Os EUA e o país dos Tonton Macoutes
21 de janeiro de 2010, de São Sebastião do Rio de Janeiro, Bruno Lima Rocha
Na terça, dia 12 de janeiro, o mundo constatou que aqueles que nada têm podem ter menos ainda. O terremoto no Haiti devastou o pouco de reconstrução que foi feito sob ocupação da ONU e cujo comando ate então pertencia a potência regional com pretensões globais chamada Brasil. No momento o país tenta sobreviver entre a corrida pelo aumento da ajuda humanitária, a disputa pela retomada da hegemonia absoluta na região pelos EUA e a pouca capacidade de institucionalizar qualquer coisa lá que não seja a extrema pobreza, a corrupção e a violência entre os pobres.
É preciso reconhecer que a tragédia do abalo sísmico só piorou o que já era péssimo. Outros tremores de terra atingiram nações do Continente, como em El Salvador e no México, e nem por isso a sociedade se esfacelou, muito pelo contrário. A desintegração social do país mais pobre das Américas também é fruto também de um comportamento de elite predatória diretamente influenciada pelos EUA.
É impossível compreender minimamente o que hoje se passa no Haiti sem dar-nos conta da repressão violenta e a ação imperial de que a parte francófona da Ilha de Hispaniola sofrera. Trata-se do mesmo povo que orgulhosamente conquistara a sua independência em 1804, antes de Brasil, Argentina e México. As glórias de seu nascimento não se reeditaram no século XX, quando os haitianos sobreviveram sob uma mescla de ocupação militar dos EUA e ditadura com ares imperiais.
A “dinastia” dos Duvalier, iniciada com François (1957-1971, o Papa Doc) e seu filho François (1971-1986, Baby Doc), precedida da ocupação militar dos EUA de 1915 a 1934, deixara profundas raízes de violência entre a população. A ditadura que fora derrubada por um levante popular em 1986, tinha como base o terror que os Tonton Macoutés, a milícia pró-regime Duvalier, causava na sociedade. A democracia lá vivera poucos meses, pois estes mesmos membros da conhecida Milícia Voluntária em Defesa da Segurança Nacional, se negavam a ser julgados por crimes de lesa-humanidade pelo governo do então eleito ex-padre católico Jean Bertrand Aristide. A nova tragédia haitiana lá começava quando após poucos meses de exercício do poder, um golpe liderado pelo Exército derruba o ex-cura e reabre as portas para intervenções estadunidenses ou patrocinadas pela ONU.
Em 1994 Aristide retorna ao país pela força das tropas de ocupação e a “ajuda” é acompanhada de recomendações para privatizar as poucas empresas estatais. Em 2000 e 2004 o braço dos EUA somado aos interesses da oligarquia local e os para-militares desestabilizam todas as tentativas de governo soberano. Definitivamente, “ajudar” a reconstruir o país não é vender o que resta ou arrumar contratos para empresas amigas de governos de turno.
Distintas fontes acadêmicas sérias apontam que a reconstrução do Haiti implica na necessidade urgente de subsídio e promoção da agricultura familiar, base da produção primária do país. Em 1970, esta nação produzia 90% do alimento consumido. Atualmente 55% da comida é importada. Qualquer reestruturação séria e de longo prazo começa pela soberania alimentar. Só falta combinar com o Departamento de Estado dos Estados Unidos.
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