A reunião no Rio de Janeiro já havia sido marcada antes da dissolução do Conselho pela Medida Provisória 744, publicada no dia 2 de setembro, dia em que ocorreria a 63ª Reunião, em Brasília. Nesse dia, os conselheiros e a sociedade civil fizeram um ato na frente da sede da EBC, contra o desmonte do caráter público da empresa. Os integrante do colegiado mantiveram a reunião como forma de permanecer mobilizados em prol do ideal democrático da comunicação pública.
Estiveram presentes a presidenta Rita Freire, a vice-presidenta Evelin Maciel e xs conselheirxs Ana Veloso, Rosane Bertoti, Mário Jakobskind, Joel Zito Araújo, Isaías Dias, Takashi Tome e Akemi Nitahara, além do ex-conselheiro Daniel Aarão Reis. Também participaram os professores Fernando Salis, da UFRJ, Adilson Cabral, da UFF, João Feres Junior, da UERJ, representantes do Canal Saúde, Fale Rio, Prepara Nem, Coletivo de Mulheres da EBC, Intervozes, Sindicato dos Jornalistas e dos Radialistas, CUT, Articulação de Mulheres Brasileiras, Movimento Sem Tela, Frente em Defesa da EBC, mandatos de vereadores, de deputados estaduais e federais e vereadores eleitos.
Rita destacou o autoritarismo da MP e a inconstitucionalidade da medida. Akemi explicou a situação vivida pelos funcionários dentro da empresa, com perseguição política e perda de cargos de pessoas indicadas pelas equipes e que passaram em PSI.
Integrante do Fale Rio, Orlando Guilhon denunciou o desmonte da comunicação pública também municipal e a suspensão de contratos com produtoras independentes que faziam programas que alimentavam as grades da TV Brasil e das rádios Nacional e MEC.
Joel destacou a importância da diversidade de vozes na comunicação e disse que é prática de governos autoritários desmontar as TVs públicas, como já foi feito com a TV Cultura. Ele defendeu a permanência do Conselho, “não necessariamente essa composição, não necessariamente nós, mas que se tenha um conselho curador para garantir a participação social na EBC”.
Daniel Aarão disse que aprendeu muito durante os anos em que foi conselheiro da EBC e defendeu a importância do colegiado. “Se a Petrobras tivesse um Conselho Curador como o da EBC não teria acontecido tudo isso que aconteceu”. Ele lembrou que a própria Constituição de 88 tem uma série de dispositivos ameaçadores e autoritários, como o impeachment. E sugeriu que o Conselho permaneça mobilizado e faça reuniões em outras cidades, para se “manter acesa essa chama de luta”. Ele leu a carta assinada pelos ex-conselheiros Maria da Penha, Murilo César Ramos, Cláudio Lembo, João Jorge Rodrigues e Luiz Gonzaga Belluzzo, além dele próprio.
Ana Veloso lembrou da mobilização grande feita pela sociedade civil para ela ocupar o cargo de conselheira e das lutas dentro do conselho, como a pela faixa da diversidade religiosa e pela acessibilidade total na TV Brasil. “Também fizemos as lutas feministas e o debate sobre gênero, colocamos dentro do manual de jornalismo que não sei pra onde vai agora”.
Rosane Bertoti disse que o ataque do governo aos movimentos sociais inclui esse ataque à EBC. “A gente nem conseguiu ter uma EBC que a gente queria e fomos atropelados por esse bonde que desestruturou toda a rede. A luta está apenas no começo. Há uma correlação de forças pra isso, não podemos nem recorrer ao sistema judiciário, que está em conluio com o golpe. Então precisamos de luta e mobilização. O resultado das eleições de domingo mostrou isso”.
Evelin Maciel disse que a reunião foi feita num “clima de desobediência civil”, mas que tem que ser feito para “não deixar que o clima sombrio chegue à nossa alma”, com essa “tentativa do governo de calar todas as vozes dissonantes”. “O foco do Conselho na defesa de opinões, diversidade religiosa, faixa de reflexão, faixa infantil, acessibilidade, equidade de gênero. Essas questões eram a matéria prima do nosso trabalho e era um trabalho muito intenso. Lamento muito que a lei da EBC nunca tenha sido totalmente implementada”.
