Em anúncios publicados nos jornalões paulistas de 8 de Novembro, a Universidade Bandeirante (Uniban) anuncia que decidiu expulsar a aluna Geisy Arruda.
A estudante de Turismo sofreu bárbaro assédio coletivo no dia 22 de Outubro, na unidade de São Bernardo do Campo. O motivo: trajar na ocasião um vestido curto, num tom cereja.
O texto publicado pela Uniban deve converter-se imediatamente em peça de estudo para juristas, educadores, antropólogos e sociólogos.
A universidade preferiu punir a vítima e inventar uma justificativa pitoresca para o espetáculo do bullying, registrado por câmeras do próprios alunos e vergonhosamente exposto ao mundo pelo Youtube.
Segundo os negociantes da educação, “a atitude provocativa da aluna resultou numa reação coletiva de defesa do ambiente escolar”.
Seria cômico se não fosse trágico. A Uniban, mais uma das uniesquinas do Brasil, considera “defesa do ambiente escolar” a agitação do bando que ameaçava estuprar a colega e que a perseguiu aos gritos de “puta, puta, puta”.
Alheia a valores e princípios, a Uniban pautou-se unicamente pela doutrina da preservação do lucro. Expulsou a mocinha da periferia e manteve as centenas de vândalos que a molestaram.
Defendeu, assim, a receita, a contabilidade, mesmo sob o risco de macular para sempre sua imagem.
Em “Psicologia das Multidões”, Gustave Le Bon refere-se com clareza ao fenômeno da sugestão em movimentos de multidões.
Diz ele: “Os indivíduos de uma multidão que possuem uma personalidade bastante forte para resistirem à sugestão são em número tão diminuto que acabam por ser arrastados pela corrente”.
Le Bon lembra que, em determinadas situações, a multidão transforma o indivíduo civilizado num bárbaro, num ser primitivo, movido pelo instinto, que vibra com o ataque ao inimigo inferiorizado.
Poucas vezes se viu isso tão claramente quanto no episódio de 22 de Outubro. Há garotas inconformadas com a sina; afinal, não têm o corpão de Geisy. Há machões conquistadores não correspondidos, movidos pelo instinto de vingança. Por fim, a turba ignara que se diverte com a perseguição, algo muito semelhante à farra do boi.
A curvilínea e voluptuosa Geisy, que concedeu entrevistas aos programas televisivos vespertinos, exibiu-se no mesmo vestido que gerou a fúria de seus colegas de universidade.
Nada formidavelmente pecaminoso como se poderia imaginar. Aliás, fosse ela mirrada e poucos notariam a ousadia de suas vestes.
Esses aspectos objetivos da questão foram ladinamente desconsiderados pela direção da universidade.
Em nome do “negócio”, a Uniban preferiu investir na fabricação de canalhas.
A decisão funciona como um sinal verde para os moralistas cafajestes de todos os tipos. Esse incentivo criminoso, pois, não se limita aos clientes da instituição, mas ao conjunto dos estudantes brasileiros.
Paulo Freire, costumava advertir os educadores com a seguinte frase:
“Conhecer é tarefa de sujeitos, não de objetos. E é como sujeito, e somente enquanto sujeito, que o homem pode realmente conhecer”.
No caso em debate, a Uniban fez exatamente o contrário. Desprezou o sujeito, deseducando-o. Concomitantemente, priorizou o objeto, isto é, seu negócio, o prédio iluminado vendedor de diplomas.
Dessa forma, trocou todas as regras da civilidade por um repugnante código de carceragem.
O episódio Geisy revela a decadência do ensino universitário brasileiro, transformado em oportunidade de mercado. Essa é a herança do regime militar e dos governos conservadores que o seguiram, sobretudo aquele do privateiro Fernando Henrique Cardoso.
Ironicamente, o bajulado professor uspeano de tudo fez para esculhambar o ensino público de qualidade, entregando o sagrado ofício da educação às máfias dos certificados e aos traficantes de títulos acadêmicos.
Tempos de provação. E, como formigas, os canalhas saem aos montes dessas instituições, prontos a divinizar o pensamento neoliberal e a Lei de Gérson, seduzidos à barbárie por diversão.