Em Porto Alegre, sociedade reivindica produção independente, diversidade e autonomia para a EBC

Os participantes, aproximadamente 60 pessoas, abordaram temas como modelo de financiamento dos meios públicos, produção audiovisual independente, reinvenção no modo de fazer jornalismo, diversidade, legislação para a TV digital, entre outros. A audiência foi a primeira realizada na região Sul do país e teve como tema “Desafios para a autonomia, a diversidade e a regionalização do Sistema Público de Comunicação”.

Compuseram a mesa de discussão a presidenta do Conselho Curador, Ana Fleck, o diretor-presidente da EBC, Nelson Breve, a Ouvidora, Regina Lima, a secretária-adjunta da Secretaria de Comunicação do Estado do Rio Grande do Sul, Patrícia Goulart, e os anfitriões Pedro Osório e Amaro Nunes Júnior, presidentes, respectivamente, da Fundação Cultural Piratini (TVE/RS e FM Cultura) e de seu Conselho Deliberativo. As conselheiras Ima Vieira e Ana Veloso, os conselheiros Guilherme Strozi, Paulo Derengoski, Mário Augusto Jakobskind e Daniel Aarão, e o diretor-geral da EBC, Eduardo Castro, também participaram com falas durante a audiência.

A ouvidora, Regina Lima, afirmou que o deslocamento das audiências de Brasília para outros lugares democratiza o processo de construção da Empresa. “Podemos olhar nos olhos das pessoas e ouvi-las”, disse. Ela acredita que o prognóstico do Conselho ao planejar esse tipo de atividade junto à sociedade estava certo: “vendo a quantidade de participantes nesse último evento, constatamos que as pessoas tem o interesse em participar da comunicação pública, construí-la e debatê-la”.

Produção independente
Erika Kramer, produtora de cinema da região fez duas sugestões à EBC em sua fala durante a audiência. A primeira foi que a TV Brasil abrisse mais espaços para a produção independente nacional na área cultural. “A produção independente é um retrato do país porque fala do Brasil, é resolvida financeiramente e pode ser adequada à programação da TV, com um valor muito baixo para a Empresa”, defendeu.

Seu segundo pedido foi de que a emissora realizasse uma reunião específica com produtores independentes. Para ela, a relação entre o canal e cineastas é muito distante, o que pode ser melhorado caso esses conheçam melhor quais as demandas da TV Brasil para as produções audiovisuais.

Concordando com a cineasta, Amaro Nunes disse que a diversidade e a regionalização da programação de uma emissora pública passam pela produção independente. “Quando veicularmos essas produções teremos a oportunidade de ter novos olhares, para criar novos retratos do Brasil. As produtoras independentes devem ser briefadas pela EBC e cada produtor pode dar seu olhar, sua visão de mundo, trazendo a diversidade”, disse.

Diversidade, divulgação e audiência
Regina Lima defendeu, porém, que não se garante a regionalização e a diversidade da programação somente com a inclusão de produção independente na grade, mas também na forma como o conteúdo é produzido. “O sujeito do local pode se sentir representado em uma produção nacional mesmo sem ela ter sido feita ali”, explicou.

Para ela, a história do audiovisual no Brasil, que começou a ser produzido pelo setor privado, determinou a estética aceita pelo público até hoje. Por isso, um dos grandes desafios para a produção focada na diversidade é fazer as pessoas desconstruírem a estética dominante. Atuando nesse sentido, na análise da ouvidora, a Empresa está implantando uma política de visibilidade, para divulgar sua produção.

Seguindo a linha das discussões sobre divulgação e audiência, José Gomes, representante da TV universitária local, defendeu que os veículos públicos deveriam ter uma maior preocupação com a competitividade: “é preciso ampliar a pesquisa de audiência das redes públicas. Temos que difundir mais o que produzimos”.

Nelson Breve completou dizendo que a EBC só conhecerá seus resultados se contar com pesquisas que apurem a efetividade da comunicação, o que significa medir não só a quantidade de pessoas assistindo à programação, mas como elas têm formado sua cidadania com esse conteúdo. “Porém, medir somente audiência é importante também, pra conseguirmos mais investimento para sermos autônomos”, disse.

Autonomia da EBC e financiamento estatal
Em relação à autonomia da Empresa Brasil de Comunicação frente ao Estado, Amaro disse: “acredito que a autonomia está diretamente atrelada ao sistema de financiamento. O sistema público de comunicação não deveria depender do governo, porque alguns governos serão contrários, outros favoráveis e outros desinteressados”.

Respondendo a ele, o diretor-presidente da Empresa esclareceu que existe, segunda a Lei de criação da EBC, uma taxa de fiscalização que serviria para dar maior independência financeira aos meios públicos, mas que hoje está retida. O Fistel (Fundo de Fiscalização das Telecomunicações) é um fundo depositário das companhias de telecomunicações que teve parte de sua composição destinada à comunicação pública.

