O fascismo parece estar de volta por todo o planeta, atualmente mais dissimulado. Os fascistas não suportam a democracia e, aqui no Brasil, tem destilado e estimulado um ódio social como há muito não se explicitava. A violência, a manipulação da religião, a massificação de “verdades únicas” sem reflexão, a “justiça” pelas próprias mãos, os fundamentalismos oprimindo o ser diferente, as mulheres, a falta de garantias e direitos individuais, o encarceramento em massa de inocentes, os genocídios… tudo isso vem acontecendo cada dia mais em nosso país. E o que é isso senão fascismo?
No Rio a primeira edição do livro se esgotou rapidamente, mostrando como o fascismo está incomodando. Em São Paulo, o lançamento é hoje, 20h, no Espaço da Revista Cult, onde Márcia Tiburi escreve. Em rápida entrevista, a professora, famosa por defender “o diálogo como cerne da filosofia” e fundamental para a vida em sociedade, nos fala sobre o livro, que tem prefácio de Jean Wyllys, jornalista e deputado federal.
– O fascismo é uma coisa atual? Por que falar sobre o fascismo?
Márcia Tiburi – O fascismo é constantemente atualizado, infelizmente. Fascista é o tempo em que o ódio é fomentado pelos poderes (Estado, religião, meios de comunicação, etc) que dele se servem para seus próprios fins. O ódio como qualquer afeto é sempre potencial. No fascismo ele é usado para os fins do sistema. O ódio não é natural, como se quer fazer parecer, o ódio é produzido.
Em nossa época, como nas anteriores, seja na Roma antiga, seja na primeira metade do século 20, na Itália de Mussolini ou na Alemanha de Hitler, o fascismo é a expressão espetacular e caricata do ódio como afeto que nega o outro até o desejo de exterminá-lo. No Brasil o fascismo está presente nos discursos de ódio de políticos, pastores e de cidadãos comuns. Todo preconceito tem o gérmen do fascismo, mas o fascismo é uma espécie de espetáculo, o fascismo é uma exibição desavergonhada do ódio.
– Como reconhecer um fascista? qual a importância de saber falar com um?
MT – No livro eu falei de um tipo de personalidade autoritária, muito comentada por um autor como Theodor Adorno que estudou o fascismo em geral e que deu atenção especial à Alemanha, mas também aos Estados Unidos. Eu falo desse tipo psicossocial que reaparece de tempos em tempos. Há condições para que isso exista e persista.
– Quem você considera exemplo (s) de fascista(s), brasileiro e global?
MT – Sempre podemos citar os grandes líderes fascistas da história. Mas hoje, não temos mais um grande líder fascista. Temos muito mais a presença e a aparição de uma espécie de homem medíocre, porém prepotente que, ao chegar ao poder se torna um tipo de mafioso. Podemos falar de uma espécie de líder banal. O medíocre reprodutor da banalidade do mal que se elege a partir da promessa da ignorância para todos e que, em seu cinismo, parece dar a garantia de que todos os cidadãos que nele votam também poderão ser cínicos à vontade.
– Como desconstruir esse fascismo atual, como derrotar os fascistas?
MT – A minha proposta é que, em primeiro lugar, não nos tornemos um. Para isso podemos praticar o diálogo como resistência. O diálogo é impossível para o fascista, pois ele é um sujeito com uma profunda lacuna de reflexão. Ele não pensa. Ele está fechado para o outro. Ao mesmo tempo, se não tentarmos romper essa barreira, seremos derrubados por ela. Ou derrubamos o muro ou ele cai sobre nós. Dialogar é um gesto tão delicado quanto potente, um gesto que vale o sentido da vida. E nos livra da culpa de não termos feito nada, ao mesmo tempo, nos devolve a nós mesmos, à nossa dúvida, à nossa capacidade de pensar que sempre tem relação com o outro enquanto potência do nosso pensamento. é sempre o outro que nos leva a pensar, na inexistência do outro nos tornamos burros… Voltarmo-nos para o outro é a nossa única saída ética e cognitiva.