parte dos saarauis sofre com imposições econômicas e culturais. Outra parte, vive cercada por um muro de 2.600 quilômetros de extensão, em acampamentos, numa região inóspita do Saara e no sudoeste da Argélia, dependentes da ajuda de organizações humanitárias.
Para a construção do Muro da Vergonha, em 1989, como foi apelidado, o rei contratou especialistas israelenses para instalar um sofisticado sistema de detecção de movimentos. A cada cinco quilômetros há um detector de movimento de pessoas, veículos e animais. Tudo de fabricado israelense.
Segundo Karim, milhões de dólares dos cofres marroquinos são empenhados para manter o Saara Ocidental ocupado. E tanto dinheiro gasto tem uma explicação: os cerca de 280 mil quilômetros quadrados, onde abriga uma população que não chega a um milhão de pessoas, esconde tesouros como fosfato, águas e uma grande diversidade de peixes (264 espécies), além de ferro, urânio e, claro, petróleo. Além disso, a República Saaraui tem posição geográfica estratégica.
Indagados se estarão no Forum Social Mundial Palestina Livre, em novembro, na cidade de Porto Alegre (RS), eles não titubeiam: “Não podemos faltar. Nosso luta é a mesma”.
Posicionamento brasileiro
Apesar de acreditarem que o governo brasileiro simpatiza com sua causa, eles esperam um reconhecimento oficial do Itamarati. Durante o 2º. Congresso da Confederação Sindical de Trabalhadores/as das Américas (CSA), o qual foram convidados a participar, houve uma moção em solidariedade a seu povo, tirada durante o encontro, por unanimidade, o que os deixou bastante surpresos.
“Sentimos que há uma predisposição de que a América Latina nos reconheça. Mas precisamos desse apoio declarado para somar força”, enfatizaram os representantes, na entrevista que aconteceu na noite de sexta-feira (20).
Deborah Moreira
Da redação do Vermelho
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