Os royalties do pré-sal e o faz-de-conta federativo

Os royalties do pré-sal e o faz-de-conta federativo

18 de março de 2010, da Vila Setembrina localizada na Província do Eucalipto entreguista, Bruno Lima Rocha

A emenda ao projeto lei que altera a partilha dos royalties do pré-sal e do petróleo já explorado, de autoria dos deputados Ibsen Pinheiro (PMDB-RS) e Humberto Souto (PPS-MG), vem colocando uma parcela dos políticos do Brasil em pé de guerra. Em essência, o texto que ainda precisa passar pelo “mui nobre, leal e valoroso” Senado da República, aponta para a execução de uma política distributiva dos recursos que escapam do gargalo da União. Apesar de apoiada por 369 votos, 76 contrários e duas abstenções, o texto evoca disputas pelo espólio do Estado. O que está em jogo, 60% dos royalties e a metade da participação especial, não é uma bagatela, e pode implicar na retomada da capacidade de investimento de estados e municípios.
Como era de se supor, a reação ocorreu da parte dos “estados produtores” de petróleo. No pugilato simbólico, entra desde a mobilização oficial do funcionalismo público em pleno dia de semana, até as relações de proximidade e assimetria junto ao Planalto. A coisa é séria para quem perde e nem o Cristo Redentor escapou. Especificamente, o governador do Rio, Sérgio Cabral Filho, evoca sua condição de aliado de Lula para antecipar um veto presidencial ainda não dado, embora previsível. O debate decorrente das proposições de partilha dos royalties do pré-sal traz à tona algumas concepções cujo debate de fundo fica escamoteado. Independente do modelo de partilha, o que se nota é a distância entre o discurso de federação e seu suporte necessário. Sem a divisão de bens e recursos os poderes estaduais e municipais não têm como dar a mínima vazão às pressões sociais aos quais são constante e legitimamente submetidos.

Do ponto de vista semântico, o Brasil é uma república federativa. Já se analisarmos a distribuição do botim impositivo, verificamos que se dá o oposto, canalizando para o governo central mais de 60% dos recursos advindos da taxação em cascata incidindo de forma absurda sobre o consumo individual e o salário. Diante da escassez de recursos para os outros dois níveis de governo, qualquer perda de caixa resulta em previsível desespero. Este modelo de funcionamento, o da centralização de divisas na União e o repasse através de regras centralistas, ajuda no fortalecimento da intermediação profissional. É o baixo clero que se especializa na barganha de emendas orçamentárias e extras, disputando para seus redutos, os custos transacionais para formar e manter a maioria no Congresso.

Não me iludo com a motivação da maioria dos votantes na emenda de Ibsen. É certo supor que o apoio dado ao texto do ex-cartola do Internacional S.C. tem a típica motivação da cultura política paroquiana e de limitado horizonte. Mas, por outro, estando os caixas dos governos mais abastecidos, fica menos difícil exercitar a prática cidadã de arrancar direitos constitucionais quase nunca cumpridos, tais como os repasses obrigatórios para saúde e educação. Apenas pelo fator de poder motivar o aumento da organização social em escala local e estadual, é positivo o possível resultado da emenda de Ibsen Pinheiro. Infelizmente, como de hábito, o debate anda longe desse ponto de vista e a derrota parcial ou na íntegra é muito provável.

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