Convívio com o campo

Tive o privilégio de ser convidado para ministrar uma palestra sobre mídia, no EIV que está se realizando este mês, na região próxima à Viçosa. O arquivo da palestra com as lâminas que foram apresentadas encontra-se disponível nesta página ou aqui, em arquivo PPT, podendo ser utilizado e modificado livremente, dentro de conceito de “Nenhum direito autoral reservado”, esquerdos autorais ou “copyleft”.

Como já tinha participado da cobertura em áudio e vídeo de um Congresso Nacional da FEAB, em Viçosa, anos antes, bem como por conviver eventualmente com militantes do MST – Movimento dos Trabalhadores Sem Terra e MAB – Movimento dos Atingidos por Barragens, já sabia que encontraria ali os(as) mais conscientes estudantes da região, dispostos(as) a pagar o preço de uma experiência tão radical, quanto decisiva para uma visão de mundo mais próxima da realidade dos fatos. Confesso que senti uma ponta de inveja daqueles jovens e cogitei de participar desta atividade integralmente, um dia.

“O Estágio Interdisciplinar de Vivência (EIV) é uma atividade construída pelo Movimento Estudantil junto com os Movimentos Sociais. A proposta é a de que o/a estudante tenha contato com a realidade do campo e com o povo organizado. A partir disso, propiciando reflexão e ação sobre a realidade do campo e da cidade, com um pé dentro e outro fora da Universidade.

Este Estágio é composto por três fases:

1. Preparação: Os/As estudantes passam por uma fase de estudos na qual se discutem questões importantes na preparação do estagiário que irá realizar a vivência. Abordam-se a questão agrária, economia política, a organização dos Movimentos Sociais, soberania alimentar e energética, América Latina, dentre outros assuntos.

2. Vivência: Nessa fase o/a estudante passa alguns dias em uma área dos movimentos sociais que estavam na construção do EIV, morando na casa de uma família e vivenciando a realidade local. A idéia não é a de ser um turista, tampouco um pesquisador, mas sim a de se incorporar na família e viver o cotidiano dos/das camponeses.

3. Avaliação: Os/As estudantes se reúnem novamente para avaliar a vivência e discutir os aspectos do que vivenciaram. Além disso, pensamos juntos a volta para a Universidade e a organização do Movimento Estudantil.”

Mais informações a respeito, aquie aqui.

No caso do EIV da Zona da Mata mineira, havia estudantes dos cursos ligados à ciência agrária, engenharia e comunicação, com a duração aproximada de um mês e com 21 estagiários e oito coordenadores, dentre os quais minha anfitriã, Ana Maria “Catula” Pereira, estudante de comunicação. Eles foram estagiar entre famílias do MST, MAB e sindicatos ligados à questão agraria, em algumas cidades da região, dentro de um Curso de Extensão da UFV – Universidade Federal de Viçosa, em parceria com as organizações citadas.

Não me recordo da programação completa dos temas que foram tratados, mas estão entre eles Agroecologia, a cargo da ANA – Articulação Nacional de Agroecologia, e a Questão de Gênero, da MMM – Marcha mundial de Mulheres.

Trata-se de uma experiência tão valiosa, que o governo, universidades e faculdades deveriam estimular energicamente que seus alunos dele participassem, já que se for algo imposto, jamais conseguirá os resultados desejados. É uma forma eficaz de se conhecer realmente a realidade das pessoas excluídas da sociedade e vitimadas pela concentração de riqueza gerada pelo capitalismo.

Como ninguém é de ferro, também há atividades culturais, que, em nosso caso ficou por conta de Thyaga e o Trem Mineiro. Mas não se trata de um mero hedonismo inconsequente! Sinta um pouco do que anda aprontando este artista revolucionário e da arte comprometida com resultados sociais, com direito a ter seu trabalho registrado em uma tese acadêmica.

“Thyaga esteve recentemente na China participando de um festival internacional sobre cultura popular. De lá ele trouxe prêmios e a certeza do reconhecimento de seu vasto trabalho. Dentre os inúmeros projetos que ele desenvolve devo mencionar sua atuação como cantor e compositor da banda Trem Mineiro, a ministração de aulas como professor na Cooperativa Educacional de Viçosa (Coeducar) e a coordenação da ONG NAVI – Núcleo de Arte Viva. Faz pouco tempo também que ele lançou pela Editora UFV seu primeiro livro. ‘Árvores que cantam, bichos que falam, homens que aprendem’ conta a história de Francisco, menino pobre que descobre as maravilhas da Mata Atlântica.”

Continua aqui.

Assim, após um bate-papo sobre sua militância artística, rolou, noite adentro, uma tertúlia, ao som de algumas músicas de seu novo disco, realizado em parceria com as crianças e jovens com os quais trabalha, tendo como tema as frutas brasileiras. Também não faltaram interpretações de outros ritmos, com uma nova roupagem.

Pena não ter podido permanecer por mais tempo com esta elite de nossa militância e desenferrujar meus ossos e neurônios, diante de tão exuberante alegria, brincadeiras, danças em grupo e disposição gigantesca em sair do sistema e construir um mundo novo. É como um pequeno Fórum Social Mundial, acrescido de uma atividade imediata e radicalmente prática.

Seguramente, para modificar uma sociedade conservadora, superficial e reacionária como a nossa, os gatos pingados que conseguem pensar por si mesmos, devem ter, cada um, vontade de se desdobrar em mil outros, para compensar a alienação geral de nosso povo, mantido assim, para ser mais facilmente explorado pela classe dominante.

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(*) Heitor Reis é um subversivo, indivíduo perigoso do ponto de vista dos milicos, de Gilmar Mendes e de qualquer um que esteja satisfeito com o atual sistema político, econômico e social. Nenhum direito autoral reservado: Esquerdos autorais (“Copyleft”). Palestras gratuitas. Contatos: (31) 3243 6286, 9208 2261 – heitorreis@gmail.com