Quem é responsável e ao mesmo tempo paga a conta pelo desperdício e falta de previdência? Não é preciso ser especialista, para reconhecer que tem dedo do ser humano nesta história e, por sua vez, de gestões públicas incapazes de administrar com eficiência, com planos realísticos de longo prazo. O modus operandi é o mesmo há décadas. Com isso, a pergunta que não quer calar: será que em um futuro breve, conseguiremos encher um balde d´água?
Ainda é necessário lembrar que existem os ‘rios intermitentes’, que dependem somente do regime das chuvas, como no semiárido brasileiro, que tem como uma grande divisora, a calha do rio Parnaíba, se estendendo até o sul do sertão baiano.
Nesse cenário de retração e de alterações climáticas, é possível elencar uma série de inações, que acentuam a gravidade da atual situação, que vivemos, não só no Estado de São Paulo, como no Brasil:
– Desperdício de consumo pela própria sociedade (banhos longos, falta de manutenção, lavagem de calçadas, de carros etc)
– Desperdício por falta de manutenção do sistema de abastecimento de água, pelos órgãos e/ou empresas responsáveis (por causa de roubos e vazamentos). Há redes com mais de 40 anos, como é o caso de São Paulo; e como estão os demais municípios do país? Alguém já se fez essa pergunta? Afinal, há 5.570 em todo território nacional.
– Ausência de planos públicos de contingência (preventivos e reativos a cenários de desastres…);
– Falta de áreas protegidas (não só no papel, mas de fato) que conservem nascentes e matas ciliares. Muitas se encontram nos próprios centros urbanos e, sequer, são conhecidas, ou mesmo as que existem, por muitas vezes, não têm a fiscalização necessária;
– Um Código Florestal atual permissivo, que reduziu áreas de proteção;
– Estruturas de Comitês de Bacias Hidrográficas que, apesar de deliberativos, não conseguem ter uma atuação eficiente (com raras exceções e pontuais). De uma forma geral, todas as instâncias deveriam dialogar de maneira cooperada, da esfera municipal à federal, por causa de dependência entre bacias;
– Coleta e tratamento de esgoto sanitário muito aquém do ideal, no país, que transformam nossos rios em bacias sanitárias. Um dos principais problemas do Brasil;
– Políticas incipientes para a redução de produção de resíduos sólidos e destinação inadequada dos mesmos, que contaminam nossos lençóis freáticos, assoreiam nossos rios, praticamente os tornam mortos e facilitam a produção de metano e emissão de Gases de Efeito Estufa (GEEs). Quase 3,5 mil municípios ainda mantêm lixões.
– Desmatamentos florestais que têm aumentado, principalmente na Amazônia, que comprometem o ciclo d`água, os chamados rios voadores, que são responsáveis pelos ciclos pluviométricos em outras regiões, como o Sudeste;
– Falta de uma política efetiva aliando lavoura-pecuária-floresta, otimizando a ocupação do solo; o uso da água para irrigação…
Esses são alguns aspectos, num contexto macro. Exigem trabalho, suor, política, técnica e sensibilização contínua. Tudo que já existe, mas subutilizado no seu potencial construtivo. Resultado: Sem água, a escassez se projeta em efeito dominó, comprometendo:
– A produção de alimentos;
– A qualidade da saúde;
– O ciclo saudável das florestas;
– Da fauna;
– Da produção de energia;
– De bens de consumo;
– E no cenário extremo, nossas próprias vidas estão em jogo, porque tudo precisa de água. Essa afirmação não é uma frase clichê.
Trata-se de conectividade e de uma construção ecossistêmica. Isso reforça que os recursos hídricos prioritariamente fazem parte de uma agenda multidisciplinar que envolve todas as pastas de um governo e está no alicerce das infraestrutura dos municípios, dos Estados e do país. Depende da responsabilidade compartilhada com as organizações e nós, como cidadãos. Falando assim, parece até simples, mas talvez seja o problema mais complexo da contemporaneidade, porque ainda se pensa em ‘caixinhas’, de forma isolada. Dessa forma, os erros se perpetuam e, se nada mudar, o balde ficará seco.
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*Blog Cidadãos do Mundo – jornalista Sucena Shkrada Resk
21 de outubro de 2014 - 16:37