O déficit habitacional criado pela demolição das mais de 1,6 mil casas que ocupavam o terreno do Pinheirinho (a 97 km de São Paulo) ainda é um impasse. “Visitei uma casa de só um cômodo e queriam me cobrar R$ 700,00 pelo aluguel”, conta Pedro Lopes*, ex-morador da comunidade. Ele faz parte das 195 famílias que continuam nos ginásios poliesportivos cedidos temporariamente pela prefeitura de São José dos Campos, quase três semanas depois da operação de reintegração de posse. O governador Geraldo Alckmin anunciou um auxílio emergencial para aluguéis de até R$ 500 mensais, mas a quantia esbarra no valor alto dos apartamentos, na necessidade de fiador e no limite de três salários mínimos para a renda familiar dos desabrigados.
Dos 760 imóveis anunciados para aluguel no principal site de classificados da cidade, o mais barato se localiza na zona industrial do município e custa R$ 550,00. Nos anúncios do maior jornal local, o aluguel de uma casa de dois quartos na periferia vale em média R$ 800,00, alcançando R$ 1.300,00. As famílias desabrigadas chegam a reunir até 11 pessoas, entre crianças, adultos e idosos.
A reportagem telefonou para o proprietário de um imóvel de um cômodo no subúrbio de São José dos Campos. As dificuldades surgiram quando foi informado que o inquilino seria um ex-morador do Pinheirinho “Mas o aluguel social dura quanto tempo? Porque o nosso contrato é de no mínimo dois anos. E também precisa comprovar renda”, explicou o dono da casa, anunciada a R$ 480,00.
A necessidade de fiador residente na cidade, seguro fiança e caução de três meses também dificulta. “Todos aqui são pobres e perderam as suas casas inteiras com os pertences dentro. São empregadas domésticas, garis, porteiros, costureiras, garçons. Quem é que tem fiador?”, pergunta Valdir Martins, o Marrom, líder comunitário. Para facilitar a busca por um novo teto, a prefeitura que promoveu o despejo emitiu “cartas de recomendação” para os antigos moradores do Pinheirinho.
“A carta não substitui o seguro fiança, por exemplo, mas garante ao dono do imóvel que aquela família recebe do governo o auxílio aluguel”, explicou João Francisco Sawaya, secretário de desenvolvimento social. No caso de São José dos Campos, os custos do aluguel social são divididos entre prefeitura e o governo do estado, que pagam a cada família cadastrada R$ 100,00 e R$ 400,00, respectivamente. Segundo o governador Geraldo Alckmin, a duração do benefício é de seis meses, prorrogáveis até a construção de novas unidades habitacionais.
Em nota pública, a Secretaria de Direitos Humanos da presidência criticou a atuação da polícia militar de São Paulo e a situação dos abrigos. Entre as garantias exigidas, estão a realização de mutirões de saúde nos ginásios, emissão de garantia sobre o pagamento do aluguel social e um posto itinerante de cadastro profissional e oferta de vagas de emprego.
“Nós estamos há vários dias sem dormir desde a chegada da polícia. O ginásio é barulhento e superlotado, nós perdemos nossas roupas e documentos, as crianças não param de chorar, tem gente com a perna machucada pelas balas de borracha até agora”, afirma Cláudio Assis*, 31, quando perguntado sobre o teto de três salários mínimos do aluguel social. “Muita gente aqui não tem nem mais salário, perdeu casa e emprego”, completa. Existem ainda denúncias de preconceito contra os ex-moradores da ocupação que buscam moradia na cidade. Segundo Ana Clara Luz*, mãe de três filhos, “as pessoas desistem de alugar quando sabem que é para gente do Pinheirinho. Aumentam o preço, desligam o telefone e fingem que o imóvel não está mais disponível”, afirma.
O aluguel social é concedido normalmente após desastres naturais, como nas regiões devastadas por temporais, ou a moradores de encostas e áreas de risco. A prefeitura afirma que 85% dos antigos moradores da comunidade já saíram dos quatro abrigos montados em quadras e escolas da periferia da cidade. A administração não soube informar quantos destes conseguiram moradia através do aluguel social e quantos foram por conta própria para casas de amigos ou parentes, além da rua.
* Os nomes são fictícios para preservar a identidade dos entrevistados.