Conferência de Cultura pede banda larga em regime público

A ampliação e a melhora do serviço de internet no país e o fortalecimento das emissoras de rádio e TV do campo público foram as principais reivindicações feitas pelos delegados da II Conferência Nacional de Cultura para a área da Comunicação. Elas foram as duas propostas sobre o tema inseridas entre as trinta e duas definidas como prioridade na Conferência, que se encerrou dia 14 deste mês.

Os mais de 800 delegados da Conferência entenderam que atualmente uma das principais vias de distribuição dos bens culturais, como vídeos, imagens e músicas é a internet em alta velocidade. Por isso, o texto da proposta diz que é preciso “avançar com a formulação e implantação do Plano Nacional de Banda Larga, contemplando as instituições culturais e suas demandas por aplicação e serviços específicos”.

A proposta, porém, não para por aí. Ela pede que a banda larga seja transformada em um serviço prestado em regime público. A ideia encontra vários defensores, principalmente na sociedade civil. Eles acreditam que esta é uma mudança que criaria um impacto no setor, já que, neste regime, os operadores privados ficariam sujeitos a obrigações como universalização e continuidade do serviço e controle de suas tarifas. Atualmente, apenas a telefonia fixa é assim regulada.

No entanto, o governo não tem dado sinais de que pretende fazer essa mudança no regime do serviço. Pelo menos não a um curto prazo. Dois dos principais articuladores do Plano Nacional de Banda Larga (PNBL) no Executivo deram declarações contrárias a medida. Um deles é o assessor especial da Presidência da República e coordenador do Plano, Cesar Alvarez. O outro é o secretário de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, Rogério Santanna. Este último acredita que a alteração pode gerar demora na implantação das ações do Plano, já que teriam de ser abertas licitações públicas para novas concessões para os operadores do serviço.

A decisão sobre os pontos indefinidos no PNBL, incluindo a mudança de regime da internet em banda larga, seria tomada em fevereiro. Porém, isso não ocorreu e a promessa é que o martelo seria batido em março, o que também não foi feito. Agora, o governo afirma que a reunião da equipe técnica com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva acontecerá no próximo mês. Com essa demora, fica difícil prever o que será colocado em prática ainda na gestão de Lula.

A outra prioridade para o campo da Comunicação definida na Conferência de Cultura foi a regulamentação e implementação do capítulo da Comunicação Social na Constituição Federal, em especial o artigo 223, que garante a complementaridade dos sistemas público, privado e estatal. A ideia é fortalecer as emissoras de rádio e TV do campo público, incentivando que elas promovam a diversidade cultural e regional brasileira, produzida de forma independente. Hoje, apenas 5% do que é exibido na TV comercial aberta no país pode ser considerado produção independente, segundo informação da Associação Brasileira de Produtoras Independentes de Televisão (ABPITV).

A produção regional na TV também é baixa. Um estudo realizado por este Observatório a partir da análise de 58 emissoras em onze capitais das cinco regiões do país demonstrou que apenas 10,8% do tempo veiculado é ocupado com conteúdos de origem local. O índice é bastante inferior ao percentual de 30% previsto no Projeto de Lei da ex-deputada Jandira Feghali (PcdoB-RJ) (256/1991), que visa regulamentar o dispositivo constitucional citado acima, tramitando no Congresso Nacional há 19 anos. Conheça a pesquisa “Produção Regional na TV Aberta Brasileira”.

A integrante do Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social Carolina Ribeiro acredita que a II Conferência de Cultura demonstrou que os campos da comunicação e da cultura estão conseguindo estabelecer pontes. “A diversidade cultural passa necessariamente pela discussão do papel dos meios de comunicação”, compreende Carolina. Para ela, a comunicação teve um reconhecimento importante na Conferência. “Tanto que a proposta de fortalecimento do campo público foi a terceira mais votada”, exemplifica.

Setoriais

Além das trinta e duas propostas prioritárias, cada área da Cultura também elegeu suas prioridades específicas. Foram 95 definidas por plenárias setoriais, como arquitetura, circo, música, arte digital e cultura indígena. O setor do audiovisual aprovou cinco propostas, que relacionam-se diretamente com o campo da comunicação. Em uma delas, exige-se que, na TV por assinatura, se garanta os incentivos à produção nacional e independente nos canais e nos pacotes de programação em apoio ao Projeto de Lei nº 29/2007, que regula o mercado deste serviço.

“Contudo, devem ser criados novos mecanismos e instrumentos para a ampliação das cotas da inserção da produção nacional e independente, uma vez que os atuais percentuais estabelecidos no projeto são insuficientes para atender a demanda e o potencial do audiovisual brasileiro”, diz o texto da resolução. O PL 29 ainda é alvo de intensas disputas no Congresso Nacional. O projeto está para entrar na pauta da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados. Depois de três anos de discussão, ele foi aprovado no órgão técnico do setor, a Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI) da Câmara. Veja a versão aprovada na CCTCI.

Para o diretor de cinema e vice-presidente do Conselho Nacional de Cineclubes, Luiz Alberto Cassol, é importante que o PL 29 seja imediatamente levado a cabo. “Ao mesmo tempo, pode-se aumentar as possibilidades dele. A questão é o aumento da produção independente. Mas o fundamental é que ele seja aprovado”, entende. Cassol acredita que o gargalo do setor ainda está na distribuição da produção, apesar de perceber um crescimento significativo em algumas modalidades de exibição, como os cineclubes. “Hoje temos 600 mapeados no país e a intenção é chegar a mais de 1.200 até o fim deste ano”, diz.

Passada a Conferência, o Ministério da Cultura vai trabalhar para organizar as resoluções, observando o que diz respeito diretamente ao Governo Federal e o que necessita de uma análise do Congresso. “A garimpagem é tarefa nossa nessas duas semanas que se seguem”, garante João Ribeiro, coordenador executivo da II Conferência de Cultura. Segundo ele, haverá um grupo de trabalho interno para esses encaminhamentos das resoluções.


Confira o resultado da Conferência

Por: Jacson Segundo – Observatório do Direito à Comunicação