Na ânsia de denunciar o que seria a maior crise institucional já vivida pelo Brasil, nos últimos 40 anos, um dos maiores e mais antigos jornais do país jogou por terra parte da sua credibilidade ao publicar, na manchete da última quarta-feira (30), a notícia de que o ministro da Defesa, Nelson Jobim, e os três comandantes militares brasileiros, teriam pedido demissão, em uma carta entregue ao comandante-em-chefe das Forças Armadas, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em uma reunião de emergência, no Aeroporto de Brasília, às vésperas do Natal.
A carta não existe, segundo o Palácio do Planalto, o encontro não aconteceu e muito menos houve qualquer alteração no humor da caserna por conta da Lei de Anistia a ser revogada, após análise da comissão especial criada pelo Poder Executivo, para rever a questão das torturas e dos assassinatos ocorridos nos porões da ditadura militar que assolou o país durante mais de 20 anos, no século passado.
Na matéria publicada pelo conservador diário paulistano O Estado de S.Paulo, haveria um ambiente de revolta por parte dos militares, que teriam considerado – segundo as repórteres Christiane Samarco e Eugênia Lopes – a terceira versão do Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3) uma forma provocativa de revisão da história recente do País.
Segundo a reportagem, “na avaliação dos (ministros) militares e do próprio ministro Jobim, o PNDH-3, proposto pelo ministro da Secretaria de Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, e lançado no dia 21 passado, tem trechos ‘revanchistas e provocativos'”.
O assunto não mereceu qualquer tipo de repercussão nas três esferas das Forças Armadas, por determinação direta dos comandantes da Aeronáutica, brigadeiro-do-ar Juniti Saito, do Exército, general Enzo Peri, e da Marinha, almirante Moura Neto, que teriam “aderido” à decisão de renúncia do ministro da Defesa.
O ministro Jobim, por sua vez, também orientou seus assessores a não se pronunciar sobre a matéria veiculada e coube à Presidência da República, que funcionou na última quarta-feira (30) em regime de plantão, encerrar a série de bravatas atribuídas aos setores militares do País com a informação de que o presidente Lula não recebeu carta alguma, de quem quer que fosse, e muito menos pretende dissuadir a comissão criada no âmbito do PNDH-3 de avaliar, com isenção e liberdade, a legislação que rege a anistia concedida logo após os ‘Anos de Chumbo’.
– A reunião que houve entre o presidente Lula e o ministro Jobim aconteceu aqui no Palácio (do Planalto) – disse um dos assessores, que desconhecia qualquer encontro, às pressas, no angar do avião presidencial, em Brasília.
A matéria do jornal paulistano também foi questionada no ponto em que cita uma espécie de “acordo político: Não se reescreve o texto do programa, mas as propostas de lei a enviar ao Congresso não afrontarão as Forças Armadas e, se for preciso, a base partidária governista será mobilizada para não aprovar textos de caráter revanchista”.
Segundo um alto funcionário da secretaria nacional dos Direitos Humanos, que prefere o anonimato – diante da situação peculiar do ministro Paulo Vannuchi, de suposto pivô de uma crise militar no País -, a informação “não faz o menor sentido”.
– O programa (PNDH-3) não está aí para afrontar ninguém, mas para restabelecer a verdade dos fatos e, ao que se saiba, a verdade não faz mal a ninguém – disse.
Tanto Vannuchi quanto seus principais assessores estão de folga, por conta das festas de fim de ano e nenhum deles foi chamado à secretaria por conta da crise institucional divulgada pelo diário paulistano.
Outro ponto descartado foi a declaração de um militar sobre a questão: “Se querem por coronel e general no banco dos réus, então também vamos botar a Dilma e o Franklin Martins’, teria dito o general da ativa aos jornalistas, referindo-se à ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, e ao ministro de Comunicação de Governo, que participaram da luta armada.
“Não me venham falar em processo para militar pois a maioria nem está mais nos quartéis de hoje”, completou a reportagem.
– Tanto tudo isso não passa de uma matéria encomendada por setores da direita conservadora, sem qualquer respaldo na realidade das Forças Armadas, que ninguém se mobilizou em favor das declarações atribuídas a um “general da ativa”, que não se identifica perante a opinião pública e deseja colocar os militantes da esquerda brasileira no mesmo banco dos réus em que se encontram torturadores contumazes – afirmou o funcionário federal. (Fonte: Correio do Brasil)