Egito vive revolta popular anunciada

Inspirado pelos protestos na Tunísia, há mais de uma semana o povo egípcio vem realizando grandes levantes pela saída do presidente do país, Hosni Murabak, no poder desde 1981. Segundo o professor Mohamed Habib, egípcio – formado na Universidade de Alexandria, vice-presidente do Instituto da Cultura Árabe (ICArabe) e pró-reitor de Extensão e Assuntos Comunitários da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) –, a situação já estava tensa há muito tempo, não sendo resultado apenas das três décadas do governo Murabak. “O processo começou há 42 anos, no governo de Anwar Al Sadat, quando Murabak era seu vice. Depois do assassinato do primeiro, o segundo deu continuidade ao governo, sem se preocupar com a democracia e com as questões sociais que foram entrando em colapso”, conta.

Segundo Habib, o que ocorreu foi um processo de esgotamento em três frentes: a primeira é o esvaziamento do próprio governo, que não tem mais o que oferecer à sociedade, não tem mais como enganá-la, foram 30 anos em que nada do que foi prometido foi feito; a segunda é o término da esperança e da paciência da população; a terceira é o esgotamento da relação do governo egípcio com o dos Estados Unidos, isso porque, por 12 anos, Sadat atendeu aos interesses estadunidenses e, quando seu governo se exauriu, ele foi assassinado, com a conivência norte-americana. Murabak também assumiu o poder com o apoio dos Estados Unidos, pois vinha como uma renovação da esperança, com uma nova maquiagem, seria uma nova liderança, “ agora, que Murabak está desmoralizado, o governo norte-americano também o rifou e vai tentar colocar uma nova figura, com uma nova roupagem”, alerta o professor. Ele lembra que os Estados Unidos, apesar de serem grandes defensores da democracia, sempre apoiaram ditaduras e governos corruptos em função de interesses políticos e econômicos. “Há uma clara diferença entre o discurso e a prática desse país”, ressalta Habib.

O professor afirma que o que vem ocorrendo no Egito é um levante popular liderado por diferentes movimentos e grupos. “A sociedade civil está protegendo casas e instituições. As ações de marginalidade e violência que ocorreram foram feitas por pessoas vinculadas ao governo com o intuito de desmoralizar o movimento popular. Isso fica claro porque os armamentos utilizados nos ataques não existem no Egito, vêm do país vizinho, especialista em oprimir movimentos populares com o assassinato de civis”, frisa. Ele explica que Murabak quer acabar com o levante para tentar ficar mais algum tempo no poder e depois sair de forma mais tranquila, sem ser julgado pelos tribunais internacionais. “ A população está muito insatisfeita e a continuação desse processo de retirada de Murabak e seus aliados vai depender da organização popular, sindicatos e entidades de classe que devem mater uma agenda de emergência, formar um governo de transição com forças independentes, sem qualquer vínculo com o governo atual. O papel inicial será a elaboração de uma nova constituição para que se faça eleições diretas para a presidência e o parlamento”, acredita Habib.

Sobre a possibilidade de instalação de um governo islâmico no Egito pelo grupo opositor Irmandade Islâmica, o professor responde que é um discurso de Murabak e dos Estados Unidos para amedrontar a opinião pública. Isso porque o grupo, apesar de presente e ativo, tem força reduzida e até hoje não conseguiu promover qualquer alteração no país. “Se em 1952, ano da revolução, quando eram bem mais expressivos, não ocuparam qualquer espaço no poder, agora as chances são ainda menores”, garante. Para Habib, os integrantes do grupo poderão sim conquistar postos num eventual novo governo, mas democraticamente, por meio do voto popular.

Foto: Al Jazeera.net

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *