Organizações brasileiras obtiveram importante vitória em sua luta para denunciar os crimes de Israel contra o povo palestino. Em mensagem oficial enviada ao governo de Benjamin Netanyahu, a presidenta Dilma Rousseff manifestou a rejeição à nomeação de Dani Dayan para novo embaixador do estado que ocupa a Palestina. Dani Dayan substituiria em outubro próximo o atual embaixador no Brasil, Reda Mansour.
Com mais de 40 adesões de organizações da sociedade civil brasileira, manifesto pleiteando a rejeição do chefe de relações internacionais e ex-presidente do Conselho Yesha, que representa os mais de 500 mil colonos israelenses estabelecidos ilegalmente em terras palestinas, foi protocolado no Escritório Regional da Secretaria Geral da Presidência em São Paulo em 21 de agosto último. No texto, é destacado que as “ações do nomeado são claramente violadoras das leis internacionais e os direitos básicos do povo palestino”. Conhecido como “um dos maiores defensores da política de construção de colônias exclusivamente judaicas em território palestino, em expansão notadamente na Cisjordânia e em Jerusalém Oriental, Palestina ocupada”, como ressalta o documento, seu nome foi indicado pelo primeiro-ministro Benjamin Netanyahu e defendido publicamente pela vice-ministra de Relações Exteriores de Israel, Tzipi Hotoveli, justamente por essa razão. “Dayan é a pessoa correta para representar Israel no Brasil neste momento”, afirmou ela em comunicado divulgado aos meios de comunicação, segundo reportagem no jornal O Estado de S. Paulo, em 21 de setembro. Conforme a matéria, ela ainda acrescentou que “sua trajetória pública e sua ideologia devem ser uma vantagem, e não uma desvantagem, quando vai representar a postura do atual governo, que apoia nosso direito de nos assentar em Judeia e Samaria”.
Esses são os nomes com que os sionistas chamam a Cisjordânia para justificar a colonização em curso, utilizando para tanto representações já desmontadas de que teriam direito ao regresso a esses locais. Ou seja, como propaganda em prol do projeto sionista de constituir a “Grande Israel” – em outras palavras, completar o plano de implantação do Estado judeu em toda a Palestina histórica. O regime institucionalizado de apartheid nos territórios ocupados e a contínua expulsão de palestinos, cujo instrumento mais agressivo são os denominados assentamentos, buscam consolidar esse cenário – e é o que defende o nomeado por Netanyahu.
A história demonstra que independentemente da linha sionista (esquerda ou direita), como afirma o historiador israelense Avi Shlaim em sua publicação A muralha de ferro, tal política tem se mantido. Quando da nakba (catástrofe), como os árabes denominam a criação do Estado de Israel em 15 de maio de 1948, quem estava à frente eram os sionistas trabalhistas, considerados mais moderados. E o que ordenaram foi a execução de plano deliberado de limpeza étnica, como comprovado historicamente. No ensejo, cerca de 800 mil palestinos foram expulsos de suas terras e em torno de 500 de suas aldeias foram destruídas. A sociedade foi inteiramente fragmentada. Como resultado, hoje são aproximadamente 1,5 milhão de palestinos vivendo em campos de refugiados no mundo árabe e milhares na diáspora, à espera do direito legítimo de retorno, além de perto de 4 milhões submetidos a condições desumanas na Cisjordânia e Gaza e 1,5 milhão sob leis racistas nos chamados territórios de 1948 (onde hoje é Israel).
A distinção é se tal política é adotada de forma discreta ou explícita (como vem fazendo o governo atual). Alguns corretamente questionam, portanto, se nesse contexto a rejeição de Dani Dayan seria relevante, já que na prática não há diferenças: sionismo é sionismo. A resposta é afirmativa, já que tal rejeição se converte em instrumento relevante de denúncia à sociedade das políticas israelenses. Ademais, aponta o caminho correto da unidade de ação, necessária à solidariedade internacional ativa. A mobilização e pressão chamaram a atenção sobre as violações cometidas por Dayan e levaram o governo brasileiro a rejeitá-lo – não sem o que parece ser uma “moeda de troca” ou uma tentativa de manter as boas relações, como inclusive a mídia observou: em Conferência Geral da Agência Internacional de Energia Atômica (Aiea) no dia 23 de setembro, o País se absteve em votar pela inspeção das instalações nucleares israelenses, o que seria fundamental. Segundo especialistas, Israel possui entre 100 e 300 ogivas. Diante dos votos contra e abstenções, tais instalações continuarão sem supervisão. Obviamente, como publicado no jornal Jerusalem Post, Netanyahu afirmou ter obtido uma “grande vitória”. Segundo a mesma reportagem, intitulada “IAEA rejects proposal on oversight of Israeli nuclear facilities” (AIEA rejeita proposta de supervisão das instalações nucleares israelenses), o primeiro-ministro disse que conversou antes diretamente com cerca de 30 líderes dos países para convencê-los a não votarem a favor da inspeção.
