A presente declaração tem como objetivo apresentar às organizações e movimentos sociais de resistência da Bahia, de todo Nordeste e do Brasil, a proposta de construir, juntas e juntos, um evento de caráter mundial em Salvador, dentro do processo do Fórum Social Mundial (FSM), com data prevista em março de 2018.
O mundo enfrenta uma crise sem precedentes de múltiplas dimensões, entre outras, uma crise econômica, ambiental, política e social. As mudanças climáticas ameaçam a integridade dos ecossistemas e a sobrevivência das populações. A financeirização crescente da economia provocou o aumento das desigualdades em um patamar jamais atingido. Na maioria dos países, políticas de austeridade e de ajuste estrutural foram impostas para as populações, tendo como principais vítimas as pessoas mais vulneráveis.
Em diversas regiões, o contexto de guerras provoca multidões de refugiados e migrantes. O combate ao terror tem suscitado reações violentas e falsas soluções, de rejeição e ódio, xenofobia e racismo, além de políticas patriarcais e colonialistas, desprezando a dignidade humana e os direitos democráticos e sociais.
O Brasil, por sua vez, está enfrentando um golpe de Estado. Em toda América Latina, em todo mundo, as forças conservadoras estão crescendo e ameaçam as institucionalidades democráticas. O retrocesso dos direitos humanos e ambientais já é uma realidade. Por isso, é preciso ter coragem, alimentar e fortalecer a esperança, a luta e o mesmo ânimo que motivaram e conduziram o Fórum das Resistências em Porto Alegre.
Resistir é criar. É provocar o novo, em busca da retomada do pensamento e das práticas utópicas como também da mudança do curso da história. As organizações e movimentos baianos estão cientes da ousadia da sua proposta. A realização de um encontro de caráter mundial em Salvador constitui-se como uma provocação e ao mesmo tempo um convite à sociedade civil organizada brasileira para juntas e juntos, buscar caminhos para fortalecer as lutas de resistência em todo Brasil e pelo planeta, estimular convergências e propor as bases de um outro mundo, baseado na justiça social e na sustentabilidade ambiental.
Salvador, capital da Bahia, é a maior cidade negra fora da África, e está inserida na região Nordeste, que registra, junto com a região Norte, os maiores índices de desigualdade no país, e onde a sociedade civil organizada possui uma trajetória histórica de resistência. Organizações e movimentos baianos sempre estiveram muito envolvidos com o processo do FSM, com a realização, por exemplo, do 1º Fórum Social Baiano em 2004, do 2º Fórum Social Nordestino em 2007 e de um Fórum Mundial Temático em 2010. Nos últimos anos, o Coletivo Baiano do FSM, formado atualmente por 30 organizações, movimentos e redes da sociedade civil baiana, participou de forma ativa das edições mundiais do FSM 2013 e 2015 em Túnis (Tunísia) e no FSM 2016 em Montreal (Montreal), ou ainda dos Fóruns temáticos de Porto Alegre. Mantendo-se atuante permanentemente, o Coletivo Baiano realizou em Salvador múltiplas atividades, locais, nacionais e internacionais, com destaque para dois seminários internacionais, um encontro de articulação da sociedade civil brasileira rumo ao FSM 2015, e uma reunião do Conselho Internacional (CI) em outubro de 2015.
O CI do FSM, na sua última reunião durante o Fórum Social das Resistências em Porto Alegre, em janeiro 2017, deu o aval ao Coletivo Baiano do FSM para analisar a possibilidade de realizar, de forma articulada com movimentos sociais brasileiros, um evento de caráter mundial em Salvador em março de 2018. A ideia de um evento mundial é o resultado de um processo de construção de 3 anos por parte do Coletivo Baiano do FSM, e foi incentivada por diversas organizações, movimentos e coletivos brasileiros e internacionais. O CI atendeu à solicitação do Coletivo Baiano do FSM e concedeu um prazo de dois meses para que busque viabilizar as condições políticas e operacionais para consolidar esta proposta. No final do próximo mês de março, o Coletivo Baiano dará uma resposta definitiva.
Caso seja confirmado, as organizações do CI se comprometem em envolver-se no processo de articulação política para que o encontro seja o mais representativo possível da diversidade do movimento altermundialista de todo o mundo. Irão envolver-se nos momentos de luta jáconstituídos, em especial a COP23 (Conferência das Nações Unidas para Mudanças Climáticas) em novembro 2017 em Bonn na Alemanha, a reunião da OMC (Organização Mundial do Comércio) em dezembro 2017 em Buenos Aires na Argentina e uma ação global contra o Fórum Econômico de Davos em janeiro de 2018, com uma possibilidade de convergência em Salvador em março de 2018.
A realização em Salvador de um evento de caráter mundial em 2018 e a definição da sua natureza, no entanto, dependerão das condições a serem construídas nos próximos dois meses, tanto nas questões de articulação política quanto de ordem estrutural. Nesse sentido, o Coletivo baiano do FSM aponta os seguintes aspectos como elementos fundamentais desta construção:
· Autonomia da sociedade civil neste processo, como posto na Carta de Princípios do FSM de Porto Alegre.
· Articulação ampla e identificação de movimentos e organizações baianas, mas também nordestinas, brasileiras e internacionais, buscando envolvimento na construção do evento.
· Apoio de parceiros nacionais e internacionais, dentre os quais governos, universidades e organismos de cooperação.
· Coordenação política de movimentos e organizações baianas e nacionais.
O Coletivo Baiano do FSM propõe, desta forma, estabelecer um diálogo junto ao comitê organizador do Fórum das Resistências de Porto Alegre, bem como com os diversos coletivos do FSM no Brasil, a exemplo do Fórum Panamazônico, e com as outras organizações e movimentos sociais de resistência no país, acerca desta proposta, em vista da sua análise e de uma tomada de decisão coletiva.
Salvador, Bahia, Brasil, 31 de janeiro de 2017
Coletivo Baiano do Fórum Social Mundial – fsmcoletivobahia@gmail.com