Estamos bem por um triz/Pro dia nascer feliz/Pro dia nascer feliz/O mundo inteiro acordar…
Pois é meu povo. Hoje começa a segunda metade do ano que sacudiu a nossa existência. Ao fotografar e admirar a alvorada no cerrado lembrei-me da música Pro dia nascer feliz, de Cazuza e Frejat.
Não estou sublimando nem me alienando diante das vítimas da covid 19, do sofrimento das famílias e das pessoas que acordam sem saber se vão ganhar o suficiente para comer durante o dia.
Não coloquei sob o tapete da consciência as estatísticas de milhões de desempregados e desalentados no mercado de trabalho, assim como da falência de centenas de micro, pequenas e médias empresas no Brasil.
Estou ciente do mal que a política econômica neoliberal do governo abutre faz à população brasileira, especialmente aos mais vulneráveis – negros, índios, quilombolas, mulheres, idosos, jovens da periferia e LGBTQ+.
Tenho nojo deste governo e do brontossauro fascista que não demonstra emoção, empatia e solidariedade em relação aos mais de 60 mil mortos. Para o governo do jardineiro da morte são números. Para nós, os óbitos expressam os rostos e nomes de pessoas amadas.
Sinto medo e raiva. Medo de ser contaminado pelo coronavirus, ir para a UTI e não sobreviver. Tenho raiva da estupidez do governo que muita gente votou somente porque estava possuído de ódio pelo petê.
O ódio é a energia do mal. Deixando-se dominar pelo ódio os adoradores do pandemito escolheram o pior para si e para todos. No meio da pandemia e do pandemônio alguns demonstram arrependimento. Antes tarde do que nunca! Não os respeito, mas não nutro ódio.
O medo e a raiva não me paralisam. O medo apenas me alerta para tomar todos os cuidados necessários e suficientes para não ser contaminado, nem me entregar à prostração, a anomia ou à depressão. De depressão basta a da economia brasileira que mata de fome, desemprego e desalento.
O medo me ensina a ser mais forte e determinado para fazer do confinamento uma experiência mais profunda, mais verdadeira, mais amorosa, mais solidária, mais humana e mais criativa. Não é fácil viver só e manter o otimismo realista em mais de 100 dias, sem a perspectiva de quanto tempo ainda terei de manter o isolamento social, por decisão pessoal. Estou doido pra me picar pra Salvador!
A raiva é pedagógica. Mostra o caminho da resistência e da luta. Estar em casa de quarentena não significa estar “morto em vida Severina”. Significa ser um “guerreiro cabra da peste”, que acolhe e mobiliza a si e aos outros para enfrentar a exploração, a opressão, a violência – simbólica e real – e o fascismo.
Pra ser feliz a qualquer hora e qualquer dia é preciso ser o sol de si mesmo. Renascer diariamente para sonhar, resistir e lutar contra a política econômica da desesperança e pela democracia.
Imagem: Adroaldo Quintela
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