Imagem: arte de rua de Galo, Recife
Difícil, mas indispensável. Moema Miranda, diretora do Ibase, vê assim a tarefa assumida por movimentos e organizações sociais de realizar um II Fórum Social Brasileiro em um momento crítico para sociedade civil, que também acabou se fragmentando com a crise política. Mas ela acentua que a “experiência” que o II FSB quer avaliar é histórica e não se reduz à crise do governo.
Leia a Entrevista em Rede da Ciranda no II FSB, concedida por Moema Miranda, do Ibase, a Nataly Queiroz, do Fórum de Mulheres de Pernambuco:
Qual o sentido político do Fórum Social Brasileiro?
Eu acho que o sentido político mais relevante, o mais profundo, é a sociedade civil se recolocar a tarefa política e essencial de pensar o Brasil num momento de crise. E de se dispor a fazer isso com essa nova cultura política que o Fórum Social Mundial instala, que é em uma cultura de diálogo e de abertura à diferença.
Um dos problemas maiores que a crise política no Brasil instaurou foi, pra dentro da sociedade civil mesmo, uma fragmentação de tal ordem em que a gente, no último ano, acabou se polarizando em pontos extremos em que não se conseguia efetivamente aprofundar o debate. Era a favor ou contra, sim ou não, gosto ou não gosto.
A sociedade civil deve assumir a responsabilidade política de se pensar, porque ela também foi fragmentada e fracionada nessa crise, e assumir a responsabilidade política de pensar o processo histórico que a gente está vivendo e abrir um diálogo com perspectiva internacional.
Não só é o II Fórum Social Brasileiro, mas é um fórum temático sobre política, sobre a crise do Brasil e sobre perspectivas de alternativas. Tem uma relevância política grande e é um contribuição que a sociedade civil do Brasil pode dar para pensar outros espaços, porque é claro que o que aconteceu não é exclusivo do Brasil
Que impacto o Fórum Social Brasileiro pode ter nessa conjuntura de crise, que você bem citou?
O que a gente espera é que o impacto seja o de maior aglutinação e articulação das forças progressistas. Das forças que lutam por democracia radical e contra o neoliberalismo. Essas forças que durante muito tempo atuaram, respeitando sua diversidade e diferenças, de forma mais ou menos articulada, e que agora se fragmentaram.
A gente espera que o impacto no processo eleitoral ajude a sociedade civil a se politizar de uma maneira mais densa e mais qualificada. E que assim fazendo, essas forças levem para a agenda pública e para a discussão pública um debate muito mais qualificado do que simplesmente o nível raso que a gente está indo com essa devastação de denúncias. Claro que não ne trata de desconhecer as denúncias. Mas saber quais são as consequências políticas e o aprendizado político, que nós como povo brasileiro, fazemos, que lições tiramos, como damos a volta por cima e qual o passo seguinte.
Existem algumas interpretações já acerca do temário central do Fórum Social Brasileiro. Mas de que experiência a gente está falando?
Eu acho que a gente de fato tem que falar da experiência histórica. É muito redicionista falar simplesmente do governo Lula. Desde o início, quando começamos a pensar o Fórum, entendemos que este não é um fórum para debater o governo Lula, ser a favor ou contra, criticar ou aplaudir. É claro que a gente não pode desconhecer isso que foi um fato e uma crise. Mas isso não se gerou por si mesmo.
A história de redemocratização do Brasil não tem três anos. Tem um longo processo de redemocratização, que mobilizou a sociedade civil em momentos chave, que conseguiu ampla participação popular, que conseguiu uma articulação forte entre os movimentos sociais e o conjunto da população em todo Brasil. Então, o que foi que deu errado? Onde a gente errou? O que gente tem que aprender?
Não se trata só do governo, mas da relação da gente com a gente mesmo. O que aconteceu na sociedade civil nesse período, nesse longo período histórico, em que a gente vem avançando e construindo um país com mais justiça e mais igualdade. O que está emperrando? Que erros que a gente vem cometendo? Acho que essa experiência histórica, deste momento, é que deve ser o tema da nossa reflexão comum.
Qual a agenda do Ibase, para o FSB?
Uma agenda particular do Ibase: estamos discutindo a integração regional e o papel do Brasil. E também estamos discutindo fortememente o papel do BNDS na perscpectiva de que hoje. Qualificar o desenvolvimento é uma coisa crucial. Discutir democracia sempre foi o nosso foco, mas a gente acha hoje que democracia e desenvolvimento tem que estar mais articulados. De modo geral, ainda se pensa em desenvolvimento como crescimento, o que é muito limitado. Um desenvolvimento que seja simplesmente a inclusão de todo mundo no mercado é abhsolutamente limitado. Mais quais são as outras propostas, qual a alternativa, a nossa outra utopia? Do que a gente está falando quando fala em um desenvolvimento que seja efetivamente democrático?
Como é que desenvolvimento, democracia e justiça se articulam? Como é que o conjunto dos direitos é garantido no desenvolvimento? Se ele é limitado a crescimento econômico, isso não necessariamente significa distribuição de renda nem maior inclusão. Mas qual é a proposta alternativa a isso? Os modelos que eram não capitalistas também falharam. Então, o que é um modelo de desenvolvimento anti-capitalista e que incorpore a maioria da população? Do que a gente esta falando?
Este é o nosso tema central no próximo período. A gente vai desenvolvendo isso com diferentes atividades, uma mais focada na integração regional, outra no BNDS, e algumas ligadas ao debate do racismo e à campanha de Ação Global contra a Pobreza (GCAP).