O dever de universalizar a educação

Foto: Uelves Sombra

Em uma das atividades mais concorridas do Fórum Mundial de Educação do Alto Tietê, mais de mil pessoas acompanharam no sábado conferência que acabou virando intenso debate sobre o atual momento e os rumos da educação brasileira.

Políticas Públicas em Educação: efetivando e concretizando direitos teve a participação de Vital Didonet, da organização Fundeb pra Valer, da professora Maria do Pilar Lacerda, secretária de Educação Básica do Ministério da Educação e ex-secretaria Municipal de Educação de Belo Horizonte, Ramón Moncada, da Rede Cidade Educadora, da Colômbia, e Valério Arcary, do Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp).

Os especialistas resgataram aspectos que marcaram a educação brasileira no passado para traçar um quadro atual do setor, apontando falhas e avanços na construção de uma política pública consistente. Apesar das opiniões muitas vezes divergentes, a busca qualitativa da universalização no ensino público no País, da creche à preparação para a entrada na universidade, foi o pano de fundo de todos os argumentos do debate. Como não deixar nenhuma criança brasileira fora da escola? Como garantir um ensino público gratuito de qualidade que prepare o indivíduo para sua participação na sociedade? Para responder a essas perguntas, não faltaram argumentos: financiamento, mobilização popular, planos pedagógicos por escola, melhores salários, menos aluno por sala de aula, etc.

Vital Didonet destacou que a implementação do Fundo Nacional de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb), que começou a valer em janeiro e deve destinar mais de R$ 2 bilhões para a educação este ano, é uma ação estrutural importante rumo ao melhoramento das políticas públicas educacionais do Brasil. Didonet lembrou que o Fundeb é uma reivindicação antiga dos movimentos populares e de vários outros setores da sociedade. “Toda a educação básica está contemplada no fundo. As creches, as primeiras séries e o fim do ciclo escolar contarão com mais comprometimento e recursos do Estado. O professor sairá valorizado, pois está estipulada a criação de um piso salarial nacional para a categoria e haverá preocupação constante com a formação”, exemplifica Didonet.

A secretária Nacional de Educação Básica do MEC, Maria do Pilar Lacerda, convocou os professores a assumir o papel de protagonista, junto com as comunidades, para transformar a educação brasileira a partir de ações locais, em cada escola. “Não podemos ter como modelo a educação de 30 anos atrás, quando a escola pública apresentava um bom nível de qualidade, mas era excludente, com apenas 40% dos brasileiros na sala de aula. Nossa realidade agora é lutar para ter 100% de ocupação, e com qualidade, mas isso só vai ser conquistado se formos protagonistas dos nossos projetos”, diz Lacerda. Segundo a educadora, um exemplo é a escola Meio Norte, localizada numa favela de Teresina, capital do Piauí, numa das regiões mais pobres do Brasil.

A escola pública, com turmas do ensino fundamental e médio, é uma das poucas no País com índice zero de evasão e registra aproveitamento superior às escolas da rede pública de Belo Horizonte. “Identificamos três ações que garantiram esse diferencial: acolhimento do aluno, com incentivos e elogios; projeto pedagógico próprio e discutido entre os professores a cada ano letivo; e, por fim, uma relação profunda com a comunidade – se uma criança falta por dois dias, os professores vão bater na porta do aluno para saber o que está acontecendo.”

Para esquentar a discussão, o professor Valério Arcary, da Apeoesp, disse que professor e aluno de escolas públicas estão desmoralizados e desmotivados para assumir o protagonismo necessário para mudar o rumo da atual política pública educacional no País. “A educação brasileira está em crise terminal, por conta das nossas escolhas econômicas, que privilegiaram o modelo educacional privado em detrimento da escola pública e do trabalhador. Dos 75 mil professores da rede estadual de São Paulo, 30% não têm 13º salário nem direito a férias e um piso salarial de R$ 750. Pedir para esses trabalhadores assumirem algum tipo de protagonismo nessas condições é isentar o Estado de suas responsabilidades”, criticou Arcary, defendendo condições de trabalho mais dignas aos professores brasileiros.

O coordenador da Rede Cidade Educadora, o colombiano Ramón Moncada, disse que os governos da América Latina precisam rever seus métodos de construção de políticas públicas em educação. Ele disse que o Banco Mundial implementa políticas mundo afora, mas trata-se de um instituição privada e com claros interesses. “Nossa classe política precisa entender que educação e cultura são responsabilidades do ‘público’, do Estado, da sociedade, de gente como nós, que constrói um fórum como esse, e não de instituições privadas”, declarou Moncada. Segundo ele, as políticas mais eficazes devem ser pensadas no longo prazo e não dentro da mentalidade de um mandato eleitoral, e também devem ter transparência e ser democráticas. “Nem tudo que é governo é público, logo nem tudo que é público é democrático. Isso precisa ser revisto, pois participação popular e envolvimento de movimentos e comunidades organizados legitimam uma ação cidadã. E a educação nada mais é do que um instrumento de cidadania”, concluiu Moncada.

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