Por que marchamos?

A foto é da Marcha das Vadias de Brasília

No Rio de Janeiro, marchamos porque apenas nos primeiros três meses desse
ano foram 1.246 casos registrados de mulheres e meninas estupradas, uma
média de quatorze mulheres e meninas estupradas por dia, e sabemos que
ainda há várias mulheres e meninas abusadas cujos casos desconhecemos;
marchamos porque muitas de nós dependemos do precário sistema de
transporte público do Rio de Janeiro, que nos obriga a andar longas
distâncias sem qualquer segurança ou iluminação para proteger as várias
mulheres e meninas que são violentadas ao longo desses caminhos;
marchamos porque foi preciso a criação de vagões femininos no trem e no
metrô para que não fossemos sexualmente assediadas durante o uso desses
transportes.

No
Brasil, marchamos porque aproximadamente 15 mil mulheres são estupradas
por ano, e mesmo assim nossa sociedade acha graça quando um humorista
faz piada sobre estupro, chegando ao cúmulo de dizer que homens que
estupram mulheres feias não merecem cadeia, mas um abraço; marchamos
porque nos colocam rebolativas e caladas como mero pano de fundo em
programas de TV nas tardes de domingo e utilizam nossa imagem semi-nua
para vender cerveja, vendendo a nós mesmas como mero objeto de prazer e
consumo dos homens; marchamos porque vivemos em uma cultura patriarcal
que aciona diversos dispositivos para reprimir a sexualidade da mulher,
nos dividindo em “santas” e “putas”, e muitas mulheres que denunciam
estupro são acusadas de terem procurado a violência pela forma como se
comportam ou pela forma como estavam vestidas; marchamos porque a mesma
sociedade que explora a publicização de nossos corpos voltada ao prazer
masculino se escandaliza quando mostramos o seio em público para
amamentar nossas filhas e filhos; marchamos porque durante séculos as
mulheres negras escravizadas foram estupradas pelos senhores, porque
hoje empregadas domésticas são estupradas pelos patrões e porque todas
as mulheres, de todas as idades e classes sociais, sofreram ou sofrerão
algum tipo de violência ao longo da vida, seja simbólica, psicológica,
física ou sexual.

No
mundo, marchamos porque desde muito novas somos ensinadas a sentir
culpa e vergonha pela expressão de nossa sexualidade e a temer que
homens invadam nossos corpos sem o nosso consentimento; marchamos porque
muitas de nós somos responsabilizadas pela possibilidade de sermos
estupradas, quando são os homens que deveriam ser ensinados a não
estuprar; marchamos porque mulheres lésbicas de vários países sofrem o
chamado “estupro corretivo” por parte de homens que se acham no direito
de puni-las para corrigir o que consideram um desvio sexual; marchamos
porque ontem um pai abusou sexualmente de uma filha, porque hoje um
marido violentou a esposa e, nesse momento, várias mulheres e meninas
estão tendo seus corpos invadidos por homens aos quais elas não deram
permissão para fazê-lo, e todas choramos porque sentimos que não podemos
fazer nada por nossas irmãs agredidas e mortas diariamente. Mas
podemos.


fomos chamadas de vadias porque usamos roupas curtas, já fomos chamadas
de vadias porque transamos antes do casamento, já fomos chamadas de
vadias por simplesmente dizer “não” a um homem, já fomos chamadas de
vadias porque levantamos o tom de voz em uma discussão, já fomos
chamadas de vadias porque andamos sozinhas à noite e fomos estupradas,
já fomos chamadas de vadias porque ficamos bêbadas e sofremos estupro
enquanto estávamos inconscientes, por um ou vários homens ao mesmo
tempo, já fomos chamadas de vadias quando torturadas e curradas durante a
Ditadura Militar. Já fomos e somos diariamente chamadas de vadias
apenas porque somos MULHERES.

Mas,
hoje, marchamos para dizer que não aceitaremos palavras e ações
utilizadas para nos agredir enquanto mulheres. Se, na nossa sociedade
machista, algumas são consideradas vadias, TODAS NÓS SOMOS VADIAS. E
somos todas santas, e somos todas fortes, e somos todas livres! Somos
livres de rótulos, de estereótipos e de qualquer tentativa de opressão masculina à nossa vida,
à nossa sexualidade e aos nossos corpos.
Estar no comando de nossa vida sexual não significa que estamos nos abrindo
para uma expectativa de violência, e por isso somos solidárias a todas
as mulheres estupradas em qualquer circunstância, porque tiveram seus
corpos invadidos, porque foram agredidas e humilhadas, tiveram sua
dignidade destroçada e muitas vezes foram culpadas por isso. O direito a
uma vida livre de violência é um dos direitos mais básicos de toda
mulher, e é pela garantia desse direito fundamental que marchamos hoje e
marcharemos até que todas sejamos livres.

Somos todas as mulheres do mundo! Mães, filhas,
avós, putas, santas, vadias…todas merecemos respeito!

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *