No Pará, venda da Vale e grandes projetos na região são contestados

Formação de comitês nas principais regiões do Estado, realização de jornada de luta contra o modelo econômico no mês de maio, realização de ato no dia do trabalhador e uma ação de formação de base estão entre os encaminhamentos do seminário de Preparação ao Plebiscito Nacional pela Anulação do Leilão da Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), realizado em Belém, nos dias 30 e 31 de março, no Centro Integrado de Necessidades Especiais (CISNE).

Mulheres, homens, crianças, senhores (as), da diversidade social que dá massa aos movimentos de quilombolas, pescadores, assentados da reforma agrária, indígenas, ambientalistas, educadores, ribeirinhos, religiosos (as), sem terra aprofundaram por dias o debate sobre a privatização da CVRD e os grandes projetos na Amazônia.

Os 500 participantes oriundos de 60 municípios tiveram que enfrentar grandes distâncias, como ocorre com os que se deslocam de Santarém, oeste paraense, que enfrentam cerca de 780 km para chegar a capital. Ou ainda as 10 horas de viagem de ônibus em estradas em precário estado de conservação, caso dos que moram em Marabá, no sudeste do estado. Uma mobilização como a tempos não se via.

A mobilização no estado de dimensões continentais, caso do Pará, segundo em extensão territorial do país, desponta com um dos limites na mobilização dos trabalhadores e trabalhadoras, avalia a comissão do evento, que teve entre os membros, MST, Caritas Brasileira, FASE, Consulta Popular, Via Campesina. Fórum Metropolitano de Reforma Urbana, Fórum da Amazônia Oriental (FAOR) e Fórum Carajás. O evento é o desdobramento de debates que se avolumam desde 2004, e vão desaguar no Plebiscito a ser realizado na primeira semana de setembro.

Grandes projetos na Amazônia

Os impactos ambientais e sociais gerados pelos grandes sobre as populações tradicionais, a exemplo da construção de hidrelétricas no Xingu, Madeira e Araguaia-Tocantins, a exploração de bauxita no município de Juruti, a oeste do Pará pela ALCOA, e a bauxita no município de Paragominas, nordeste do Pará, via o duto pela CVRD foram refletidos. Bem como a monocultura de soja, que devasta a floresta no oeste paraense, que tem na empresa americana Cargil o principal indutor.

A soja é uma das principais ameaças para a Amazônia, avalia o procurador da República, Felício Pontes, um dos debatedores no seminário. Sobre o processo contra as irregularidades na construção do porto da Cargil no município de Santarém, o procurador alerta que tem como pano de fundo o modelo de desenvolvimento instalado na Amazônia ao longo da história, que destrói o meio ambiente e não respeita os moradores da região.

Na perspectiva do magistrado a vocação da região é o modelo sócio-ambiental, que contemple o complexo universo amazônico com base no extrativismo. Floresta e a população nativa e migrante, não podem ser percebidas como um problema ao desenvolvimento da região, reflete o procurador.

Sobre a possibilidade de um modelo que mantenha o uso equilibrado dos recursos naturais, Pontes lembra a experiência de Projeto de Assentamento Sustentável (PDS), que tem na pessoa da missionária Dorohty Stang, um dos animadores. Por sua ação a favor dos PDS’s a missionária foi assassinado em fevereiro de 2005.

Um outro exemplo pontuado por Felício Pontes é o caráter combativo dos quilombolas no reconhecimento de seu território. O Pará hoje é o estado com o maior número de áreas reconhecidas. A definição jurídica possibilita acesso ao crédito, assistência técnica, a emancipação, com pouco custo para o Estado. Isso inverte uma lógica que norteou a ação do Estado, como o ocorrido com a experiência da Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (SUDAM) afirma Pontes.

Reestatizar a CVRD é preciso

Um crime contra a soberania do país, assim foi avaliado o processo de privatização da CVRD, ocorrido há 10 anos, por iniciativa do então presidente da República, Fernando Henrique Cardoso. A empresa foi repassada ao capital privado por R$ 3,3 bilhões. Na análise do economista Aloísio Leal, Universidade Federal do Pará (UFPA), somente a reserva mineral de Carajás, cada tonelada negociada a 50 centavos de dólar, é duas vezes o preço que foi “vendida” a empresa. Na época houve avaliações independentes que apontaram valores até US$ 92,64 bilhões.

Ainda conforme o professor, a empresa tem redirecionado a sua ação para o setor de logística. Hoje a CVRD conta com uma infra-estrutura no setor de transporte, e é associada a vários projetos de geração de energia com empresas nacionais e internacionais.

O interesse da empresa no setor de geração de energia se explica pela chegada ao topo do ranking na produção de alumínio através da Alunorte, localizado no litoral norte do Estado. A energia é o principal insumo na produção do alumínio. Cada mega watt custa a Eletronorte, através da hidrelétrica de Tucuruí, US$ 24.

O megawatt é repassado para Alunorte e ALCOA por US$ 15. Tucuruí foi erguida na década de 1980, no sudeste do Pará com a finalidade de gerar energia para as empresas da CVRD e a ALCOA, em São Luís, Maranhão. A assembléia avaliou que somente a ação coletiva dos atores da base pode inverter a agenda do modelo de desenvolvimento marcado pela destruição dos recursos naturais, concentração de terra, renda, poder, violência e impunidade.

Site contra a privatização da CVRD: www.avaleenossa.org.br

Rogério Almeida é colaborador da rede Fórum Carajás www.forumcarajas.org.br

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