Foto: Rita Ronchetti
O protesto aconteceu em frente às instalações da Rede Bandeirantes de Televisão, que comportam vários meios de comunicação do oligopólio.
A luta dos comunicadores populares da região de Campinas se agravou nos últimos meses. Diversas rádios comunitárias, a maioria ligadas aos movimentos sociais, tem sido fechadas pela polícia civil, prendendo seus operadores e destruindo equipamentos. Só neste último fim de semana, policiais militares estiveram no sábado na Rádio Comunitária Floresta FM, em Hortolândia e confiscaram os transmissores sem mandado judicial, e na calada da noite. No domingo, fiscais da Anatel lacraram e apreenderam os transmissores da Rádio Planeta, localizada no Jardim Satélite Iris em Campinas.
Em junho último, a polícia tentou confundir os comunicadores com ladrões de jóias e traficantes, conforme divulgado pela Agência de Notícias da EPTV, afiliada da Rede Globo. Depois foi a Rede Bandeirantes que se fez presente na invasão à Rádio Comunitária Nova Estação, acompanhando a truculência da Polícia Civil na ocasião, a prisão de seis coordenadores regionais da Abraço (Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária), apreensão de equipamentos, e recusou-se a ouvir o outro lado “Representantes de outras rádios comunitárias que se dirigiam ao local avistaram o Veículo da Bandeirantes junto com viaturas do Garra, que atendiam solicitação de reforço dos policiais civis presentes na ação”, conta Jerry Oliveira, coordenador sudeste da Abraço.
A Abraço São Paulo tem feito sistemáticas denúncias da ilegalidade da maioria das emissoras comerciais da região, que se encontram com outorgas vencidas, recebendo o descaso das autoridades competentes. “Recentemente descobrimos uma empresa que presta serviços às rádios comerciais”, continua Jerry, “cujo objetivo é rastrear emissoras comunitárias e denunciá-las. O mais surpreendente é que esta empresa é formada por ex agentes da Anatel”. Por isso, o ato desta quinta-feira, dia 19, foi realizado na frente da Band, onde funcionam emissoras com outorgas vencidas, algumas desde 2004.
Contruindo outra comunicação possível
Diversos depoimentos repercutiram estas denúncias hoje no ato público, levadas por militantes de diversas rádios comunitárias presentes, algumas legalizadas, como a Rádio Heliópolis e a Rádio Cantareira. Também estiveram presentes vários sindicatos, como os Radialistas e o Sinergia, a Sub Sede da CUT Campinas, movimentos como o MST, MTST, MNU, Fábrica Ocupada Flaskô, Intervozes, a Frente Paulista pelo Direito a Comunicação; e meios de informação independentes, como a Ciranda e Caros Amigos. A deputada Luiza Erundina e o deputado Ivan Valente enviaram mensagens de apoio à manifestação.
“A Bandeirantes é uma das piores empresas para os trabalhadores”, falou Zé Marcos, secretário geral do Sind. Radialistas de SP. “Perseguem as verdadeiras rádios que tentam desempenhar um papel social, que deveria ser das emissoras públicas”. Os ataques aos movimentos sociais por parte das emissoras também foram criticados pelo radialista, em contraposição ao enorme crescimento de seu faturamento publicitário. “A Rádio Luta, da Flaskô, não tem uma publicidade!”, diz orgulhoso Fernando. “E por que eles vivem dando batida, buscando nossos equipamentos? O céu é de todos, nós temos o nosso direito!” As denúncias das intimidações e da truculência dos policiais nessas ações se sucederam, como a de Adeilda, da Rádio Sky, que conta de sua filha de 7 anos, está traumatizada, não pode ver polícia.
“Aos amigos tudo, aos inimigos a lei”, sintetizou João Brant, do Coletivo Intervozes e da Frente Paulista pelo direito à comunicação. “Jogam as rádios comunitárias na marginalidade, enquanto no MiniCom se acumulam mais de 10 mil processos em análise. João explicou também que não há registro no Brasil de interferência de rádio comunitária que tivesse causado problemas, como as emissoras comerciais querem fazer crer. Sua baixa potência não permite isso, segundo o ativista da comunicação, que também defendeu a necessidade do MiniCom investigar o sistema de pleitos, que privilegia os políticos nas outorgas de concessões.
A relação de políticos, meios de comunicação e organismos de Estado foi destacada em várias intervenções. “Quem são os donos dos meios de comunicação no Maranhão, em Alagoas, na Bahia, no Rio, em São Paulo?”, denunciou Margarido, do PSTU de Campinas. “Os homens que exercem o monopólio do Estado fazem as leis para criminalizar os movimentos. A luta é contra todos os latifúndios, o da terra, o das comunicações, o do poder!”
“Por que a polícia não fecha a rádio dos poderosos?”, desafiou o coordenador da Abraço. “A maioria das emissoras privadas estão vencidas há muito tempo, mas não sofrem sanções como as rádios comunitárias!” A polícia militar logo apareceu, mas para conter o ato, e apareceu depois também a polícia civil. “Apelamos à PM que cumpra a lei aqui também, queremos o mesmo tratamento, esta também está ilegal, queremos justiça!” Uma comissão de representantes dos movimentos chegou a conversar com os emissários da Polícia Civil, juntamente com o advogado da Abraço, Alexandre Mandel. O investigador Nelson (não deu o nome completo) informou-nos, então, que a Bandeirantes teria duas horas para apresentar a documentação, na DIG – Delegacia de Investigações Gerais.
Diante da colocação do advogado de que a Abraço já teria feito formalmente a denuncia, sem obter qualquer atenção, os policiais apenas diziam não saber de nada, falavam individualmente, não pela instituição. Disseram que ali estavam apenas para evitar conflitos, tomaram conhecimento da denúncia de irregularidade da Band naquele dia, e que advogado da empresa estava vindo de São Paulo. “Acreditamos numa outra comunicação, voltada para o povo, a periferia, suas lutas”, dizia Valdeci, antigo batalhador das rádios comunitárias. “Fazemos rádio para as pessoas que não têm acesso à comunicação comercial, não são grandes políticos ou empresários que tem concessão pública, nós também temos que ter esse direito, se não conseguimos hoje, voltaremos com mais gente!”
O recado foi dado à Bandeirantes e ao restante do oligopólio das comunicações, que patrocinam a perseguição às rádios comunitárias. As organizações continuarão vigilantes com as outorgas vencidas, exigindo respeito e atuação democrática por parte das instituições. As testemunhas estão aumentando, a necessidade de outra comunicação também. “O tratamento diferenciado está comprovado”, diz o Dr. Alexandre, “a contradição política está escancarada!”.