“Nesses últimos quatro anos foram acumulados 1 bilhão e 400 milhões depositados em juízo. A liberação desse fundo é uma luta da sociedade, temos que lutar pela nossa autonomia. Se o modelo de financiamento não se resolver, todo o resto é desejo, porque qualquer projeto tem que caber em um orçamento.”, afirmou Nelson.

TV Digital no Brasil
Com a fala de Karine Prevedelo, pesquisadora da Unisinos, os participantes passaram a debater o tema da TV Digital e sua implantação. Ela afirmou que umas das hipóteses de sua tese de doutorado é que as TVs comunitárias estaduais nos interiores fortalecem os núcleos de produção regional. A pesquisa avaliou que os núcleos estão se consolidando como alternativa para a comunicação hegemônica. Além disso, analisou também como estes estão se planejando para a TV digital. “Vemos que o financiamento é menos importante que a questão política, com relação ao espectro de TV digital”, disse.

Hoje, não existe a possibilidade da migração de parte das TVs públicas pra o sistema digital no sinal aberto. Os espaços reservados para a comunicação pública no novo espectro se limitam sobretudo às emissoras estatais, excluindo as universitárias e comunitárias. Para elas, estariam destinados apenas alguns horários nos canais da cidadania e da cultura, que poderão absorver suas produções.

Nelson Breve explicou que quem vai gerir esses canais é o Ministério das Comunicações e que a política para ele não está definida, por isso, pode ser alterada de acordo com as demandas da sociedade. “Estamos viabilizando para que o canal da cidadania possa estar integrado com o operador nacional digital, mas o modelo é uma coisa que depende de mobilização das entidades ligadas a isso. A inclusão digital é nossa oportunidade para incluirmos a comunicação pública no sistema aberto”.

Para Everton Rodrigues, jornalista e consultor em tecnologias e integrante do Gabinete Digital do governo gaúcho, a TV digital pode não funcionar como prometeu e a internet já tem todas as possibilidades que ela oferece. “Está tudo indo por água abaixo porque as teles estão controlando o conteúdo da internet, temos que pensar mais nela quando falamos de comunicação pública, porque as redes já são uma realidade e estão prontas para serem usadas”, disse.

Por outro lado, Pedro Osório defendeu que no Brasil, os veículos que conseguiram articular uma visão de mundo e fazer com que as pessoas se mobilizem, foram os meios gratuitos massivos e não a internet. “O consumo da internet ainda é segmentado, por isso não perdemos de vista os meios massivos. Temos que criar alternativas para o rádio, além dos meios audiovisuais”, argumentou.

Participação popular e de movimentos sociais
O conselheiro Guilherme Strozi ponderou que a tecnologia não deve ser o foco dos meios públicos e, sim, os brasileiros. “Nossa sociedade está preparada pra uma revolução na comunicação? Estamos chegando na sociedade civil que não está organizada? A EBC e as empresas públicas devem fazer com que a sociedade que não possui essa mentalidade de comunicação como direito humano também se faça ouvir”, defendeu.

João Jorge, integrante do Conselho Curador da EBC concordou com seu colega: “a EBC tem sido tão importante porque é uma comunicação para o benefício do povo brasileiro. Mas os grupos não organizados ainda não estão participando das nossas discussões e precisam estar. Tudo em que o Brasil é diverso, se torna um país vencedor. Onde temos todo tipo de brasileiro, crescemos”.

Rita Freire, representante da Articulação Mulher e Mídia, fez contribuições quanto ao tema da diversidade dizendo que uma preocupação da comunicação pública deve ser a representatividade de movimentos invisíveis para a mídia tradicional, entre eles a população negra e feminina.

“Deixo um conselho para vocês: a Conferência Nacional de Comunicação (Confecom) e Conferência para Políticas para Mulheres trouxeram eixos de como a comunicação pública e privada devem se comportar em relação a esses grupos no que se refere à diversidade e regionalização. Olhem para as resoluções dessas conferências”, pediu a militante.

Pedro Osório confirmou que a mobilização para a Confecom representa a opinião dos movimentos sociais: “nossa expectativa é que o governo dê prosseguimento ao que foi decidido lá”.

A transcrição dos debates da audiência pode ser acessada clicando aqui. Já o áudio da atividade, que durou quatro horas, pode ser solicitado pelo e-mail conselho.curador@ebc.com.br.

Veja matéria sobre a 40ª Reunião do Conselho Curador, também realizada em Porto Alegre, clicando aqui.

Veja galeria de fotos da Audiência Pública do Conselho Curador em Porto Alegre, clicando aqui.

Fonte: Secretaria Executiva do Conselho Curador

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