Ela lembrou da falta de autonomia financeira, já que os recursos da CFRP nunca foram liberados para a empresa. “Mesmo com a liberação de uma parte nos daria mais autonomia financeira, o que levaria a autonomia editorial. Brigamos muito com o governo anterior, pra depois virem dizer que o conselho estava partidarizado. Mas a verdade não interessa e eles vão publicando notas aqui e ali desvirtuando a verdade”.
Evelin agradeceu às instituições que estavam participando da renovação do conselho, com 45 já mobilizadas quando o processo foi interrompido e 17 pessoas inscritas.
Takashi disse que o primeiro ato do governo empossado foi um ato de censura, “assim como em 1964”. “A primeira coisa foi censurar um órgão de imprensa. Temos que ter claro isso. O governo diz que foi para dar economicidade à empresa, mas não pode fazer isso por uma medida provisória. O governo corta aqui, no salário do professor, da aposentadoria, mas paga mais de um bilhão de reais de juros por dia”.
Isaías lembrou que tinha tomado posse no conselho há apenas um ano e dois meses e destacou que a cobertura da paralimpíada só foi feita porque estava no plano de trabalho e porque tinha um conselho curador para cobrar isso. “Estava em andamento conversa com a TV Ines para levar acessibilidade para a TV Brasil, ter audiodescrição, libras. Mas como ao governo golpista não interessa que quem não tem voz tenha voz, quem não tem visão tenha visão e quem não tem audição tenha audição, ele enterrou todo o projeto. Temos que continuar na rua dizendo que esse governo que está aí é golpista e lutar dia e noite pra que ele caia com todo o projeto que exclui os seguimentos pelos quais a gente sempre lutou”.
Mário lamentou o desmonte da comunicação pública também no âmbito municipal, com o veto ao canal da cidadania. “Quem diria que passaríamos por outro golpe aqui no país. Vamos enfrentar essa situação e vencer essa luta. Quando defendemos a mídia pública defendemos essa democracia”.
Rita lembrou dos apoios nacionais e internacionais que a causa tem recebido, com as manifestações inclusive da OEA e do Unicef.
Evelin destacou que outras duas MPs que tratam de comunicações estão em debate no Congresso. “Uma que renova concessões de radiodifusão sem debate out transparência e outra que flexibiliza a voz do Brasil. A rede legislativa também está sendo afetada, nada mais andou no ministério das comunicações”.
Nos encaminhamentos, foram organizadas as propostas que surgiram para manter a mobilização em torno da comunicação pública:
– Organizar mais amplamente a campanha de Defesa da EBC e de Comunicação Pública, com debates, atos públicos, iniciativas nas redes sociais, materiais de divulgação;
– Pressão sobre os Senadores e Deputados da Comissão Mista que vai analisar a MP 744;
– Participar ativamente das audiências públicas da Comissão Mista, e lutar por audiências publicas nos Estados;
– Articular no plano internacional a luta, junto a organismos multilaterais e internacionais;
– Articular a defesa da EBC com a defesa das redes públicas nacionais de comunicação, nas emissoras locais;
– Criar com instituições acadêmicas um Observatório da Comunicação Pública;
– Estudar medidas no âmbito do Judiciário, junto ao STF e ao MPF;
– Manter o Conselho Curador vivo, realizando reuniões ampliadas nos Estados, periodicamente.
– Buscar articular essa luta com a luta geral em defesa da democracia no país, dialogando com as demais lutas;
– Via FNDC articular a defesa da democratização da comunicação e fortalecimento da comunicado pública;
– Acionar constantemente a Ouvidoria da EBC,e enviando sugestões e críticas;
– Chamar as pessoas inscritas no processo de renovação e ex-conselheiros para compor o conselho ampliado e para as atividades;
– Difundir o Manual de Jornalismo da EBC como exemplo de jornalismo ético;
– Continuar a monitorar o que está acontecendo na EBC e o plano de trabalho.
Ao final, os participantes posaram para uma foto segurando frases do Ulisses Guimarães, selecionadas para uma exposição em Brasília para lembrar o seu centenário.
“O estado de direito não pode conviver com o estado de miséria”.
“Político, sou caçador de nuvens. Já fui cassado por tempestades”.
“Foi a sociedade, mobilizada nos colossais comícios das Diretas Já, que, pela transição e pela mudança, derrotou o Estado usurpador”.