Como nos últimos anos, o debate entre as organizações que preparam a manifestação do 8 de março também foi quente este ano. As divergências entre mulheres que pertencem a partidos que apoiam o governo e aquelas de partidos da oposição (pela esquerda, naturalmente) costumam atrasar a organização com discussões intermináveis e que a nada levam. Ali só há militantes, ninguém vai ganhar ninguém. Apenas cansam a nós, feministas menos sectárias, ou as que sabem que o buraco é bem mais embaixo, na luta contra o capital. E que o Dia Internacional das Mulheres – que é de luta por mais que os donos do mundo tentem nos ganhar com flores e bombons e palavras hipócritas – deveria autorizar a todas que estivessem juntas na mesma avenida, assim como estão os nossos algozes, hoje representados pela bancada BBB do Congresso mais escroto que já tivemos.
Estranhamente neste ano (e algo me diz que tem a ver com eleições), o racha inicial – que não vingou, claro, pareceu até um pouco encenação – , foi com o PC do B. Ausentes da primeira reunião convocada pela Marcha Mundial das Mulheres (PT) e tentando justificar pela mudança de local que diziam desconhecer, as “comunistas” saíram rachadas desta, pois o conjunto de organizações não quis aceitar as suas palavras de ordem para o que se chama “eixo” do ato, já decidido na primeira reunião. Mas, claro, durou pouco a diferença entre o PC do B e o PT. Bastou a crise política em que está metido o governo se ampliar.
O “normal” nos últimos anos tem sido o “racha” do bloco historicamente unido (PT, PSol, PC do B, CUT, CTB, LBL, ongs e alguns coletivos feministas mais antigos) com o bloco de oposição ao governo e àquelas centrais sindicais (PSTU, LER-QI, PCs), quando existiu divisão. Ano passado, por exemplo, o racha não se consumou. Assim também em outros anos, quando o que acontece, é irem todos os grupos e partidos juntos para a avenida, com seus discursos diferentes aqui e ali (e depois desabafar no balanço do ato). Mas o eixo feminista é comum a todas. Quem se lembra do ano passado, quando a data caiu num domingo – o que fez maior do que em anos anteriores a manifestação -, como foi linda e até podemos dizer “unitária”!
Neste ano de agravamento da crise política, ano eleitoral ainda por cima, frente aos recentes acontecimentos envolvendo o ex-presidente Lula, a defesa do governo Dilma e do seu antecessor tornou-se urgente para os setores governistas. Os partidos não tiveram dúvida, reuniram seus (e suas) militantes e tomaram a manifestação das mulheres com suas bandeiras político partidárias e encheram a avenida com faixas pró Lula e Dilma, uma enorme imagem de Lula e palavras de ordem na mesma linha. Dessa vez, PT e PC do B isolaram-se mais. O PSol (com exceção de uma tendência) também se juntou aos demais partidos de esquerda, como PSTU, PCB, PCR, coletivos independentes e feministas autônomas.
Encontrei uma jornalista e amiga, também da Ciranda, assustada por não reconhecer na manifestação pela qual passara as reivindicações feministas. Estávamos nessa hora em frente ao MASP, onde alguns coletivos feministas tinham permanecido e mulheres discursavam num microfone repudiando o que acontecera. A manifestação unitária se dividira em duas, e pelo caminho encontrávamos grupos e militantes perdidas, tanto geográfica quanto politicamente; todas lamentavam quando tomavam conhecimento de como as coisas se passaram.
Foi um alívio encontrar a “outra” passeata… ali reconhecemos as nossas vozes de luta. Estava então já com um grupo de outras amigas perdidas e foi muito bom poder cantar as palavras de ordem feministas, algo que parecia perdido neste 8 de março.
Um pouco antes encontráramos o bloco das secundaristas, lindo e perdido… perdido. Elas tinham andado um pouco atrás da passeata “pelega” como nos disseram, mas perceberam e voltaram, agora tentavam fazer a manifestação sozinhas, indo pelo meio da avenida. Só que a polícia vinha chegando e fomos atrás delas. Ali inclusive estavam filhas de amigas minhas, que nos encheram de orgulho no recente movimento de ocupação das escolas secundárias. (Diga-se de passagem cadê a reação ao governador que continua fechando escolas?) Foi assim que encontramos a outra metade do “ 8 de março”.
Ali, naquela outra metade do 8 de março estavam as continuadoras das manifestações contra Cunha do final do ano passado em São Paulo. (quase os mesmos que também estavam lá nas manifestações de 2013). Diga-se de passagem, que no Fora Cunha as mulheres do PT e do PC do B não fizeram parte da organização. Correram atrás, convocaram junto a próxima manifestação, mas perderam o bonde.
Não pensem que fico feliz com isso. Lamentei muito, chorei até. Se unidas, já é tão difícil a luta, imagina divididas! não venceremos o patriarcado nunca! É muito triste, dá pena mesmo, ver tanta mulher batalhadora, tanta feminista que construiu a pauta de luta das mulheres – e até mesmo as músicas e palavras de ordem – se perderem neste dia entre “Somos todas Dilma” (eu não sou e nem quero ser, jamais), “Mulheres do Lula” e os “Não vai ter golpe” de todos os tipos. Enquanto isso, as mulheres seguem sendo oprimidas, massacradas, violentadas de todas as formas, inclusive a que está na Presidência. Mas isso, ora, isso a gente vê depois.
Abaixo, a presença da Ciranda, orgulho de ser!!!