Portanto, sem ilusões, mas nesse passo, será possível não apenas impedir que – pressionado – o Brasil reveja essa postura de rejeitar a nomeação, mas sobretudo alcançar muitas outras vitórias, em especial na campanha de BDS (boicotes, desinvestimento e sanções) a Israel, quiçá a ruptura de relações entre esse estado e o Brasil. Destaque para a premência de o País sair de sua vergonhosa posição de segundo maior importador de tecnologias militares israelenses – as quais são testadas sobre os verdadeiros laboratórios humanos em que se converteram os palestinos. Os ataques recorrentes em Gaza cumprem essa função.
Confira o manifesto na íntegra:
Pela rejeição de embaixador nomeado por Israel
Nós, cidadãos, organizações e comitês de solidariedade ao povo palestino, abaixo assinados, rejeitamos a nomeação, pelo primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu, do sr. Dani Dayan como o novo embaixador de Israel no Brasil. Os motivos de nossa rejeição baseiam-se nas ações do nomeado, claramente violadoras das leis internacionais e dos direitos mais básicos do povo palestino.
Empresário argentino naturalizado israelense, o sr. Dayan é conhecido como um dos maiores defensores da política de construção de colônias exclusivamente judaicas em território palestino, em expansão notadamente na Cisjordânia e em Jerusalém Oriental, Palestina ocupada.
Essa política sionista de colonização forçada e tudo o que a envolve e a ela se associa, em especial o muro que torna possível o confisco, por parte de Israel, de terras palestinas, foi considerada ilegal em parecer consultivo da Corte Internacional de Justiça (CIJ) em decisão anunciada em 9 de junho de 2004. Na ocasião, 14 membros da CIJ votaram a favor da condenação, e apenas um membro votou contra. Por fim, a Corte lembra aos países-membros da ONU o respeito à obrigação comum de evitar negociações de toda ordem com Israel, em função de seu desrespeito ao direito internacional. A Assembleia Geral da ONU aprovou o parecer da CIJ por ampla maioria — 150 países a favor, incluído o Brasil, e 6 contra –, o que implica, praticamente, um consensus humani generis. Lembramos que os pareceres da CIJ, embora não tenham efeito vinculante nem eficácia direta, criam direito internacional, de acordo com o artigo 38 (d) dos Estatutos da instituição. E a lei, mesmo que violada por Israel, continua sendo lei.
O sr. Dani Dayan, ao residir numa colônia exclusivamente judaica construída ilegalmente em território palestino — Ma´ale Shomron, no norte da Cisjordânia — e ao defender as políticas de construção e expansão dessas colônias, viola claramente o direito internacional, segundo o parecer da CIJ aprovado por maioria de votos (inclusive o do Brasil) na ONU.
Desde muito antes da fundação de Israel, em 1948, as ações dos sionistas têm sido no sentido de apropriar-se de toda a Palestina histórica. Hoje, dada a aplicação dessa política, a Palestina é formada por um território recortado pelo muro, pelas colônias e por rodovias de uso exclusivo de israelenses, aos quais as autoridades de Israel proíbem o acesso dos palestinos.
Em artigo publicado na seção The Opinion Pages do jornal The New York Times em 25 de julho de 2012, cujo título é “Israel’s Settlers Are Here to Stay“, o sr. Dayan fala em “território em disputa”, e não em “ocupação”, justificativa sionista para defender os territórios tomados na Guerra dos Seis Dias, em junho de 1967. Segundo ele, Israel tem o direito “inexpugnável” de chamar de “pátria” a Cisjordânia, que o sr. Dayan trata pelos nomes bíblicos de “Judeia e Samaria”, numa clara alusão ao não reconhecimento da soberania palestina.
