Peça “Cidade Vodu” / Mayra Azzi/Companhia Teatro de Narradores
Em um contexto em que as temáticas da imigração e do refúgio têm se tornado cada vez mais conhecidas com a atenção da mídia voltada para o grande aumento no fluxo migratório mundial, coletivos e eventos culturais de imigrantes têm ganhado mais protagonismo, ainda que de forma seletiva.
Segundo dados da Polícia Federal e do Comitê Nacional para os Refugiados, atualmente são cerca de 2 milhões de imigrantes vivendo no Brasil, sendo 9 mil reconhecidos como refugiados. O número de imigrantes registrados aumentou 160% nos últimos dez anos, e aproximadamente 117 mil estrangeiros deram entrada no país em 2015.
O 7º Fórum Social Mundial das Migrações, que aconteceu em São Paulo, entre os dias 7 e 10 de julho, reuniu diversas comunidades imigrantes para atividades culturais e discussões sobre direitos políticos e cidadania, tendo marcado uma importante articulação desses movimentos na cidade. Conheça a seguir alguns coletivos e grupos culturais imigrantes na capital paulista:
Visto Permanente
Um dos coletivos presentes no Fórum, o Visto Permanente, é um acervo audiovisual que pretende reunir e divulgar o patrimônio cultural imigrante da capital paulista.
São cerca de 50 registros de projetos culturais imigrantes até agora, que podem ser consultados no site. O projeto também foi responsável pelo Território Artístico Imigrante, mostra que reuniu artes de imigrantes e obras com a temática de imigração, realizada no mês de junho.
“O Visto permanente nasceu da necessidade de colocar outro espaço midiático para suprir esse silêncio grande em relação à produção cultural imigrante e refugiada na cidade, por mais que ela seja gigantesca. A gente se deu conta de que tem muitos imigrantes fazendo cultura e arte em São Paulo há décadas, mas isso é invisibilisado”, afirmou Cristina de Branco, imigrante portuguesa e uma das fundadoras do Visto Permanente.
Segundo ela, um dos eventos que mais impactou a criação do projeto foi a Festa Nacional da Bolívia, geralmente realizada no Memorial da América Latina, durante o mês de outubro. “É um evento impressionante. São centenas de bolivianos ocupando o Memorial, de maneira totalmente legitimada pela instituição, mas ignorada pela sociedade paulistana, já que você quase não vê brasileiros na festa. Há grupos folclóricos bolivianos que existem há pelo menos 30 anos, mobilizam 500 famílias e nunca foram filmados oficialmente por nenhuma televisão. Assim como comunidades peruanas, paraguaias etc. A partir disso a gente percebeu que não havia nenhum lugar onde a gente poderia ter acesso a essa produção cultural e artística de maneira sistematizada, daí surgiu a ideia de fazer esse mapeamento, ainda que bastante restrito”, conta.
Nesse sentido, o projeto visa registrar e divulgar principalmente as comunidades latino-americanas, caribenhas e africanas que, na opinião de Cristina, são as mais invisibilizadas. “Elas reforçam aquilo que a elite brasileira reitera que não quer ser. A gente defende muito que o Brasil ainda está em um processo de branqueamento, no qual existem imigrantes que são bem-vindos e outros não. Eu e o Miguel Dores (um dos fundadores do Visto Permanente e imigrante português) somos os privilegiados, e não podemos nos calar diante da maioria negra e indígena de imigrantes no Brasil, comunidades que sofrem com xenofobia e racismo normalizados”, opina.
Equipe de Base Warmis
A Equipe de Base Warmis, frente do Organismo Internacional Convergência de Culturas, foi criada há três anos para integrar e lutar pelos direitos das comunidades de mulheres imigrantes em São Paulo. “A gente surgiu da necessidade de debater o tema da violência obstétrica, pois estavam morrendo muitas mulheres imigrantes, principalmente bolivianas, nessa situação. Passamos a lutar por temas que tem a ver com o direito das mulheres imigrantes, no geral, e percebemos que essas comunidades não estão em contato com o resto da sociedade brasileira”, conta Andrea Caravantes, imigrante chilena e uma das integrantes do grupo.
Recentemente, a Warmis tem desenvolvido projetos voltados para a área cultural, como oficinas de slings andinos, e um grupo de música andina formado apenas por mulheres. “A gente quer mostrar o que os imigrantes trazem, para acabar com essa ideia típica de que os imigrantes vem para o Brasil para roubar empregos. A gente quer que as mulheres imigrantes e filhas de primeira geração de imigrantes possam se empoderar e se reconhecer como imigrantes, porque essa palavra ainda carrega uma carga negativa aqui no Brasil. Achamos importante criar essa ponte com a comunidade brasileira e entre os outros imigrantes… fazer um intercâmbio de culturas”.