Violência policial, a tragédia anunciada

Foto: João Bacelar, no site Pontos de Vista

Vi mais de cinco vídeos sobre o que aconteceu na praça da Sé, madrugada de 6 de maio, durante show do grupo Racionais MC’s, na programação do evento Virada Cultural, organizado pela Prefeitura de São Paulo. Ouvi depoimentos pessoais de pelo menos dez alunos meus, dois de meus filhos e de alguns amigos que estiveram lá na praça da Sé. Cheguei a uma conclusão aparentemente óbvia: a Polícia Militar não soube exercer a sua função de garantir a segurança da população, deu contribuição decisiva para criar o conflito e depois agiu com extrema truculência e covardia para reprimir pequenos grupos enfurecidos e revoltados.

As cenas mostram e os depoimentos confirmam que: 1) A grande maioria das pessoas que lotavam a praça estava tentando acompanhar o show, conforme foi o espírito dominante em toda a Virada Cultural; 2) Alguns grupelhos isolados tentaram subir numa banca de jornais e na sacada de um prédio abandonado para melhor ver o show, os policiais interviram de forma atabalhoada jogando a viatura sobre a multidão e provocando corre-corre; 3) Somente depois de várias incursões espalhafatosas da polícia, grupos maiores de jovens reagiram atirando pedras e garrafas na direção dos policiais; 4) Em vez de ter isolado a banca e a sacada desde o começo do show, de ter anulado a ação inicial do primeiro grupo de jovens e de ter se afastado no momento das pedras e garrafas, para evitar o acirramento do conflito, a polícia agiu no sentido contrário, invadiu a praça com a tropa de choque lançando bombas e atirando com balas de borracha, contra todos – umas trinta mil pessoas; 5) O líder dos Racionais, Mano Brown, o tempo todo tentou conter a confusão, pediu insistentemente do alto do palco que a multidão se afastasse dos policiais e que os policiais parassem de investir sobre a multidão; 6) A Polícia Militar acabou com o show, dispersou a multidão e ocupou a praça da Sé, e, vários grupos de jovens, expulsos da Sé pela polícia, correram pelas ruas do centro depredando e saqueando o que viram pela frente, o que gerou mais repressão e mais violência.

Poderia ter acontecido uma tragédia muito maior, não apenas com muitos feridos (como aconteceu), mas com muitos mortos. As cenas de vídeo mostram policiais enlouquecidos com espingardas nas mãos e atirando na direção da multidão, na altura do peito e das cabeças das pessoas. Por que a Polícia Militar teria decidido ocupar a praça no momento do show? Qual o objetivo estratégico dessa operação?

A ação da Polícia Militar na praça da Sé repete um padrão cada vez mais freqüente na cidade de São Paulo e no ABC paulista. A polícia do Estado de São Paulo está sendo treinada e orientada para reprimir o povo, para bater nas pessoas, para usar a força e a violência contra os cidadãos que vivem em São Paulo.

No Encontro Regional da Juventude Negra, realizado em São Bernardo do Campo, dias 5 e 6 de maio, os participantes lançaram um manifesto de repúdio à violência policial. Movimentos sociais também têm denunciado com freqüência o clima de terror criado pela Policia Militar. É hora da cidadania reagir e cobrar do governador José Serra o fim da violência policial no Estado. O governo federal não pode ficar omisso diante dessa tragédia anunciada. Cadê o Ministério da Justiça? Antes que ocorra um banho de sangue!

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Hamilton Octavio de Souza,

Diretor da Apropuc.

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