Meios de comunicação precisam de regulamentação

A pesquisa realizada pela FPA, cujos dados principais já foram divulgados em matéria anterior nesta Ciranda (http://www.ciranda.net/article7195.html ) , foi apresentada na última sexta-feira, 16 de agosto, e contou com a análise de militantes e estudiosos da luta pela democratização da mídia no Brasil. Todos defenderam que a Fundação continue a aprofundar o tema com novas pesquisas, até porque esta foi feita antes das jornadas de junho, nas quais, como todos sabem, o monopólio da mídia foi muito questionado. Várias questões importantes para quem luta pela democratização da mídia foram comprovadas pela pesquisa e estão destacadas nas várias matérias que estão circulando a respeito.

Um ponto de vista feminista

As feministas com certeza estiveram entre as primeiras a reclamar da imagem da mulher que a mídia difunde, desde sempre submetida ao patriarcado e ao mercado. Em nosso país, já de algumas décadas, elas levam à justiça peças publicitárias, construções dramáticas, letras de música, todas contendo agressões à mulher, preconceitos e estigmas, reforçadores dos valores que submetem historicamente as mulheres. Entretanto, o controle social da mídia tem sido uma “questão difícil de tratar”, como disse Rita Freire, conselheira da EBC(Empresa Brasil de Comunicação) e coordenadora desta Ciranda. Ela destaca o fato da maioria dos entrevistados terem defendido mais regras no conteúdo (71%, como uma questão das mais importantes. Sempre defendidas por nós, feministas, como uma das regulamentações mais importantes a se conquistar.

Além de também destacar o grande número de entrevistados que desejam mais regras para a comunicação, Beá Tibiriçá, do Coletivo Digital, defendeu fortemente o compromisso da FPA em dar continuidade a esta pesquisa, pois acredita que as jornadas de junho podem ter modificado algumas percepções. Reconhecendo que “a mídia tradicional teve papel forte nas pautas das mobilizações recentes”, chama a atenção do grande papel que tem a internet hoje e que tiveram as redes sociais na convocação e repercussão das manifestações.

Pesquisa reforça o PLIP da comunicação

Para todos os representantes do FNDC (Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação), a pesquisa foi muito importante. “Éramos completamente carentes de informação e dados sobre a percepção dos meios de comunicação”, disse Renata Mielli, do Centro de Estudos Barão de Itararé. “A pesquisa ajuda no discurso de que regulamentação não é censura”. O representante do Intervozes, Pedro Eckman, chamou a atenção para a altíssima porcentagem dos que se informam pela televisão (93%) e pelo rádio (79%) e acrescentou na análise o importante dado de que 60% da população desconhece que esses veículos são concessões públicas. E que apesar disso, a maioria sabe que os meios de comunicação defendem os interesses dos donos, dos políticos, dos mais ricos. Miro Borges, também do Barão de Itararé, acredita que os dados levantados reforçam a campanha do PLIP – Projeto de Lei de Iniciativa Popular, proposto pelo FNDC e na fase de coleta de assinaturas. Todos concordaram com isso.

Para Laurindo Lalo Leal Filho, sociólogo, jornalista e professor de Jornalismo da ECA-USP, tanto a Academia como a luta por outra comunicação, viverão uma linha de corte “antes e depois dessa pesquisa”. Além de destacar o rádio e a tv, “com um consumo brutal e diário”, o professor comentou o paradoxo entre “a falta da percepção da concentração e do monopólio” com “a necessidade de que algo precisa ser feito”. Lalo acha que devemos trabalhar o dado de que as pessoas acham que as emissoras de televisão são dos “donos”; sua proposta é de que as emissoras deveriam veicular constantemente durante a programação, em baixo da tela: “Esta é uma concessão pública do governo brasileiro, que começou em …… e termina em …..”. Defendeu também que os meios públicos devem ter obrigação de divulgar e debater a pesquisa, como ele fará nesta semana em seu programa VerTv.

Fundador da Agência Carta Maior e como representante das empresas da mídia alternativa (Altercom), Joaquim Palhares criticou fortemente o oligopólio. “Nestes últimos anos, a Rede Globo, o Estadão e a Folha especializaram-se em criminalizar a política, em transformar a política em algo ruim”. Dizendo-se chocado com o dado de que 94% da população assiste TV aberta – “as notícias que temos é de que a audiência do Jornal Nacional caiu muito” -, Palhares disse ter sentido falta, na pesquisa, da identificação das emissoras que estão sendo vistas. Daniel Castro, jornalista da FPA, constatou outra falta e falou da necessidade de discutir o papel da mídia pública na sociedade.

Violência não é natural

Do ponto de vista das mulheres, em minha opinião, também faltaram algumas coisas. As mulheres sabem o mal que a televisão faz para os seus filhos, do apelo ao consumo desenfreado e inacessível para a maioria até a propaganda de valores enganosos, a começar na alimentação. Entretanto, na pesquisa, apenas 38,5% disseram ser a programação negativa para a educação de crianças e adolescentes. Para 34,7% não ajuda nem prejudica e para 26,8% a televisão é positiva para a educação deles!!Será que essas pessoas sabem quais são os programas de maior audiência entre as crianças da base da pirâmide? Numa outra questão de múltipla escolha sobre o que não deveria ser exibido na Tv, o item sobre a infância está confuso – “ Programas infantis e publicidade para criança”. Eu não entendi, a começar das coisas juntas, programação e publicidade. Parece-me que é necessário mais debates no tema da programação para crianças e adolescentes, pois infelizmente elas assistem mais programação dirigida a adultos, além da publicidade dirigida a elas, coisa proibida por regulamentação de vários países e objeto de campanha por aqui.

Outro desafio vivido pelo movimento feminista é o de convencer o público de televisão, de rádio, teatro, música e etc. de que a violência contra a mulher não é natural. Nem na ficção, pois o campo do simbólico tem toda a importância na construção da subjetividade das pessoas, nos valores ideológicos que fundamentam o existir e o ser. E eu não acho que 36,4% de entrevistados na pesquisa opinando que a TV retrata as mulheres “sempre com respeito”, é um número desprezível. Mais de um terço das pessoas não perceberem o desrespeito permanente à imagem da mulher, juntando com 46,8% que acham que só às vezes a mulher é tratada com desrespeito, dá mais de 83% que acreditam que o modo como a mulher é mostrada é respeitoso, avaliação bem distante daquela feita pelo movimento feminista. Ainda que 61% sejam contra a exposição gratuita do corpo da mulher, acho pouco também.

Uma tímida maioria é favorável a que não sejam exibidos na TV, “conteúdos de violência ou humilhação” contra a população negra (54%), contra gays e lésbicas (54%) e contra mulheres (53%). Respectivamente 40%, 40% e 41% admitem tais conteúdos “com regras”, o que acho um número bem grande para quem considera normal esse tipo de conteúdo. Percebam que em relação às mulheres ainda deu um por cento a mais que as outras minorias. E não chega à metade (49,8%) dos telespectadores os que acham que não deveria ser permitido tipo de humor que ridiculariza as pessoas. Dados a se pensar mais e aprofundar em novas pesquisas, esse tal de controle social da mídia. Novas pesquisas sobre a mídia que certamente acontecerão, pois Joaquim Soriano, da Fundação Perseu Abramo ressaltou a importância de haver uma série.

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