Ontem (17/03) a Agência Brasil divulgou, e a grande mídia repercutiu, a notícia de que o Governo decidiu alterar diversos pontos do Terceiro Plano Nacional de Direitos Humanos, assinado por ministros/as e pelo presidente Lula, em dezembro de 2009. É sabido que tais alterações significam ceder a pressões de setores posicionados na alta hierarquia da estrutura de poder vigente: ruralistas, grandes empresas da área de Comunicações e episcopado.
A reportagem inclui a seguinte afirmação:
“Para tratar da alteração do programa, Paulo Vannuchi se reuniu com os ministros da Saúde, José Gomes Temporão e do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel; com o ouvidor agrário nacional, Gercino José da Silva Filho, com a secretária especial de Políticas para as Mulheres, Nilcéia Freire; com a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e com 11 organizações do movimento feminista”.
É verdade que o ministro Vannuchi recebeu em audiência, no dia 24 de fevereiro, representantes de 14 – e não 11 – organizações. Mas o grupo estava composto, para além de feministas, de organizações dos movimentos de mulheres, ONGs com trabalho no campo dos direitos reprodutivos e lideranças do movimento pelos direitos humanos.
É verdade que, nesta audiência, o Ministro insistiu que os movimentos que defendem a legalização do aborto participassem do esforço conciliatório de revisão do texto em questão.Mas não é verdade que as modificações no texto do III PNDH, agora anunciadas, sejam resultado de qualquer negociação com estas organizações, como sugere o texto da referida matéria.
Não houve acordo com relação a qualquer modificação, e muito menos com relação a abrir mão do texto que justifica com a autonomia das mulheres sobre o próprio corpo, na recomendação pela revisão da lei que pune o aborto.
A proposta do Ministro Vannuchi foi recusada formalmente, em carta eletrônica a ele enviada em 15 de março, com cópia para sua assessoria direta. A carta está assinada por 66 organizações (ver lista abaixo) e afirma:
“Esperamos assim, que seja mantido o texto do III PNDH em sua integralidade e nos dispomos a um novo encontro com o Ministro, caso necessário”.
Esta posição se justifica pelos seguintes pontos:
O texto do III PNDH relativo ao abortamento foi saudado como expressão da vontade política das mulheres organizadas, e reflete o posicionamento e ansiedades da sociedade civil organizada.
O III PNDH não é um documento isolado construído pela SEDH; quaisquer alterações em seu texto devem ser discutidas coletivamente com os movimentos de direitos humanos e os setores do governo que participaram de sua construção e redação, sob pena de ser ilegítima e antidemocrática.
O compromisso com a autonomia e a liberdade sexual e reprodutiva das mulheres é fator fundamental para a construção da democracia, que tem nos espaços das conferências um canal de participação da sociedade civil, inclusive de representações da Igreja Católica; não é democrático que o Governo recepcione e atenda às demandas de um segmento que corre por fora deste processo. Aliás, isso significa deslegitimar os instrumentos democráticos instituídos em seu próprio governo, como as conferências de políticas públicas que reúnem milhares de representantes da população brasileira organizada.
A carta enviada ao ministro, em 15 de março, termina com a seguinte frase:
?… o Brasil foi vanguarda durante a construção das Plataformas de Cairo e de Beijing. Por isso, espera-se que durante o ano de BEIJING +15 possamos alcançar patamares mais expressivos nos marcos normativos que sinalizam os rumos que o país deverá tomar num futuro próximo, e que posicionem o Brasil como liderança no respeito aos direitos humanos das mulheres. É exatamente o que a comunidade internacional e o movimento de mulheres esperam de nosso país neste momento?.
Jornadas pelo Direito ao Aborto Legal e Seguro
18 de março de 2010
Assinam esta NOTA e a carta enviada ao ministro Vannuchi em 15 de
março de 2010:
Jornadas Brasileiras pelo Direito ao Aborto Legal e
Seguro/ Fórum de Entidades Nacionais de Direitos Humanos/ Movimento
Nacional dos Direitos Humanos/ Associação Brasileira de ONGS/
Articulação de Mulheres Brasileiras/ Articulação de Organizações de
Mulheres Negras Brasileiras/ Católicas pelo Direito de Decidir-Brasil/
Centro Latino-americano de Sexualidade e Direitos Humanos/ Comitê
Latino-americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da
Mulher?Brasil/ Fórum de Mulheres do Mercosul/ Liga Brasileira de
Lésbicas/ Movimento Articulado de Mulheres da Amazônia/ Movimento de
Adolescentes do Brasil/ Rede de Homens pela Equidade de Gênero/ Rede
de Mulheres no Rádio/ Rede Jovens Brasil Direitos Sexuais e Direitos
Reprodutivos/ Rede Nacional Feminista de Saúde Direitos Sexuais e
Direitos Reprodutivos/ Relatoria de Saúde da Plataforma pelos Direitos
Humanos Econômicos Sociais e Culturais/ Secretaria Nacional de
Mulheres Trabalhadoras da CUT/ União Brasileira de Mulheres/ Comissão
de Cidadania e Reprodução/ Ipas Brasil/ AGENDE (DF)/ Associação
Cultural de Mulheres Negras (RS)/ Associação Lésbica Feminista Coturno
de Vênus (DF)/ Bamidelê Organização de Mulheres Negras da Paraíba/
Casa da Mulher Catarina (SC)/ Casa da Mulher 8 de Março (TO)/ Centro
da Mulher 8 de Março (PB)/ CACES (RJ)/ CFEMEA (DF)/ CEPIA (RJ)/
Coletivo Feminino Plural (RS)/ Coletivo Feminista Sexualidade e Saúde
(SP)/ Coletivo Leila Diniz (RN)/ Coletivo de Pesquisas sobre Mulher da
Fundação Carlos Chagas (SP)/ Criola (RJ)/ Cunhã Coletivo Feminista
(PB)/ Ecos Comunicação em Sexualidade (SP)/ Fórum de Mulheres
Cearenses (CE)/ Fórum de Mulheres da Amazônia Paraense (PA)/ Fórum de
Mulheres de Pernambuco (PE)/ Fórum de Mulheres de Salvador (BA)/ Grupo
Curumim Gestação e Parto (PE)/ Grupo de Mulheres Negras Malunga (GO)/
Grupo de Teatro Loucas de Pedra Lilás (PE)/ Grupo Feminista Autônomo
Oficina Mulher (GO)/ Grupo Transas do Corpo (GO)/ ANIS (DF)/ IMAIS
(BA)/ Instituto Papai (PE)/ Instituto Patrícia Galvão Comunicação e
Mídia (SP)/ Jovens Feministas de São Paulo (SP)/ Maria Mulher
Organização de Mulheres Negras (RS)/ Mídia Radical (DF)/ Movimento de
Mulheres do Nordeste Paraense (PA)/ Movimento do Graal no Brasil (MG)/
Movimento Popular da Mulher/ Mulheres em União (MG)/ Mulheres Jovens
Trocando Idéias (MG)/ MUSA (BA)/ MUSA (MG)/ Núcleo de Juventude do
CEMINA e REDEH (RJ)/ Núcleo de Pesquisa em Gênero e Masculinidades da
UFPE/ REDEH (RJ)/ Rede de Mulheres Negras (PR)/ SOS Corpo Instituto
Feminista para a Democracia (PE)/ Themis Assessoria Jurídica e Estudos
de Gênero (RS).