O governo brasileiro tem dado informações desencontradas à família. Ontem (19), pela primeira vez, o Itamaraty soltou uma nota sobre o caso, em que afirma que “o governo brasileiro tem realizado gestões por sua soltura, desde que expirou sua pena, em setembro de 2013”. Ainda na nota, informa: “Nos últimos dias, foram reiteradas gestões junto às autoridades da Palestina e de Israel, em Brasília e naqueles países, para que o nacional brasileiro seja solto e tenha salvo-conduto concedido, com o objetivo de que seja repatriado ao Brasil. O governo brasileiro lamenta que suas gestões não tenham até momento sensibilizado os governos palestino e israelense. Funcionários do Escritório de Representação do Brasil na Palestina têm realizado visitas regulares para prestar assistência consular ao brasileiro, bem como avaliar seu estado de saúde.”
Israel empurra a responsabilidade para a Autoridade Nacional Palestina (ANP), que, por sua vez, pressiona Islam Hamed para interromper a greve de fome. Enquanto isso, Islam Hamed corre risco de morte, e a família vive a angústia da espera.
Islam Hamed cresceu na Palestina ocupada e aos 17 anos de idade, foi preso por Israel pela primeira vez por atirar pedras em tanques da ocupação. Ficou cinco anos no cárcere. Solto, ficou apenas nove meses em liberdade, até que Israel o prendesse novamente, desta vez alegando “ameaça à segurança”, sem contudo qualquer acusação formal. Ficou na chamada detenção administrativa, em que Israel renova de seis em seis meses a “pena”, sem julgamento ou condenação. Passou três anos nessa situação.
Novamente libertado, Islam Hamed, que se opõe ao governo da Autoridade Nacional Palestina (ANP), voltou à prisão, desta vez da ANP, onde se encontra desde 2010. É mantido em total isolamento, numa sala de interrogatórios convertida em cela, na qual a luz fica acesa 24 horas por dia. Não há nenhuma acusação formal contra ele e há ordem judicial de soltura desde 2013 (o que foi apresentado ao governo brasileiro, com pedido pela família de repatriação). O protesto contra seu cárcere e a inação do governo brasileiro o impeliram a adotar a greve de fome como forma para ser ouvido.
Além da intensa tortura psicológica, Islam Hamed sofreu também tortura física e tem sido hostilizado diante de suas reivindicações. Segundo a ANP, o cárcere de Islam Hamed se justifica para protegê-lo de um novo aprisionamento ou até mesmo de um eventual assassinato por parte do Estado de Israel. O porta-voz do Ministério de Negócios Estrangeiros de Israel, Alon Lavi, no entanto, em entrevista à EBC, devolveu a responsabilidade à ANP, isentando Israel – o qual, contudo, ocupa os territórios palestinos.
A Autoridade Nacional Palestina abriu mão da exigência inicial de que a família assinasse um termo de responsabilidade por sua segurança para libertá-lo – o que seria, nas palavras da mãe de Islam, Nadia Hamed, como assinar “uma sentença de morte”, já que não é possível à família assumir funções de Estado. A ANP apresentou como condições ao governo brasileiro, para sua libertação, a negociação do salvo conduto de Islam Hamed com Israel, além de garantia de acompanhamento diplomático para sua segurança e que uma ambulância esteja à disposição para transportá-lo para fora da Palestina, diante da saúde debilitada pela greve de fome.
No dia 17 de maio, a família enviou um e-mail ao embaixador palestino no Brasil, Ibrahim El Zeben, pedindo sua interferência para que sejam agilizadas as negociações e reclamando dos maus tratos que Islam tem vivido no cárcere.
No Brasil, o apelo da família por repatriação foi reiterado em 15 de abril último – já com Islam Hamed em greve de fome, há quatro dias. A família apresentou nova solicitação formal e deu-se início a uma campanha, que conta com o engajamento de várias entidades representativas da sociedade civil brasileira. A campanha levou, no dia 7 de maio, a demanda ao secretário municipal de Direitos Humanos de São Paulo, Eduardo Mattarazzo Suplicy, que afirmou seu apoio, inclusive assinando manifesto que pede ao governo posição firme nas negociações e agilidade. Suplicy telefonou para o embaixador Sergio Danese, secretário-geral do Ministério das Relações Exteriores, que informou estar ciente do caso.
Em 8 de maio, a campanha pela libertação e repatriação de Islam Hamed realizou um ato em protesto pela demora nas negociações e falta de respostas em frente ao Escritório Regional da Secretaria Geral da Presidência da República em São Paulo e, na sequência, protocolou o manifesto a ser entregue à presidente Dilma Rousseff. Os participantes – incluindo representantes da CSP-Conlutas, CUT, Frente em Defesa do Povo Palestino, Cebrapaz, Ciranda Internacional de Comunicação Compartilhada e PSTU – foram recebidos pela chefe do Gabinete Regional da Presidenta da República, Nilza Fiuza. No dia 15 de maio, durante ato na Avenida Paulista que lembrou os 67 anos da nakba (catástrofe) palestina, mais uma vez foi levantada a reivindicação por intervenção do governo brasileiro para que Islam Hamed possa finalmente ser repatriado e ter uma vida nova ao lado de sua família. Uma petição também circula pedindo intervenção direta da presidenta Dilma por agilidade nas negociações. A família já enviou também mensagem à mandatária do País pelo canal que mantém para que cidadãos brasileiros se comuniquem com ela, no entanto, recebeu apenas resposta padrão. A família tenta desesperadamente obter resposta concreta do governo brasileiro. Se não há qualquer acusação formal, e Islam Hamed tem cidadania brasileira, o governo é responsável também por protegê-lo e deve exigir sua libertação para repatriá-lo.
A campanha prevê novas ações e está envolvendo mais organizações, além de parlamentares brasileiros. Realizará na quinta-feira (dia 21/5) um ato-vigília às 17h30 em frente ao Escritório Regional da Presidência da República em São Paulo.
Enquanto os governos não trazem posição concreta, Islam Hamed morre de fome a cada dia, para que seja feita justiça.
Foto de capa: Revista Fórum