Em outras palavras, para o sr. Dayan a situação atual deve ser mantida e aprofundada – ou seja, o apartheid institucionalizado, a limpeza étnica, a expulsão sistemática de palestinos de suas casas e a demolição de grande número delas, a negação dos direitos humanos fundamentais a essa população — incluindo o retorno a suas terras, de onde vem sendo expulsa desde antes de 1948, ano da criação do Estado de Israel, que os palestinos chamam de nakba (catástrofe).
Em outras palavras, o sr. Dayan defende abertamente o projeto sionista de um estado judeu homogêneo, sem palestinos, em toda a Palestina histórica.
Ele dedicou quase oito anos de sua vida servindo as forças de ocupação israelenses e presidiu, de 2007 e 2013, o Conselho Yesha, que representa os mais de 500 mil colonos israelenses estabelecidos ilegalmente em terras palestinas. Hoje, ocupa o posto de chefe de relações internacionais desse conselho.
Os colonos são atualmente a face mais agressiva da ocupação sionista, responsáveis por uma incessante perseguição aos palestinos (incluindo crianças); pela ameaça que representam ao invadir sítios palestinos carregando submetralhadoras e metralhadoras; pela expulsão de palestinos e confisco de suas casas; pela destruição de plantações, principalmente de oliveiras, base da economia palestina; calcula-se que, desde 1967, mais de 800 mil oliveiras tenham sido destruídas por colonos e autoridades israelenses.
Uma amostra aterradora do terror a que são submetidos os palestinos cotidianamente nas mãos dos colonos foi o assassinato, em 31 de julho último, do bebê Ali Dawabsha, de apenas 18 meses, queimado vivo pela ação de um colono na aldeia de Duma, em Nablus, Cisjordânia. É esse tipo de gente — considerada terrorista, oficialmente, até pelos Estados Unidos — que o sr. Dayan defende.
O primeiro-ministro Benjamin Netanyahu anunciou que a nomeação do sr. Dani Dayan vai ao encontro de sua política de expansão da presença israelense na América Latina e nas relações Brasil-Israel. Segundo a mídia, o novo embaixador deve assumir o posto em outubro próximo.
Preocupa-nos sobremaneira o fato de que um criminoso venha a ser embaixador de Israel no Brasil. Não queremos que isso aconteça em nosso país. Assim, reiteramos nossa condenação a essa nomeação, e aproveitamos a oportunidade para reiterar nossa reivindicação de ruptura de relações com Israel, atendendo ao apelo da sociedade civil palestina por boicote, desinvestimento e sanções (BDS) a Israel.
Assinam:
Frente em Defesa do Povo Palestino/BDS Brasil
Comitê Catarinense de Solidariedade ao Povo Palestino
Comitê da Palestina Democrática – Brasil
Comitê de Solidariedade à Luta do Povo Palestino do Rio de Janeiro
Comitê de Solidariedade ao Povo Palestino do Abcdmrr/SP
Comitê de Solidariedade ao Povo Palestino do Ceará
Comitê de Solidariedade à Palestina- Bahia
Comitê Brasileiro em Defesa dos Direitos do Povo Palestino
Anel – Assembleia Nacional dos Estudantes Livre!
Apropuc – Associação dos Professores da PUC-SP
Assisp – Associação Islâmica de São Paulo
Campanha Free Ahmad Sa’adat Brasil
CCAB – Centro Cultural Árabe-Brasileiro
Ciranda Internacional de Comunicação Compartilhada
Comitê Pró-Haiti
CSP-Conlutas – Central Sindical e Popular
CUT – Central Única dos Trabalhadores
Esquerda Marxista
Fepal – Federação Árabe Palestina do Brasil
Juntos!
LS – Luta Socialista
Marcha Mundial das Mulheres
Movimento de Mulheres Olga Benário
MLC – Movimento Luta de Classes
MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
Movimento Mulheres em Luta
Movimento Mulheres pela P@z!
Núcleo de Estudos Gamal Abdel Nasser- Centro Universitário Fundação Santo André/SP
Organização Indígena Revolucionária
PSOL – Partido Socialismo e Liberdade
PSTU- Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado
Soweto Organização Negra
Tribunal Popular
UJR – União da Juventude Rebelião
UP – União Popular pelo Socialismo
Unidos pra Lutar